sábado, 7 de agosto de 2021

Cristovam Buarque* - O Brasil avisa

Blog do Noblat / Metrópoles

Bolsonaro está avisando e as oposições não levam a sério: no lugar de unidade e resistência, continuam divididas

Bolsonaro tem avisado. A história vai dizer que ele foi o pior dos presidentes eleitos ao longo dos primeiros duzentos anos do Brasil como país independente. Mas vai ter de reconhecer que ele não surpreendeu, porque avisou. Avisou que vinha para destruir ou reduzir o que havia sido feito até sua posse: na cultura, na educação, na construção da democracia, os avanços nos direitos das minorias. Também avisou que não acreditava nas constatações da ciência quanto ao aquecimento global e medidas sanitárias, inclusive vacinas. Avisou que seu governo ia reduzir as leis de proteção ambiental e ocupar as florestas do Brasil, incentivando incêndios e desflorestamento. Avisou que retiraria o Brasil do cenário internacional e manteria aliança exclusiva com seu mentor norte americano. Deixou claro que buscava fazer do Brasil um pária internacional, isolado na resistência ao fantasma do comunismo morto há décadas. Quando a epidemia chegou, ele avisou que ela seria tratada como uma gripezinha, repetidas vezes disse que todos morrem e por isto não havia razão para sofrer diante de centenas de milhares de pessoas mortas.

Ele não avisou que haveria esquema de corrupção na compra de vacinas, nem que se aliaria ao centrão que sempre tratou como corja de corruptos. Mas, em geral, entre os defeitos de Bolsonaro não está o fato de não ter avisado. Não haverá desculpa para aqueles que não souberam enfrentar as ameaças que ele fez.

Agora, Bolsonaro avisa que não respeitará os resultados das eleições se elas não forem feitas com as que ele quer. Age com franqueza diferente dos militares de 1964, que até 1° de Abril juravam lealdade à Constituição e ao presidente, mas o destituíram jogaram o Brasil em uma ditadura autoritária por 21 anos, com tortura, prisão, controle da imprensa, da Justiça e do Congresso.

Ele está avisando mais uma vez. E tomando publicamente as medidas necessárias para cumprir seu aviso quando chegar a hora em 2022: denunciando que se perder será por fraude, armando seus seguidores e seus milicianos, cooptando politicamente as Forças Armadas e as polícias estaduais, compondo apoio internacional entre neonazistas do mundo e silenciando os políticos do centrão.

Apesar disto, aparentemente as oposições democráticas não estão levando a sério as ameaças de Bolsonaro: Ele avisa que não respeitará o resultado da eleição, diz que o Exército é dele, os motoqueiros e as milícias armadas ou digitais são dele, os parlamentares do centrão são dele, os líderes neonazistas do mundo são dele, mas apesar disto as oposições não demonstram unidade para enfrentar suas ameaças..

Bolsonaro está avisando e as oposições não levam a sério: no lugar de unidade e resistência, continuam divididas como se não houvesse ameaça. Só pensam qual deles vai vencer aos outros. Tolhidos pela ambição pessoal ou partidária e por preconceitos mútuos, ignoram os avisos de Bolsonaro e disputam entre si. Caminham para repetir os mesmos erros que elegeram Bolsonaro em 2018, apesar dos avisos que ele deu. Desta vez, com o agravante de elegerem mais do que um fanfarrão, elegerem um estilo de fascismo tropical do século XXI que o eleitor votará conhecendo. Estão dormindo e talvez só acordem no exílio.

O Brasil também avisa: desta vez não serão perdoados aqueles que por omissão, vaidade, partidarismo disputarem as urnas divididos entre eles, nem aqueles que usarem as armas e participarem do golpe que Bolsonaro avisa que vai dar. Da outra vez se passaram 21 anos e os crimes da ditadura foram perdoados, o Brasil avisa que desta vez podem passar mais que este tempo, mas os crimes contra a democracia não serão perdoados. Não serão perdoados os que erraram usando as armas, nem os que erraram por se dividirem nas urnas.

*Cristovam Buarque foi senador, governador e ministro

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