Folha de S. Paulo
Qual experiência lhe servirá de inspiração:
a ortodoxia ou o populismo econômico?
Lula tinha 57 anos quando vestiu
pela primeira vez a faixa presidencial, inaugurando um ciclo triunfante de
dois mandatos, que se estendeu pelo mandato inicial da sucessora escolhida a
"dedazo". Depois, viveu um ciclo de fracassos, com direito a uma
temporada na prisão e ao impeachment de Dilma Rousseff.
Graças aos esforços conjugados de Bolsonaro
e Moro, tudo indica que subirá
novamente a rampa do Planalto. Lula 3, triunfo ou fracasso?
Uma lenda, desmentida pelas histórias de
tantos líderes políticos, diz que idade traz sabedoria. De fato, sabedoria
política é filha da experiência submetida à autópsia da razão. Depois de duas
décadas, aos 77, o que Lula terá aprendido?
No ciclo triunfante, Lula surfou numa conjuntura internacional de juros baixos, investimentos abundantes e elevação estrutural de preços das commodities. Lula 3 enfrentará um cenário desafiador, marcado pelos nacionalismos econômicos, pela desglobalização e por um repique das taxas de juros.
Qual experiência lhe servirá de inspiração:
a ortodoxia do primeiro mandato ou o populismo econômico do segundo, conduzido
às últimas consequências por Dilma?
O "golpista neoliberal" Alckmin,
na definição oferecida por um manifesto de dirigentes do PT, foi
escolha pessoal de Lula para a vice-presidência. A linguagem do
manifesto é obra do próprio Lula, inventada para reunir suas tropas na
trincheira da resistência ao impeachment.
A lógica da aliança sugere a renúncia aos artefatos discursivos fabricados em 2016. Mas esse passo exige uma revisão partidária da história recente. Lula a impulsionará? Ou preferirá o caminho de uma permanente duplicidade?
Cercado por seu cortejo
de militares convertidos em políticos, Bolsonaro apelou ao combate contra o
"inimigo interno", em referência explícita ao paradigma da ditadura
militar. Lula nunca empregou a expressão, mas silenciou quando José Dirceu e
outros dirigentes petistas, imitando uma prática castrista, referiram-se a
adversários como "inimigos do povo".
Na sua pré-campanha, o ex-presidente
investe na ideia da unidade contra a extrema-direita. No poder, será fiel ao
discurso de campanha ou à alma autoritária de seu partido?
Moro
condenou Lula de forma ilegal. A conclusão do STF não significa que
inexistiram o mensalão e o petrolão – ou apaga a responsabilidade política do
ex-presidente nos dois casos. A estratégia de soldar maioria parlamentar pela
compra de partidos prosseguiu sob Bolsonaro, via "orçamento secreto".
Terá Lula aprendido a lição sobre a necessidade de uma reforma política
saneadora?
O núcleo da política social lulista foi o
Bolsa-Família. Lula utilizou-o à larga para finalidades eleitorais, assustando
os pobres com o espectro de sua abolição por um sucessor malvado. Contudo, o
malvado sucessor dobrou a
aposta com o Auxílio Brasil.
Lula 3 terá a grandeza de mudar o curso
dessa história, convertendo os programas de transferência de renda em política
de Estado, pela fixação de seus pilares em lei e a entrega de sua administração
a um comitê gestor independente?
No momento da invasão da Ucrânia, Lula
mencionou a Otan para oferecer um álibi a Putin. A política externa
lulista transformou o Brasil em escudo diplomático das ditaduras castrista e
chavista. Será que Lula extraiu as conclusões corretas do desastre venezuelano?
Terá finalmente entendido, com a eleição do chileno Boric, que é preciso
separar as esquerdas pela fronteira da democracia?
Triunfo ou fracasso? O destino do terceiro
mandato depende da resposta a indagações como essas. Se Lula aprendeu as lições
básicas, sorte dele —e nossa.
A Folha publicou matéria publicitária do
Kremlin, sob o formato enganoso de artigo
de opinião de um certo Boris Zabolotsky.
O Jocevir (Jornalistas pela Censura Virtuosa), que quer me calar, não reclamou
da propaganda de guerra.
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