O Estado de S. Paulo
Com os preços dos alimentos e combustíveis
em alta e o tarifaço da conta de luz mostrando a sua cara, o presidente Jair
Bolsonaro achou por bem recomendar a todos os brasileiros que comprem fuzil,
mesmo que seja caro.
Parece piada de mau gosto, mas não é. É o
presidente falando: “Tem que todo mundo comprar fuzil, pô. Povo armado jamais
será escravizado. Eu sei que custa caro. Aí tem um idiota: ‘Ah, tem que comprar
é feijão’. Cara, se você não quer comprar fuzil, não enche o saco de quem quer
comprar”, disse Bolsonaro numa fala odiosa e desrespeitosa com os brasileiros
que estão penando com os efeitos da inflação.
É a última pérola de uma semana marcada por
declarações de integrantes do governo que sintetizam o estado de desorganização
na condução dos múltiplos problemas mais urgentes do País, como a inflação e a
crise energética, temas que estão deixando o presidente e o governo
ensandecidos.
“Qual o problema agora que a energia vai
ficar um pouco mais cara?”, indagou o ministro Paulo Guedes. “Como gerar
emprego com uma CLT tão rígida?”, questionou Bolsonaro.
“Cadê a grande deterioração fiscal?”, perguntou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que na semana anterior dissera que era impossível controlar a inflação com o fiscal descontrolado. Perguntas cujas respostas teriam de ser dadas por aqueles que estão questionando.
Campos Neto já suavizou o discurso do
descontrole fiscal porque sua fala desagradou aos seus colegas da equipe
econômica do lado de lá, no Ministério da Economia. Foi lembrado que os dados
das contas públicas melhoraram nos últimos meses, enquanto a inflação acumulada
em 12 meses tem assustado e chegou à marca de dois dígitos em quatro capitais
na prévia de agosto.
A fala do presidente do BC também não foi
bem recebida pela ala política, que viu na declaração uma crítica direta aos
governistas do Centrão, grupo com fama e prática de gastador, mas que está
preocupado com o prejuízo eleitoral de alta de preços persistente.
Campos Neto continua, porém, com excelente
trânsito com o mundo político, que volta e meia elogia seu trabalho no BC em
contraponto ao ministro Guedes, que voltou a ser alvo dos aliados do Centrão.
Governo e Centrão parecem ainda perplexos
diante da piora do quadro econômico. Até o final do último semestre, o cenário
era de festa, com retomada econômica e o aumento recorde de arrecadação. Dados
positivos que alimentaram os instintos mais primitivos da gastança
pré-eleitoral, e que agora cobram o seu preço. Todos acreditando que o Brasil
ficou rico durante a pandemia pelo ciclo de alta das commodities, que encheu os
cofres dos Estados e do governo federal a um ano da campanha de 2022.
Patrocinaram também a manutenção das
emendas de relator, que financiam o orçamento secreto, a frágil governabilidade
do presidente e o apoio nas votações de interesse do governo. O veto prometido
do presidente não aconteceu com a ameaça dos caciques de retaliação.
O gatilho da piora no ambiente econômico
foi disparado pelas trapalhadas na condução da negociação do parecer do projeto
do Imposto de Renda e da PEC de parcelamento dos precatórios. Desde que a PEC
foi enviada, o humor azedou ainda mais. Foi só ladeira abaixo porque há muita
controvérsia e divisão de opiniões em torno da solução para o parcelamento por
10 anos do pagamento de uma dívida certa. A unanimidade no governo e no
Congresso é que a PEC não fica em pé do jeito que está.
Um tema que dividiu até mesmo fiscalistas e
defensores do teto de gastos e colocou pesos-pesados de equipes econômicas de
governo passados em defesa da flexibilização da regra fiscal para evitar a
moratória.
Em outro caminho, Legislativo e Judiciário
também costuram uma solução para precatórios para limitar o pagamento até um
determinado valor, e o saldo restante ficaria para ser pago no Orçamento dos
anos seguintes, já como prioridade para serem quitados antes. Uma proposta que
permitiria ser implementada com a aprovação de uma resolução do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) ou do Senado Federal, sem PEC, mas que é vista pelos
críticos como uma “canetada” que passa por cima da Constituição.
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