Quando
a presidente Dilma Rousseff olhava para o lado oposto, na posse do novo
presidente do Supremo Tribunal Federal, passou a impressão de constrangimento.
A foto se prestava ao conceito de “cara de paisagem”, mas não passava de
alegoria sobre a interminável história de corrupção, que deixou de circular
oralmente e passou aos cuidados dos meios de comunicação. É inesgotável o
interesse da classe média pelo tema. De volta à cena, ninguém menos, nem mais,
do que o ex-presidente e eterno candidato, enquanto houver sucessão
presidencial à vista, Luiz Inácio Lula da Silva, que ainda não recuperou a voz
depois de proclamar, com as mesmas palavras e pela segunda vez, sentir-se
“apunhalado pelas costas”. Não se lembrou de que a história não se repete, nem
tem à mão um José Dirceu para fazer papéis ingratos.
Aproveitando-se
o modelo deixado por Machado de Assis, e sem pagar direito autoral, ao cabo de
dois anos e dez mil e.mails, a Polícia Federal, prévia e devidamente
autorizada pela Justiça Federal, quebrou o sigilo de telefones e
mensagens eletrônicas de 19 denunciados por corrupção (ativa e passiva),
formação de quadrilha, tráfico de influência, falsidade ideológica,
violação de sigilo funcional, falsificação de documentos e outra praticas da
moda, que nada ficam devendo ao que se considera o novo modo republicano
de se arrumar para o resto da vida.
Em São
Paulo, onde as cifras são sempre robustas, a Polícia Federal
peneirou dez mil e.mails. Num deles, ninguém menos do que a chefe
do gabinete da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Nóvoa de Noronha
(podem chamá-la de Rose) exagerara em pedidos de favores pessoais ao diretor da
repartição encarregada de lidar, em âmbito nacional, com água que não
seja benta e, para facilitar vidas e dificultar investigações, se apresenta com
o nome de ANA. Tem sido a mão na roda de uma nova categoria de servidores
públicos em franca expansão.
Desde
que o assunto regurgitou, a sede da Presidência da República em São Paulo ficou
atônita, por algum razão que não está clara nem facilita interpretações além da
própria investigação. Por enquanto. O gabinete paulista da Presidência da
República ainda opera em nome do presidente anterior nos mais variados
encontros de que se ocupa, pessoalmente, a própria Rose que trabalha no
passado sem desviar o olho do futuro.
Quem
juntar uma coisa com outra, para entender melhor as 10 mil mensagens
examinadas, vai ver que a representação da Presidência em São Paulo se
considera a casa da sogra, sem ninguém saber o teor político da peça que, antes
de estourar bilheterias, desmonta a sucessão presidencial prevista para 2014.
Da qual, aliás, o eixo tem sido o ex-presidente Lula da Silva. Foi por acaso,
mas no país em que o acaso tem razões que a razão ainda não decifra, é preciso
respeitar o que acontece por fora, inclusive, da lei.
A
oposição se resigna à função de contrapeso do governo para evitar o pior
(como tal entendido o terceiro mandato, do qual o próprio Lula da Silva não
abre mão) e a sucessão presidencial à vista ganha mais nitidez a partir de
agora. Enquanto pesquisas já situam a presidente Dilma à frente da preferência
popular, por indicação espontânea (e não induzida por uma pergunta), o eterno
candidato que se ufana de reduzir a oposição a uma espécie de homenagem inócua
à democracia, dela se serve como quem faz caridade.
A
firmeza com que Dilma Rousseff agiu no episódio de São Paulo diz mais do que
foi declarado pelos tartamudos da política brasileira. E numa área de
risco imponderável, pois não há antecedente para servir de referência a um
governo, até aqui, bipolar. A incerteza é latente em relação ao que pode e o
que não pode ultrapassar a limitada capacidade humana de deter os fatos. O
terceiro mandato presidencial de Lula perde o rumo e cede a precedência a
Dilma Rousseff. As contradições, tudo indica, vão exercer sua função dialética
e a eleição presidencial encerrará a etapa ou começará outra. Depende do modo
de ver.
Fonte:
Jornal do Brasil
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