Combate ao crime exige consistência do poder público
O Globo
Incentivo à produtividade policial e adoção
de metas reduziram índices de violência em 11 estados, revela estudo
Com 47.503 assassinatos em 2021 — o
equivalente à população de Campos do Jordão (SP) — e 22,3 mortes por 100 mil
habitantes, o Brasil tem enfrentado um desafio permanente para baixar os
índices de criminalidade, independentemente dos governos que se sucedem em
Brasília, nos estados e municípios. Para isso, uma contribuição inestimável foi
dada pelo estudo do Instituto Sou da Paz mostrando que pelo menos 11
unidades da Federação reduziram seus índices de violência por meio de boas
práticas, como a implementação de programas com metas e
incentivo à produtividade da polícia.
Um dos exemplos citados é o Espírito Santo, que se propôs a reduzir anualmente em 3,5% o número de homicídios. Entre as medidas adotadas, mostrou reportagem do GLOBO, está uma bonificação aos policiais por apreensão de arma de fogo. O resultado foi eloquente: os homicídios dolosos caíram de 41,7 por 100 mil habitantes em 2011, quando foi implantado o projeto, para 30,1 em 2020.
O incentivo à apreensão de armas norteia
também o programa de segurança da Paraíba. O estado paga aos policiais de R$
600 a R$ 1.500 por arma retirada das mãos de criminosos. A intenção é reduzir
os assassinatos em 10%. Em São Paulo, a bonificação baseada em resultados levou
à queda de 49% nos roubos de carros entre 2014 e 2021. Alagoas, que adota
estratégia semelhante, viu a taxa de homicídios cair de 47,3 por 100 mil
habitantes em 2015 para 31 em 2021.
As boas práticas não necessariamente passam
pelo pagamento de gratificações aos policiais. No Rio Grande do Sul, o programa
implantado em 2019 busca a redução gradual dos índices de criminalidade por
meio de políticas que incluem até o monitoramento da evasão escolar.
Sabe-se que o aumento — ou a queda — dos
índices de criminalidade é influenciado por diversos fatores, como quantidade
de armas em circulação, falta de coordenação entre as polícias Civil e Militar,
eficácia no uso de bases de dados e tecnologia, atuação de facções criminosas
nas rotas do tráfico, incapacidade crônica do Estado para combatê-las e até os
períodos de guerra ou trégua entre as quadrilhas. Mas a ação dos governos
estaduais também tem seu papel. “Estados que mantêm suas políticas e uma
metodologia de trabalho tendem a obter resultados positivos”, diz Carolina
Ricardo, diretora executiva do Sou da Paz.
Embora o número de assassinatos no Brasil
tenha caído entre 2020 e 2021 — de 50.448 para 47.503 —, segundo os dados do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ele ainda é alarmante. Cinco brasileiros
são assassinados a cada hora. Está claro que não existe solução mágica para o
problema. O governo federal precisa se engajar nessa luta, até porque as
facções atuam nacionalmente, e as unidades da Federação não têm meios ou
recursos para sustentar a guerra contra elas. Mas, se os estados fixarem metas
por meio de políticas públicas bem-sucedidas e se esforçarem para cumpri-las,
já será um passo importante. Toda ação para salvar vidas é bem-vinda.
Crimes no Discord expõem urgência de
responsabilizar as plataformas digitais
O Globo
Rede usada por adolescentes veicula cenas
repugnantes de automutilação, crueldade com animais e crimes
São estarrecedores as cenas e os conteúdos
de incentivo à violência extrema e ao ódio veiculados no aplicativo de
mensagens Discord, voltado para o universo de gamers e popular entre jovens e
adolescentes no Brasil. Como mostrou reportagem do “Fantástico”, da TV Globo,
ele é uma porta aberta para vídeos repugnantes de automutilação e crueldade
contra animais, além de disseminar pornografia, ideias racistas, homofóbicas,
misóginas e neonazistas. Pela forma como o Discord foi concebido, é fácil
reunir nele usuários anônimos com interesses comuns e arregimentá-los para o
crime.
Embora as discussões sobre as atrocidades veiculadas
em plataformas digitais tenham ganhado vulto com o debate sobre o PL das Fake
News, as barbaridades disseminadas no Discord não estavam no radar dos
legisladores. O Discord reúne cerca de 3 milhões de usuários no Brasil.
Ficaria, por isso, fora do alcance da regulamentação, voltada para plataformas
com mais de 10 milhões. Reuniões fechadas por vídeo também fogem ao escopo do
projeto. São necessárias mudanças na proposta para abarcar também plataformas
como o Discord.
