• É inconcebível que até mesmo a oposição se deixe usar, neste momento de esgarçamento da base parlamentar do governo, em ações de Cunha e Renan contra o Planalto
O ministro Mário Henrique Simonsen, também conhecido por ser competente frasista, costumava dizer que em economia não há fundo do poço. Ou seja, ela pode descer a ladeira de uma recessão indefinidamente.
O Brasil já passou por várias crises e sempre se recuperou. Mas, desta vez, adiciona-se aos percalços econômicos, decorrentes dos erros cometidos a partir do segundo mandato do presidente Lula, um imbróglio político desafiador.
Não é sempre que, enquanto a economia entra em pane, transcorre uma investigação do porte da Lava-Jato, em que a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça mapeiam, com provas, um esquema de drenagem de dinheiro público por meio da Petrobras, com a participação de partidos no poder (PT, PMDB e PP) e diretores da empresa. E ainda com o envolvimento de mais um tesoureiro do PT — João Vaccari Neto, o Delúbio da vez, e também encarcerado —, com estilhaços sendo lançados na direção do ex-presidente Lula, por sua proximidade com a empreiteira Norberto Odebrecht.
Como os presidentes da Câmara e do Senado, os peemedebistas Eduardo Cunha (RJ) e Renan Calheiros (AL), também são citados na Lava-Jato, a crise política que acompanha a crise econômica, e se alimentam entre si, cresce em gravidade.
Eis por que o Congresso, no segundo semestre, será fator essencial na estabilização do país. Cunha e Renan já demonstraram ter uma agenda própria, destinada a denunciar uma suposta perseguição de que estariam sendo vítimas do Planalto. Uma tese que não fica em pé, pela impossibilidade de o Executivo impor algo ao Ministério Público e à própria PF, sem que a manobra vire estrondoso escândalo. Tampouco à Justiça.
Buscam, ainda, atemorizar o Planalto, como faz Cunha ao anunciar uma tal agenda-bomba, contra os interesses do próprio país. O deputado fluminense subiu o tom quando O GLOBO divulgou, no site, o depoimento em vídeo do lobista Júlio Camargo, no qual o parlamentar é denunciado por cobrar US$ 5 milhões em propinas do esquema do petrolão.
Por identificar, de maneira fantasiosa, a mão do governo por trás do depoimento, Cunha se declarou em oposição ao Planalto e passou a preparar uma agenda de votações tóxicas para o programa de ajuste fiscal, sem o quê não haverá perspectiva real de recuperação da economia.
Trabalhar para que os vetos presidenciais ao aumento delirante de salários no Judiciário e ao fim do fator previdenciário, por exemplo, sejam derrubados significa desestabilizar ainda mais a economia, depois que as próprias metas do ajuste tiveram de ser revistas.
Cobra-se dos partidos, nesta hora, serenidade. É inconcebível que até mesmo legendas de oposição se deixem usar neste momento de esgarçamento da base do governo. A irresponsabilidade gerada na luta político-partidária não pode chegar ao ponto de dar razão à ironia de Simonsen.
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