DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Brasília tem seus horrores típicos, mas também serve de entreposto de transações de taras e selvagerias nacionais
VOLTOU À MODA xingar Brasília. Em São Paulo, o desprezo misturado a repugnância é enorme. Brasília, além de palco central da corrupção, é a capital do (resto do) Brasil, esse país tido como esquisito ou apenas turístico por muito paulista mais bem posto na vida.
Embora desbotada pelos anos e pelo ridículo xenófobo da coisa, a mitologia do trem a carregar o Brasil sobrevive como um baixo contínuo a zunir na memória dos paulistas.
Mais recentemente, a mitologia ganhou verniz mercadista. Isto é, São Paulo como praça-forte da iniciativa privada e da finança moderna, cosmopolita, Nova York com Califórnia e Miami, Estado expropriado pela burocracia incapaz, pelas derramas de impostos e pelo país atrasado, mas centro cultural brasileiro. Releva-se que, apesar de USPs e tantos "eventos culturais", as notas dos estudantes daqui sejam piores que as de meninos de outros lugares do país, que de resto se diverte com novelas da TV Globo do Rio.
Isto posto, São Paulo é um dos poucos lugares em que não se veem aquelas placas do governo federal que decoram obras em cacimbas, estradas ou universidades pelo Brasil.
Enfim, a economia moderna apareceu aqui, na comunhão de industriais meio brucutus com burocratas desenvolvimentistas de todo o país reunidos na antiga capital, o Rio.
O PIB per capita do Distrito Federal é quase o triplo da média brasileira, o que causa escândalo, mas resulta apenas de a cidade ser um centro político criado na poeira do cerrado, sem história ou economia. Se Brasília foi um erro, agora é incontornável. Há muita corrupção puramente local?
Brasília tem seus horrores típicos, mas também serve de entreposto de transações de taras e selvagerias nacionais
VOLTOU À MODA xingar Brasília. Em São Paulo, o desprezo misturado a repugnância é enorme. Brasília, além de palco central da corrupção, é a capital do (resto do) Brasil, esse país tido como esquisito ou apenas turístico por muito paulista mais bem posto na vida.
Embora desbotada pelos anos e pelo ridículo xenófobo da coisa, a mitologia do trem a carregar o Brasil sobrevive como um baixo contínuo a zunir na memória dos paulistas.
Mais recentemente, a mitologia ganhou verniz mercadista. Isto é, São Paulo como praça-forte da iniciativa privada e da finança moderna, cosmopolita, Nova York com Califórnia e Miami, Estado expropriado pela burocracia incapaz, pelas derramas de impostos e pelo país atrasado, mas centro cultural brasileiro. Releva-se que, apesar de USPs e tantos "eventos culturais", as notas dos estudantes daqui sejam piores que as de meninos de outros lugares do país, que de resto se diverte com novelas da TV Globo do Rio.
Isto posto, São Paulo é um dos poucos lugares em que não se veem aquelas placas do governo federal que decoram obras em cacimbas, estradas ou universidades pelo Brasil.
Enfim, a economia moderna apareceu aqui, na comunhão de industriais meio brucutus com burocratas desenvolvimentistas de todo o país reunidos na antiga capital, o Rio.
O PIB per capita do Distrito Federal é quase o triplo da média brasileira, o que causa escândalo, mas resulta apenas de a cidade ser um centro político criado na poeira do cerrado, sem história ou economia. Se Brasília foi um erro, agora é incontornável. Há muita corrupção puramente local?
Pode ser, pois lá as empresas servem quase apenas ao governo -trata-se mais de um caso de especialização. Os desclassificados maiores da política que adoramos detestar atuam no palco brasiliense? A seleção do elenco é feita em todo país, com variações regionais no mau gosto. Por falar nisso, a cidade cantada pela arquitetura é uma mistura de prédios comerciais feios, como os de quase todo o país, com lugares semelhantes a cemitérios de faraós em que foram plantados megálitos soviéticos, como a esplanada dos ministérios. O acabamento de prédios menos feios é ruim; a cidade parece precocemente podre graças à má qualidade da mão de obra e da falta de cuidado das empresas que a construíram, feiura e falta de capricho tipicamente brasileiras. E a cafonice política, sim, empesteia a cidade.
Mas Brasília não é uma "síntese do Brasil". Está mais para vitrine e entreposto de transações de taras e selvagerias nacionais. Em São Paulo se diz, sardonicamente, que há muito corrupto primitivo em Brasília e no resto do país, gente que esconde dinheiro nas partes, com parentelas extensas e agregados de casa grande, de nomes exóticos. Aqui, centro da finança, lava-se mais branco e tecnicamente o dinheiro sujo. Daqui saem o grosso da verba que cimenta a comunhão de empresa e Estado e as tecnologias de corrupção. Aqui se compram decretos, votações e contrabandos em leis com fundos que ajudam a sustentar coronelatos e caciquias das regiões mais selvagens ou decadentes do país, a nossa versão de sempre de "desenvolvimento desigual e combinado" (atenção, é sarcasmo). Tudo assentado na vasta ignorância da vasta tigrada.
Mas Brasília não é uma "síntese do Brasil". Está mais para vitrine e entreposto de transações de taras e selvagerias nacionais. Em São Paulo se diz, sardonicamente, que há muito corrupto primitivo em Brasília e no resto do país, gente que esconde dinheiro nas partes, com parentelas extensas e agregados de casa grande, de nomes exóticos. Aqui, centro da finança, lava-se mais branco e tecnicamente o dinheiro sujo. Daqui saem o grosso da verba que cimenta a comunhão de empresa e Estado e as tecnologias de corrupção. Aqui se compram decretos, votações e contrabandos em leis com fundos que ajudam a sustentar coronelatos e caciquias das regiões mais selvagens ou decadentes do país, a nossa versão de sempre de "desenvolvimento desigual e combinado" (atenção, é sarcasmo). Tudo assentado na vasta ignorância da vasta tigrada.
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