A aprovação do PL das Fake News demanda
urgência e ganhou maior relevância depois dos ataques golpistas do 8 de Janeiro
e dos massacres em escolas, quando conteúdos extremistas foram fundamentais
para os criminosos. Um levantamento da USP mostra que em 15 dos 22 ataques a
estabelecimentos de ensino registrados desde 2002 houve radicalização on-line.
Pelo menos dois adolescentes usaram o Discord para planejar suas agressões. As
plataformas digitais têm sido cúmplices das atrocidades, protegidas pela imunidade
garantida pelo artigo 19 do Marco Civil da Internet, que só as obriga a agir
mediante ordem judicial.
Não pode haver liberdade para disseminar e
estimular desinformação, preconceito, ódio e violência. A regulamentação do PL
das Fake News, na primeira versão apresentada pelo relator, deputado Orlando
Silva (PCdoB-SP), representa um avanço por tornar as plataformas digitais
corresponsáveis pelos efeitos do que veiculam. Pelo texto, elas passam a ter um
“dever de cuidado” com o ambiente digital e, em caso de descumprimento, ficam
sujeitas a sanções judiciais. Diferentemente do que acontece hoje, passam a ter
de atuar de forma preventiva para evitar a disseminação de conteúdos ilegais.
As barbaridades que circulam no Discord constituem mais um caso que reforça a urgência de responsabilizar as plataformas digitais, mesmo as de menor porte, pelos crimes cometidos por intermédio da internet. Não se pode permitir que adolescentes e jovens sejam aliciados para participar de rituais de crueldade, violência e intolerância. Até aqui, por questões comerciais, sob o manto hipócrita da proteção à liberdade de expressão, elas fizeram vista grossa para a maior parte dos crimes de que são cúmplices. Espera-se que demonstrem maior responsabilidade.
Calote companheiro
Folha de S. Paulo
Com Argentina, Lula de novo ensaia apoiar
políticas irresponsáveis de aliados
Como se não tivessem bastado os calotes de
Cuba e Venezuela em dívidas com o Brasil contraídas durante administrações
petistas, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) insiste em adotar
afinidades ideológicas como critério definidor das relações internacionais.
O caso do momento é a Argentina, em
profunda crise econômica. No encontro com o presidente Alberto Fernández, o
mandatário brasileiro recorreu ao velho expediente de associar o Fundo
Monetário Internacional, principal credor, às mazelas do país vizinho.
Para Lula, o FMI deveria "tirar a faca
do pescoço da Argentina", ignorando todas as negociações anteriores cujas
condições foram descumpridas pela Casa Rosada.
É antiga a fixação da esquerda
latino-americana em culpar o Fundo pela instabilidade econômica da região. Se
no passado, quando os fluxos internacionais de capital privado eram restritos,
a queixa poderia ter algum fundamento, no mundo atual é delirante manter o
mesma cantilena.
A responsabilidade pelo caos argentino é de
sucessivos governos —à direita ou à esquerda, mas todos reféns do peronismo—
que geriram a economia de modo irresponsável. Fernández e suas políticas
populistas tornaram a situação mais dramática nos últimos anos.
Não é por acaso que a inflação supera 100%
ao ano e que o peso derrete continuamente. O caminho, infelizmente improvável,
seria um ajuste de contas interno de grande magnitude, que permitisse a
recuperação da credibilidade da moeda e das finanças públicas.
O Brasil, naturalmente, perde com a
deterioração da economia argentina. É notável que um país fronteiriço e com
amplo potencial tenha absorvido em 2022 apenas 4,6% das exportações
brasileiras, equivalentes a US$ 15,3 bilhões. É uma fração da
posição de 20 anos atrás e menos, por exemplo, do que as vendas para Oriente
Médio.
Felizmente, Lula ainda não entregou
dinheiro brasileiro ao vizinho, limitando-se a uma tentativa até aqui
infrutífera de ampliar o comércio por meio de promessas de crédito a
exportadores brasileiros e compradores argentinos.
Entretanto nenhum mecanismo de
financiamento bilateral, ainda que conte com garantias, será capaz de evitar
inadimplência se o próprio governo argentino não colocar sua casa em ordem.
A nova promessa
do petista é tentar alterar o estatuto do Novo Banco de Desenvolvimento,
o banco dos Brics, hoje presidido por Dilma Rousseff (PT), para dar garantias a
Buenos Aires. Eis mais uma invencionice temerária, já que a instituição tem
como mandato financiar apenas os países membros.
É natural que o Brasil, por seu peso na
América Latina, exerça influência na região. O pior modo de fazê-lo é
justamente dando suporte a políticas fracassadas que sabotam o desenvolvimento
de todos.
