Crise da gigante empreiteira é marco do colapso do modelo tradicional de mobilização de capital para grandes obras
O pedido de recuperação judicial do grupo Odebrecht, protocolado no último dia 17, é o maior já registrado no país. Foram incluídas na proteção contra credores 21 empresas do grupo, incluindo a holding, com dívidas de R$ 98,5 bilhões.
Trata-se do ponto culminante da degradação da maior construtora do país, que já chegou a empregar 193 mil pessoas e a faturar R$ 132 bilhões em um ano, mas acabou destruída pelas ondas de choque da corrupção sistêmica que ajudou a produzir. Só tem a culpar a si mesma por seu triste destino.
Agora, caberá à Justiça minimizar danos para a sociedade. O foco principal do que se prenuncia como longa batalha entre credores e acionistas não deve ser perdido de vista —cumpre preservar o que resta de valor na companhia, principalmente os milhares de postos de trabalho ainda existentes.
Os principais bancos do país aparecem entre os grandes credores. O que chama mais a atenção, no entanto, é como os valores se distribuem. Juntas, as instituições privadas —Itaú, Bradesco e Santander— respondem por R$ 9,7 bilhões, dos quais cerca de 85% estão cobertos por garantias.
Nas públicas não se dá o mesmo. BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e até o fundo de investimentos FI-FGTS têm a receber quase R$ 23 bilhões, mas apenas 28% têm algum lastro.
À diferença do que ainda ocorre nas recuperações judiciais brasileiras, não pode haver condescendência com os sócios controladores, em especial num caso em que fraudes estão bem documentadas.
A esse respeito, é relevante, embora potencialmente controverso, o posicionamento do Tribunal de Contas da União, que decidiu por um bloqueio de R$ 1,1 bilhão dos sócios para honrar o pagamento do acordo de leniência celebrado com o governo, agora ameaçado pelo pedido de recuperação.
A quebra da personalidade jurídica da empresa decorre da percepção do TCU de que houve desvio de finalidade no uso dela pelos controladores, que se beneficiaram pessoalmente de sua conduta fraudulenta e por isso devem responder pela reparação de danos com seus patrimônios pessoais.
Por fim, cabe reconhecer o avanço proporcionado pela Lava Jato —o que não significa deixar de apontar vícios e abusos associados à operação jurídico-policial.
Caiu por terra o mecanismo tradicional de mobilização de capital para grandes obras no país —a associação espúria de políticos ansiosos por superfaturamentos com empreiteiras reunidas em cartel, tudo financiado por bancos públicos e fundos de pensão de estatais.
A construção da infraestrutura brasileira, tarefa inescapável nos próximos anos, deve se amparar em novos métodos, mais transparentes, ainda em formação.
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