Um comentário feito ontem pelo ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), durante entrevista a correspondentes estrangeiros, escancara uma porta para ilações sobre uma eventual candidatura sua à Presidência da República, possibilidade que volta e meia surge como especulação nos meios políticos.
Seguindo a trilha aberta pela, esta, sim, provável candidata à sucessão de Dilma, a ex-senadora Marina Silva, o presidente do Supremo disse que "a sociedade está cansada dos políticos tradicionais, dos políticos profissionais. Nós temos parlamentares aí que estão há 30, 40 anos no Congresso, ininterruptamente. E aqui ninguém jamais pensou em estabelecer term limit (limite ao número de mandatos)".
Se pecou pela generalização da tese, pois existem parlamentares que estão no Congresso há 30, 40 anos prestando serviços relevantes ao país (dois exemplos seriam o deputado federal do PDT Miro Teixeira e o senador do PMDB Pedro Simon), mostrou-se afinado com uma tendência crescente na opinião pública, a que rejeita os "políticos profissionais" e quer pessoas na política que não estejam comprometidas com os hábitos e costumes criticáveis de nossa classe política.
No lançamento de meu livro "Mensalão" na terça-feira no Rio, não foram poucas as pessoas que me perguntaram se os condenados iriam para a cadeia e se Barbosa aceitaria ser candidato à Presidência da República. Ontem Barbosa respondeu à primeira pergunta, garantindo que as penas começarão a ser cumpridas ainda em julho deste ano, e deixou no ar a possibilidade de vir a ser uma opção aos "políticos tradicionais".
Um senhor me mostrou no seu iPad uma foto de Joaquim Barbosa em Trancoso, onde passou o fim de semana para um festival internacional de música clássica, dizendo que ele fora ovacionado pela plateia. E o escritor e teatrólogo Roberto Athayde me disse que esperava que Barbosa se apresentasse justamente por não ter nada a ver com os atuais políticos ou partidos. Caso contrário, mostrou-se disposto a apoiar a ex-senadora Marina Silva, por ver nela a tentativa de mudar o perfil de atuação política no país.
O presidente do Supremo, ao dizer que considera "baixíssimas" as penas dos condenados, fruto de um sistema penal "fraco", ecoa a maioria da opinião pública, ainda mais quando afirmou que o processo do mensalão "apontou um caminho correto para a Justiça brasileira e pode encorajar outros juízes a condenar políticos corruptos".
A ex-senadora Marina Silva também tem a ideia de limitar o número de mandatos dos futuros representantes de seu partido a ser criado, e por enquanto é quem encarna, com maior probabilidade de se tornar uma realidade política, a alternativa aos "políticos profissionais". Joaquim Barbosa, por ter sido o relator do processo do mensalão e, agora, da presidência do Supremo, liderar a tentativa de apressar a execução das penas, continua sendo a representação, para a opinião pública, da Justiça que cumpre o seu papel.
Por seu espírito aguerrido, Barbosa não deixa pergunta sem resposta e é incisivo, mesmo quando suas palavras podem provocar problemas políticos. Ontem mesmo, ao comentar a questão dos vetos presidenciais, disse que o Congresso, ao não votá-los, dá a impressão de que não tem capacidade de cumprir suas funções, o que, convenhamos, soa como uma intervenção indevida.
A confrontação entre o Judiciário e o Legislativo a respeito da cassação dos mandatos dos deputados condenados no processo do mensalão, que parecia superada, pode voltar à pauta do dia com essa declaração do presidente do Supremo, e essa é uma das razões por que dificilmente Joaquim Barbosa poderia vir a ser candidato à Presidência da República. As negociações partidárias seriam extremamente difíceis com um candidato tão irascível quanto ele.
Mas é também essa falta de traquejo político e sua fala sem papas na língua que o fazem um potencial candidato daqueles que já estão fartos da politicagem.
Fonte: O Globo
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