Ouro com sangue
Folha de S. Paulo
Garimpo ilegal retalia com violência na
Amazônia; governo não deve se intimidar
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
enfrenta a árdua tarefa de intensificar ações contra o garimpo ilegal e, ao
mesmo tempo, evitar uma escalada ainda maior da violência em terras indígenas.
No último sábado (29), três
yanomamis foram baleados, e um deles morto, na comunidade Uxiu, em
Roraima. Investiga-se a participação de garimpos no crime.
No dia seguinte, agentes da Polícia
Rodoviária Federal na Terra Indígena Yanomami mataram supostos garimpeiros
ilegais que atacaram servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e policiais, de acordo com a corporação.
Logo em seguida, mais oito corpos foram encontrados.
Retirar o garimpo ilegal na região não é
uma tarefa fácil. Há três meses o governo promove ações para pôr fim à
atividade, que resultaram na expulsão de 20 mil invasores.
Com a chamada Operação Libertação,
coordenada pela Polícia Federal e as Forças Armadas, o objetivo é intensificar
a presença do estado por meio de um centro de comando e controle, bem como
viabilizar a retirada de garimpeiros.
De um lado, busca-se destruir a
infraestrutura da atividade ilegal, como aeronaves e maquinários, e, por outro,
prover assistência a
indígenas diante da grave crise sanitária nessas comunidades.
Porém, além de ações pontuais, são
necessárias mudanças estruturais para garantir os direitos desses povos no
longo prazo, o que inclui promover a segurança da terra —como a recente
retomada da homologação de terras indígenas, após hiato de cinco anos.
Deve-se, ademais, secar as fontes de renda
que alimentam o garimpo ilegal na região, caso do tráfico de drogas. Neste
sentido, na última terça-feira (2), o Supremo Tribunal Federal suspendeu o
dispositivo legal de 2013 que permitia que o ouro fosse comercializado no país
apenas com base nas informações sobre a sua origem fornecidas pelos próprios
vendedores, a chamada "presunção de boa-fé".
A escalada de violência não pode intimidar o governo, dado que o combate ao garimpo ilegal é uma emergência humanitária, mas dispara um alerta sobre a restrita capacidade do poder público de evitar, com ações preventivas, estruturais e de inteligência, que mais sangue seja derramado na região.
Cheiro de sangue na água
O Estado de S. Paulo
Tubarões do Congresso farejam governos
fracos, como parece ser este de Lula, o que tende a encarecer a
governabilidade. Mas Lula deve compreender que articular não é só distribuir
dinheiro
Com menos de cinco meses de governo, o presidente
Lula da Silva sofre as agruras de uma fraqueza política historicamente atípica
para o momento. A esta altura, caso não estivesse perdido em outros propósitos,
Lula deveria estar aproveitando a força e a popularidade advindas de sua
recente vitória nas urnas para vencer resistências e pavimentar, no Congresso,
o caminho para a aprovação de medidas difíceis, como o novo arcabouço fiscal e
a reforma tributária. Até agora, no entanto, o que se viu foi o exato oposto:
uma coleção de reveses.
Disposto a mudar essa situação adversa,
Lula anunciou que assumirá pessoalmente a articulação política de seu governo.
O quadro de resistências aos interesses do Palácio do Planalto no Congresso, de
fato, é de uma complexidade que demanda a ação direta de quem tem a caneta e a
palavra final no Poder Executivo, além de, principalmente, a experiência em
negociações políticas supostamente testada ao longo de outros dois mandatos
presidenciais.
Como tubarões que sentem o cheiro de sangue
na água, não faltam parlamentares dispostos a aproveitar esse estado de quase
letargia do governo na condução de uma agenda política no Congresso – cada vez
mais empoderado – para dele extrair tudo quanto for possível: dinheiro, cargos,
poder. Lula, porém, parece olhar para o gigantesco desafio que tem diante de si
com lentes embaçadas por convicções pregressas.
O mundo, o Brasil e o Congresso já não são
mais os mesmos de 20 anos atrás. O chamado presidencialismo de coalizão opera
hoje sob outras bases. É cada vez maior o poder dos parlamentares sobre a
disposição de recursos do Orçamento da União, limitando os instrumentos
republicanos à disposição do presidente de turno para atrair o Poder
Legislativo para a mesa de negociação.
