• Ex-senadora afirma que mesmo entre aliados dela e de Campos há quem não compreenda o projeto dos dois. Ela criticou o PT por recorrer ao discurso do medo
Sérgio Roxo – O Globo
SÃO PAULO — Em entrevista ao GLOBO, a ex-senadora Marina Silva fala das últimas pesquisas, das dificuldades de compreensão com aliados e como administrar as diferenças.
O GLOBO - O projeto de vocês está mais próximo ideologicamente do senador Aécio Neves ou da presidente Dilma?
MARINA - Vocês trabalham sempre prisioneiros da polarização. Estabelecem como referência para qualquer coisa o PT e o PSDB. É preciso olhar para a realidade que está surgindo no cenário político. Cada vez mais as pessoas estão se colocando numa certa descrença em relação à política. A tentativa que estamos fazendo é termos um projeto político que possa dialogar para melhorar a qualidade da política. É uma tentativa de atualização, que se expressa por aliança programática e não pragmática, e governabilidade com base na execução de um programa, e não na distribuição de cargos. O que estamos fazendo é um esforço para termos uma nova postura. Espero que isso possa ser compreendido. Nesse momento há dificuldade de ser compreendido até por algumas pessoas dentro do nosso próprio campo político.
O GLOBO - Em que episódios transparece essa dificuldade de ser compreendido por aliados?
MARINA - Acho que a dificuldade no debate das candidaturas próprias faz transparecer isso, sim, sem sombra de dúvidas. Mas a maior parte da base do PSB entende. São algumas pessoas que não entendem.
O GLOBO - A senhora, que foi do PT por muitos anos, como vê essa tentativa do partido de tentar propagar o medo?
MARINA - Eu venho de uma realidade tão difícil que o medo como recurso pode parecer a denúncia de um desespero. Fiquei quase 30 anos dentro do PT, e a nossa matéria-prima mais importante era a esperança. Se não há mais esperança e há necessidade de recorrer ao medo, alguma coisa deve estar errada.
O GLOBO - O último Datafolha mostrou que 30% do eleitorado não têm preferência por nenhum candidato. Como a candidatura de vocês pode atrair esses insatisfeitos?
MARINA - Primeiro, tratando essas pessoas com muito respeito porque não é por acaso que elas devem estar refratárias. Essas pessoas não se deixarão atrair. Elas terão que se convencer, e, para serem convencidas, imagino que seja bom que a gente possa ir com propostas e uma nova postura.
O GLOBO - Em Pernambuco, Eduardo Campos não conseguiu aposentar políticos tradicionais do estado, como tem dito que pretende fazer se for eleito presidente, e nomeou parentes, por exemplo, dos deputados Inocêncio de Oliveira e Severino Cavalcanti. A senhora acha que ele fez um governo dentro da nova ou da velha política?
MARINA - O que ele tem dito é que no governo dele a nova política se expressa na coerência do programa. Ele conseguiu fazer uma agenda que, na Educação, na Segurança Pública, no meio ambiente, na forma como escolhia os diretores das escolas, como eram feitos os processos de decisão, não tem nada a ver com Severino Cavalcanti ou com Inocêncio de Oliveira.
O GLOBO - Como a senhora viu pesquisa do Ibope que coloca a senhora como a vice que mais agrega votos?
MARINA - Prefiro ver como resultado da natureza da nossa aliança, que não é um ajuntamento de pessoas, com alguns segundos de televisão, algumas prefeituras, palanques, vereadores e não sei o que mais.
O GLOBO - Qual o significado de não ter uma candidatura própria em São Paulo?
MARINA - O problema de São Paulo é que é o estado mais importante da Federação e que o PSB de São Paulo tem uma estratégia que fortalece o PSDB, e não o próprio PSB. Esperamos que seja revista essa posição.
O GLOBO - O PSB de São Paulo faz a aliança pensando com a cabeça da velha política? Eles fizeram parte do governo Alckmin.
MARINA - Sabíamos das dificuldades que teríamos que enfrentar desde a primeira conversa, partimos do reconhecimento de que éramos dois partidos (Rede e PSB). Vamos nos esforçar para estarmos juntos na maioria dos estados. Onde isso não for possível, manteremos a nossa independência. Não vou subir nos palanques nos estados em que a Rede é independente. No caso do PSB de São Paulo, que tinha assumido o compromisso de que nós teríamos candidatura própria, eu lamento profundamente que eles tenha voltado atrás.
O GLOBO - Como vocês administram as diferenças?
MARINA - Imagino que você na sua redação deve ser diferente dos seus colegas.
O GLOBO - Por que é um equívoco apoiar o PSDB em São Paulo? O que o projeto de Alckmin representa?
MARINA - O PSDB está há 20 anos no governo, e você vê no que se transformou a questão ambiental. É só verificar a crise em relação ao abastecimento de água.
O GLOBO - Mas há uma forma de contornar essa situação em São Paulo?
MARINA - Considero que teremos uma vitória parcial se lançarmos uma candidatura independente para o Senado e não nos coligarmos nas eleições proporcionais (deputado estadual e federal).
O GLOBO - Por que há dificuldade com as alianças?
MARINA - Espero que possa haver uma compreensão de que o mais importante para que os querem fortalecer o nosso projeto é ter candidaturas alinhadas com ele em vez de alinhadas com outros projetos. Não sei por que as pessoas acham natural haver candidaturas para a Dilma e para o Aécio, e criam estranhamentos quando se trata de candidatura para o Eduardo.
O GLOBO - Quem faz isso?
MARINA - O tempo todo, alguns tratam a questão desta forma: está criando um problema porque quer que o Eduardo Campos também tenha um palanque em São Paulo.
O GLOBO - Isso é criar um problema?
MARINA - Imagino que aí a lógica vai em seu socorro.
O GLOBO - O PSB pretende lançar comitês Campos/Alckmin em SP?
MARINA - Não vi em nenhum momento o Eduardo Campos dizer que vai subir no palanque do Alckmin. Se os comitês forem Alckmin, Aécio e Márcio França, aí é outra coisa. A campanha do Eduardo Campos vai ser campanha do Eduardo Campos.
O GLOBO - O PSB de SP acha que pode atrair prefeitos do PSDB para a campanha de Campos.
MARINA - Não trabalho com essa métrica. Trabalho com a nossa determinação de quebrar a polarização.
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