As
derrotas eleitorais são como desastres aéreos: têm várias causas
O
ambiente adverso que se formou em torno do presidente Jair Bolsonaro ante o
mapa do primeiro turno das eleições municipais serve como projeção certeira (e
definitiva) para o cenário da presidencial de 2022? No mundo político a
concordância geral é de que não, não serve, mas produz importantes indicadores
para os dois campos, pró e contra Bolsonaro.
Os
adversários enxergam um bom momento para reação, mas admitem que isso terá
prazo de validade curto se não souberem dar o aproveitamento adequado.
Reconhecem que as derrotas ocorreram mais em decorrência dos equívocos
cometidos pelo presidente do que por méritos da oposição a ele à esquerda, ao
centro ou à direita.
Fiz
uma lista dos tropeços presidenciais, cruzei com impressões de gente experiente
nos diferentes grupos ideológicos e chegamos aos seguintes pontos em comum
sobre as causas, que, à semelhança dos desastres de avião, são várias.
1 — Excesso de
confiança do presidente em seu poder de sedução eleitoral. Tivesse ele se
mantido a prudente distância dos candidatos não teria se tornado sócio de
derrotas.
2 — Ausência de
organicidade e estrutura partidária. Mesmo quando presidentes não se envolveram
diretamente em campanhas, os partidos no poder central cresceram de modo
substantivo na conquista de prefeituras e quantidade de vereadores. Basta
consultar o mapa das municipais quando PSDB e PT estavam na Presidência.
3 — Os exageros
retóricos de Bolsonaro afastaram muita gente e podem ter cansado o eleitorado.
Esticou demais a corda, trabalhou para um nicho, não falou para a maioria.
4 — Inexistência de rumo no discurso. Jair Bolsonaro não disse ao eleitorado a razão pela qual deveria votar em seus candidatos. Concentrou a motivação no apoio à figura dele. Afinal, por que alguém deveria votar em Wal do Açaí ou desta vez dar uma terceira chance a Celso Russomanno?
5 — Errou a mão
na pandemia e, com isso, foi mal no quesito competência de gestão.
6 — Concentrou-se
excessiva e exclusivamente nos embates digitais. Confundiu urna com rede
social.
7 — Não levou em
conta o passivo acumulado nesses dois anos em que teve papel desagregador. Não
conquistou, só perdeu apoios. O Centrão não vale, porque está aí para o que der
e vier, principalmente para o que vier e der.
8 — Ignorando a
mudança do vento, não adaptou o método, limitando-se a repetir a dinâmica de
2018.
Desenhado
o panorama dos erros, sobram ainda algumas conclusões. Em destaque, duas
dirigidas aos que pretendem se organizar para impedir a reeleição de Bolsonaro.
A primeira é que com a maré baixa não dá mais para culpar a “onda
bolsonarista”, é preciso tratar de convencer o eleitor.
A
segunda é que autoritarismo não se impõe pela força dos gritos se o campo
democrático souber transitar com competência nas veredas abertas pelos erros do
autoritário usando as armas da civilidade, do foco estratégico e da tolerância
entre os ocasionalmente divergentes.
Publicado em VEJA de 25 de novembro de 2020, edição nº 2714
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