Para ser bem-sucedido nessa nova etapa do
governo, e, sobretudo, para que o País seja o grande beneficiado pelos frutos
dessa articulação política entre Lula e os líderes dos partidos no Congresso, o
presidente precisa compreender que articulação política não é distribuição de
dinheiro pura e simples; isso é compra de votos. Uma boa articulação política,
a de que o Brasil tanto precisa para resolver seus problemas crônicos, implica,
necessariamente, dividir poder, transigir sobre agendas tidas como
conflitantes, caminhar para a moderação e gerar compromissos de coesão
coadunados com o melhor interesse nacional, não com interesses paroquiais.
Só o tempo haverá de mostrar os resultados
que a decisão de Lula de tomar para si a articulação política do governo vai
produzir. Até agora, o presidente tem se revelado surpreendentemente inábil
para construir uma maioria segura no Congresso em termos republicanos,
sobretudo após o fim do orçamento secreto tal como o esquema fora concebido
pelo governo de seu antecessor. Basta dizer que a base de apoio ao governo no
Congresso nem sequer tem conseguido evitar a convocação de ministros de Estado
para serem fustigados pela oposição em comissões temáticas da Câmara e do
Senado.
Lula, pessoalmente, tem tido grande
dificuldade até para conter a oposição do próprio PT à proposta de arcabouço
fiscal formulada pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento. O presidente
ainda passou pelo constrangimento de ver seus decretos para alterar a
substância do Marco Legal do Saneamento ruírem, em boa hora, como um castelo de
cartas.
Tudo isso, somado à instalação de Comissões
Parlamentares de Inquérito (CPIs) contrárias aos interesses do governo e ao
adiamento da votação do chamado “PL das Fake News”, evidencia a dimensão dos
obstáculos que Lula precisa vencer para entregar ao sucessor um país melhor do
que o que recebeu. Com uma base flutuante e uma oposição dividida entre os
pragmáticos e os identitários, estes alinhados à extrema direita e infensos à
barganha política com o governo, tal como era o PT na oposição, o Congresso é
soberano em suas decisões. É o governo, Lula em particular, quem tem de trabalhar
melhor para lidar com isso.
Desigualdade também na oferta de energia
O Estado de S. Paulo
País avança de forma acelerada na transição
da matriz elétrica para fontes renováveis, mas quase 1 milhão de moradores na
Região Amazônica ainda não têm acesso à eletricidade
Quase 1 milhão de pessoas que moram na
Amazônia brasileira não têm acesso à energia elétrica. Quase 70% das novas
usinas de energia liberadas para comercialização no ano passado foram de fontes
renováveis, eólica e solar.
Esses dois informes mostram como é desigual
o processo de mudança na matriz energética no País. É do interesse nacional que
se avance nesse processo de transformação já que cresce continuamente a
preocupação com as questões climáticas.
De um lado, o Brasil mostra que está
liderando o processo de “limpeza” das fontes energéticas. De outro, fica
evidente a dificuldade em se disponibilizar um dos serviços básicos para toda a
população, em especial para os moradores da Região Amazônica, já atormentada
por outros problemas seriíssimos, como o desmatamento, a mineração ilegal, a
falta de atendimento médico e o aumento da criminalidade.
Levantamento do Instituto de Energia e Meio
Ambiente (Iema), publicado neste início de maio, mostra que cerca de 220 mil
residências, escolas e postos de saúde não contam com fornecimento público de
eletricidade. Essas unidades estão desconectadas do Sistema Interligado
Nacional, que distribui energia para a maior parte do País. O Pará é o Estado
em que é maior o número de consumidores a serem atendidos.
Pelos registros oficiais, a energia
elétrica pública chegou ao Brasil há 142 anos, com a instalação de iluminação
em trecho da atual Praça da República, centro no Rio de Janeiro, numa
iniciativa estimulada pelo imperador Pedro II, que pouco antes disso, em 1879,
havia autorizado Thomas Edison, o inventor da lâmpada, a montar seus
equipamentos por aqui. Quase um século e meio depois, o acesso à energia
elétrica continua, como se vê, problemático.
O programa Mais Luz para a Amazônia,
lançado em 2020 pelo governo Jair Bolsonaro, tinha como meta prover o acesso à
eletricidade para exatas 219.221 unidades consumidoras até o ano passado. Foi
um fracasso: só foram atingidos 5% desse objetivo até o fim de 2022. É certo
que ampliar o fornecimento de energia não é fácil nem barato, mas o país dispõe
de tecnologia de usinas eólicas e solares e é possível conseguir financiamento
de entidades como o Banco Mundial para projetos dessa envergadura. O que parece
ter faltado até recentemente foi empenho para execução dos planos para a Região
Norte.
