domingo, 26 de agosto de 2012

Hora do voto técnico - Tereza Cruvinel

"O primeiro veredito deve ser conhecido esta semana e ele decorrerá do alinhamento de uma maioria dos ministros. Unanimidade não haverá"

Orozimbo Nonato (1891-1974), lá no mundo dos espíritos, deve estar perplexo com o que se passa no Supremo e em torno dele. Ministros batem boca em público, falam mal uns dos outros nas coxias, dão entrevistas em profusão e um deles é atacado nos meios de comunicação como se se tratasse de um líder partidário na Câmara que votou contra certos anseios da rua. Orozimbo, ex-ministro e ex-presidente do STF, é citado com frequência naquela Corte como exemplo de elegância, respeito à liturgia e pureza de linguagem em suas manifestações, afora as contribuições doutrinárias e acadêmicas.

Os indignados com o voto do ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, que absolveu o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) e corréus do item 3 da Ação Penal 470 do chamado mensalão, devem ir preparando o fígado. Não que exista no STF, como se lê na blogosfera, um forno de pizza ligado. Mas é certo que, agora, com o voto dos demais ministros, terá início uma fase mais técnica do julgamento. O libelo acusatório do procurador-geral, Roberto Gurgel, lido em tom sereno, mas pleno de adjetivos pesados, e a convicção implacável do ministro-relator, Joaquim Barbosa, darão lugar a votos mais parecidos com o de Lewandowski, não necessariamente na essência e nas conclusões, mas na metodologia, fundada na técnica jurídica, nas provas e evidências, não no juízo moral. O julgamento político e moral já foi feito. Pela Câmara, quando — vá lá que tangida pela pressão externa — cassou alguns dos acusados em 2005, por boa parte da mídia e por setores da opinião pública com maior poder de expressão. O primeiro veredito deve ser conhecido esta semana, e ele decorrerá do alinhamento de uma maioria dos ministros. Unanimidade não haverá, até porque já foi quebrada pela divergência entre relator e revisor. Alguns votos vão se aproximar de Barbosa, outros, de Lewandowski.

Depois da réplica do relator e da tréplica do revisor, os demais ministros começarão a votar a partir dos mais novos na Corte, começando por Rosa Weber. Ela, como Dias Toffoli, Luiz Fux e Cármem Lúcia, têm perfis de atuação menos conhecidos e previsíveis. Já os mais antigos, pelo histórico, tenderiam, segundo os advogados que melhor conhecem a Corte, a apresentar votos mais analíticos, como o do revisor, ainda que a conclusão seja oposta. Todos eles devem, por exemplo, pautar-se pelo artigo 155 do Código de Processo Penal, reformado em 1988, que recomenda aos juízes privilegiar as provas (inclusive testemunhais) colhidas durante a fase de instrução criminal em detrimento das que tenham outra origem. O procurador-geral, por exemplo, valeu-se muito de depoimentos feitos à CPI dos Correios. Lewandowski citou exclusivamente depoimentos em juízo, e nenhuma vez o que foi dito na CPI. Essa foi uma das diferenças que o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, decano entre os advogados de defesa, louvou no voto do revisor, pela criação do contraditório. Por último, falará o decano Celso de Mello. E se ele der um voto garantista e invocar, como no caso Collor, a falta de atos de ofício que indiquem a contrapartida oferecida pelos deputados que receberam recursos do valerioduto? Será atacado?

Terá fim o enigma sobre o voto do ministro Peluso, que só participa do julgamento até quinta-feira. Completa 70 anos no dia 3 e se aposenta compulsoriamente. Direito ao voto ele tem. Se votar nessa primeira "fatia" do processo, criará uma assimetria com as etapas seguintes. E não estará presente na fase da dosimetria das penas.

Um sonho. José Antonio Reguffe (PDT-DF) é o deputado de menor custo para a Câmara. Já abdicou de salários extras (14º e 15º) e de parcela da verba de gabinete, e reduziu de 25 para nove o número de assessores. Em seu voo quase solo, segue buscando outro modo de fazer política. Apresentou emenda à comissão de reforma política propondo sete mudanças. São sonhos, mas são lúcidos: 1) A reeleição seria proibida para cargos executivos e permitida apenas uma vez para o Legislativo, sem intervalo. 2) O voto proporcional seria trocado pelo distrital. 3) O financiamento de campanhas seria exclusivamente público, com perda de mandato para os transgressores. 4) Os mandatos poderiam ser revogados pelo eleitorado sempre que o eleito descumprir as promessas de campanha, registradas em cartório. 5) Seria permitida a candidatura avulsa (de pessoas sem filiação partidária), se apoiados por 1% dos eleitores da circunscrição. 6) O voto passaria a ser facultativo. 7) Para ocupar cargos no Executivo, os parlamentares teriam que renunciar ao mandato.

Na campanha. Esqueçamos aquela história de que Dilma só participará da campanha municipal em Belo Horizonte. Ela pode ir também a São Paulo, a depender do que fizer seu vice, Michel Temer. Se ele se empoleirar no palanque de Gabriel Chalita (PMDB), ela pode aterrissar no do petista Fernando Haddad. E se Eduardo Campos for um cabo eleitoral muito ostensivo de Geraldo Julio (PSB), ela pode ir a Recife dar uma força ao petista Humberto Costa. Mas tudo isso depois de 15 de setembro, quando as pesquisas mostrarem o impacto do horário eleitoral no rádio e na tevê.

O dinheiro da educação. O Plano Nacional de Educação 2011-2020 foi enviado pelo ex-presidente Lula ao Congresso em dezembro de 2010 . Dormitou ao longo de 2011, até que em junho a comissão especial surpreendeu o governo ao elevar de 5,3% do PIB para 10% o orçamento do setor. O projeto era terminativo, iria direto para o Senado. Dilma chiou, a ministra Ideli Salvatti entrou em campo e os líderes recorreram para que houvesse a votação em plenário. Agora, o líder Arlindo Chinaglia acertou com os pares a votação para o dia 19. O governo já aceita os 7% do PIB, mas pode chegar até os 10%, desde que os recursos venham dos royalties do pré-sal. Mas isso precisa ser combinado com os russos — os governadores e os prefeitos. Os que vaiaram Dilma quando ela disse que não iria pulverizar os recursos do pré-sal.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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