- Valor Econômico
Mês da entrega do orçamento, no qual as forças políticas se
movimentam em busca do maior pedaço possível da peça a ser encaminhada pelo
governo, agosto tradicionalmente tem tumultos na seara fiscal. Mas o que ocorreu nessa primeira semana em termos de piora de
risco fiscal impressiona.
Impulsionada por uma discussão atabalhoada
em torno do problema dos precatórios (as
dívidas judiciais que o governo é obrigado a pagar), agravada por um
excessivamente generoso Refis,
aprovado pelo Senado e relatado pelo próprio líder do governo, senador Fernando
Bezerra (MDB-PE), o Executivo e sua base no Congresso deram uma contribuição
relevante para deteriorar os mercados de juros, câmbio e
a própria bolsa.
E não podemos esquecer da confusão que tomou conta da reforma do Imposto de Renda e
a estranha pressa do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), em
colocar um texto que não está maduro e traz muitos riscos - fiscais e
tributários - em votação.
A questão dos precatórios, embora mereça ser discutida, está sendo tratada de afogadilho. A ideia de tirar essa despesa do teto até faz sentido (desde que seja desde o início da vigência dele, em 2017), mas soa como casuísmo e gera uma série de dúvidas, sem falar na suspeita de que tenha objetivo eleitoral. Considerando o que falou Bezerra ao Valor ontem, a natureza da despesa seria alterada e ela tratada como dívida.
Isso afetaria não só o teto (dando um
espaço extra da ordem de R$ 20 bilhões), mas também os resultados primários e a
própria dívida – a iniciativa seria neutra na União, mas aumentaria o
endividamento dos Estados, explica uma fonte da área econômica.
A proposta do governo, de parcelar os
valores maiores dessas dívidas judiciais, é mais cautelosa do ponto de vista do
teto de gastos (ainda que também preveja um drible no mecanismo nos próximos
anos), pois só evitaria que o espaço que deve ser criado pela diferença de
inflação em 2021 seja totalmente consumido pelo “meteoro”. Mas a ideia trouxe consigo a percepção de calote, mesma crítica
feita há quase um ano, quando a ideia de limitar essa despesa veio à tona pela
primeira vez e foi sepultada em poucos dias.
No caso do Refis,
imaginar que um desconto que pode chegar a 90% de forma ampla seja razoável é
mais uma expressão do pouco cuidado com o dinheiro público que viceja em
Brasília,
especialmente com o calendário eleitoral aparecendo no horizonte. E o governo
não conseguir colocar um freio no seu próprio líder é chocante.
Já a reforma
tributária do IR parece um caminhão desgovernado. A cada versão do
relatório do deputado Celso Sabino (PSDB-PA) as dúvidas sobre a viabilidade do
projeto aumentam.
Se ele melhorou a projeção de receitas com um generoso programa de repatriação
e outras medidas, como o fim definitivo dos Juros sobre Capital Próprio, de
outro os números apresentados são duvidosos e o risco de judicialização, que na
prática é um risco fiscal de curto e longo prazo, cresceu.
O fato inescapável é que Executivo e
Legislativo conseguiram, juntos, mais uma vez (não nos esqueçamos do orçamento
fictício de março/abril) produzir uma piora na percepção de risco do país,
evidenciada por exemplo no fracasso, reconhecido dentro da própria Economia, do
leilão de títulos públicos realizado ontem, após uma forte elevação da taxa
Selic. Sem esquecer do dólar, que voltou à marca de R$ 5,20, e das taxas
futuras, que dispararam para níveis muito elevados – um título pré-fixado de
três anos estava com juros acima de 9%.
Ao tumultuar o ambiente econômico com
discussões mal conduzidas, a dupla Executivo/Legislativo está jogando fora os
poucos benefícios do penoso imposto inflacionário - a melhora nos indicadores
de dívida e os ganhos de arrecadação -, diminui a potência da política
monetária para controlar a inflação e faz os empresários colocaram o pé no
freio dos investimentos.
Com isso, claro é de se esperar uma piora nas perspectivas para a economia e a vida da maioria dos brasileiros, boa parte deles ainda à procura de um emprego. Em tempo de olimpíada, o Brasil parece buscar o ouro na modalidade de tiro no pé.
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