O outro lado da questão é bem mais
brilhante. Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) referentes ao
ano passado mostram que a participação das fontes renováveis na matriz elétrica
é de 85%, e 60% correspondem à hidráulica; 8%, à biomassa; 11%, à eólica; e 2%,
à energia vinda de painéis solares. Devem-se acrescentar a esses valores 5% da
chamada geração distribuída, em que o próprio consumidor produz energia,
basicamente proveniente de painéis solares instalados em sua própria
propriedade, seja casa, fazenda ou empresa. Hoje a energia proveniente desses
micro e pequenos geradores já é suficiente para abastecer cerca de 5 milhões de
casas ou apartamentos – ou quase 20 milhões de pessoas.
O detalhamento desses dados mostra como
está sendo acelerado o processo de mudança na matriz energética do País. Em
2022, do total de “nova” energia das usinas liberadas pela Aneel, 68% se
referiam a fontes renováveis, mais especificamente energia solar e eólica.
Esses resultados mostram como está funcionando a parceria entre o governo, que
concede incentivos para a energia limpa, e o setor privado, que tem investido
pesadamente no segmento.
Poder ostentar a bandeira de país de
energia limpa melhora a imagem do Brasil no mundo, francamente desgastada por
quatro anos de hostilidade bolsonarista às questões ambientais. Por isso,
quanto mais se avançar nesse quesito, melhor: além dos ganhos para o meio
ambiente, essa atitude certamente facilitaria a atração de investimentos
internacionais. Para tanto, além de acelerar ainda mais a implementação de
fontes renováveis de energia, é urgente atender os brasileiros que vivem –
literalmente – no escuro.
Só palavrório não cria confiança
O Estado de S. Paulo
Governo fala muito e entrega pouco,
ampliando incerteza entre empresários e consumidores
O discurso governamental que procura
mostrar um “novo” Brasil em contraste com o país em que vivemos durante a
administração Jair Bolsonaro não está surtindo o efeito desejado pelos
petistas: até agora, não melhorou o clima entre consumidores e empresários. E
persistem as perspectivas pessimistas em relação à economia nos dois públicos.
Desde sua posse, o presidente Lula da Silva
tem mandado recados de que o País vai contrariar as previsões negativas sobre o
desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) – o consenso do mercado financeiro
indica uma expansão, muito modesta, de apenas 1%, segundo levantamento do
Boletim Focus divulgado nesta semana pelo Banco Central. Lula disse recentemente
que não vai haver milagre, mas vai ter crescimento acima das previsões
desfavoráveis.
As falas presidenciais e da equipe
econômica tiveram, porém, pouco eco tanto no mundo corporativo como entre os
consumidores, como mostraram os índices de confiança, apurados pela Fundação
Getulio Vargas (FGV).
Os dois indicadores caíram em abril, mas o
mais relevante é que esses resultados mantiveram os níveis de confiança em
patamares baixos. Na avaliação de Aloisio Campelo Júnior, da FGV, a pesquisa
entre os empresários reflete “o quadro de desaceleração gradual do nível de
atividades dos setores mais cíclicos da economia”. A confiança dos
consumidores, por sua vez, acomodou-se em abril em níveis considerados baixos
em termos históricos, provavelmente como resultado do alto endividamento das
famílias e dificuldade de acesso ao crédito.
Certamente não contribuem para aumentar a
confiança no desenrolar da economia neste e nos próximos anos as dúvidas quanto
à possibilidade de o governo conseguir implementar as medidas anunciadas desde
janeiro. Está claro que a equipe política do presidente Lula enfrenta sérias
dificuldades para construir uma base de apoio no Congresso, como aliás se viu
na tentativa frustrada de votação na terça-feira, na Câmara, do projeto de lei
que regula as redes sociais na internet.
Além disso, é significativo o grau de
incerteza sobre o impacto que decisões governamentais terão na economia, mesmo
se elas forem aprovadas pelo Congresso sem grandes desvirtuamentos – sem a
inclusão de “jabutis” que distorçam seus propósitos iniciais. É o caso do
arcabouço fiscal, a respeito do qual foram levantadas mais questões do que
certezas sobre o efeito que terá nas contas públicas – e, em última instância,
na economia e nos investimentos que poderiam alavancar o crescimento mais
vigoroso e duradouro do PIB.
Fazer discursos, criticar o alto nível das
taxas de juros, combater o pessimismo, tudo isso faz parte do jogo retórico do
governante. Mas essas ações se tornam apenas palavras ao vento se não forem
acompanhadas ou mesmo antecipadas por trabalho duro e minucioso nos setores
econômicos que demandam atenção. Há muito o que corrigir, avançar ou mudar na
economia – e essas tarefas exigem empenho e cuidado com as contas públicas.
Talvez o mote adequado neste momento seja menos discurso e mais trabalho.
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