Todo ano, as cenas se repetem: meu filho e minhas filhas se alvoroçam com a premiação do Oscar, defendem suas preferências e perguntam por quem estou torcendo.
Neste ano, começou agitado, cheio de reuniões e debates, e tive pouco tempo de ir ao cinema. Vi "Lincoln", claro, e também "Os Miseráveis", ambos excelentes. Para além da leitura de épocas, lugares e personagens históricos, são imagens significativas da condição humana e da trajetória sublime e sangrenta de nossa civilização.
O que mais me anima, além da admiração por essa arte que moldou a consciência de um século, é o envolvimento e o debate que ainda propicia aos jovens e que independe de competições ou prêmios. Sempre recebo deles sugestões de filmes que "não posso deixar de ver" e escuto ou leio seus comentários, que ampliam minha visão, aguçam minha escuta e renovam minhas ideias.
O que percebo neles é o interesse vivo pela melhor tradição humanista, mesmo percebendo insuficiências e atrasos diante da complexa realidade contemporânea. É comovente vê-los descobrindo valores como liberdade e solidariedade no interior de uma vivência estética, felizmente sem os limites da pobreza e do autoritarismo que as gerações anteriores enfrentaram. E como são veementes quando nos cobram a manutenção desses valores! Os filhos são, frequentemente, nossos mais severos juízes.
Insisto sempre num termo que, para muitos, parece sem importância: sustentabilidade estética. Não creio que possa haver evolução estável e consistente de nossa sociedade sem ampliação e aprofundamento da sensibilidade, educação da percepção, refinamento da linguagem.
Para mim, o autoritarismo e a devastação que caracterizam a economia e a política insustentáveis só predominam num ambiente em que se usa a vulgaridade e o mau gosto para obscurecer o senso crítico das pessoas.
Os jovens estão ávidos por um novo patamar ético e estético, exigem esse salto e já o antecipam produzindo signos, cores, sons, imagens. Na internet, seu domínio, são criados milhões de galerias para bilhões de novas e antigas obras.
Sonho com o dia em que esses recursos (incluindo o acervo de filmes fantásticos já produzidos) possam atravessar a vida das pessoas, ajudando a elevar o patamar de sustentabilidade estética de nossa sociedade. Começará pela educação, invadirá os ambientes de trabalho e influenciará os discursos políticos, ampliando o acervo das perguntas que organizam o caos de infinitas respostas. Assim nascerão novas harmonias.
E aguardo, ansiosa, os filmes ainda mais fantásticos, que os mantenedores de utopias de todos os tempos continuarão ajudando a produzir pelas mãos de nossos netos e bisnetos.
Fonte: Folha de S. Paulo
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