segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Ana Cristina Rosa: Banzo, depressão e morte

Folha de S. Paulo

Pouco ou nada mudou em termos de políticas públicas para a saúde da população negra

Neste "Janeiro Branco", campanha com o objetivo de chamar atenção para os cuidados com a saúde mental, esta coluna adverte: o impacto psicológico do racismo na vida de adolescentes e jovens negros pode ser letal.

Com a autoestima abalada por um sistema cruel, desleal e opressivo, o risco de desenvolver quadros de depressão é 45% maior entre os pretos e pardos na comparação com os jovens brancos. Isso evidencia o efeito devastador do racismo sobre a saúde mental da população negra.

Cartilha do Ministério da Saúde com dados sobre óbitos por suicídio apontava já em 2018 que cerca de 60% das mortes de pessoas entre 10 e 29 anos ocorreram entre negros. Faz todo sentido quando se considera que a depressão é uma das principais causas associadas a esse tipo de óbito.

Na pandemia, a vulnerabilidade psicológica desencadeada pelo racismo institucional foi potencializada. Pesquisa feita pela UFRGS e pela UFPel, com colaboração da Universidade de Queensland, na Austrália, utilizando dados do SUS, apontou o agravamento nos índices de mortalidade por demência entre as pessoas negras.

Entre 2019 e 2020, o percentual de óbitos dessa natureza cresceu de 13,9% para 22,7% entre os pretos e de 14% para 20% entre os pardos. Uma das explicações plausíveis é o fato dessa população ter sido a mais afetada pela Covid-19 contribuir para aumentar os níveis de estresse e de depressão. Soma-se a isso a maior dificuldade de acesso dos negros a sistemas de saúde.

Quem sente na pele sabe que as dores causadas pelo racismo se manifestam e se perpetuam de diversas formas ao longo da vida. É um fenômeno que remete a um passado escravocrata no qual a saúde física foi negligenciada e a saúde mental constantemente comprometida pelo medo do chicote, do açoite, do fazer errado, de ser execrado em praça pública.

O pior é que do banzo do passado à depressão do presente pouco ou nada mudou em termos de políticas públicas voltadas à saúde da população negra.

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