Ainda
é cedo para vislumbrar um esfriamento nos ânimos
Começam
a aparecer aqui e ali, na imprensa e nas redes, análises dando conta da
existência de sinais de que o ambiente geral de ânimos acirrados estaria
cedendo espaço à moderação nas relações políticas. Por essa perspectiva, as
pessoas estariam cansadas da radicalização na maneira de externar pontos de
vista e um tanto mais dispostas a não transformar divergências em guerras de
fim do mundo.
Em
boa medida baseada na expectativa de que os americanos dariam uma demonstração
acachapante de repúdio a um governante do tipo de Donald Trump, essa impressão
por aqui se sustenta no fraco desempenho nas capitais (por ora medido apenas
nas pesquisas de intenção de voto) dos candidatos apoiados por Jair Bolsonaro e
pelo PT às eleições municipais do próximo dia 15.
Confirmado
o fracasso eleitoral dos polos antagônicos da eleição de 2018, a projeção para
a disputa presidencial de 2022 seria a tendência de prevalecer o centro, aí
entendido como o campo da moderação, do bom senso, enfim, da racionalidade. Vou
aqui deixar de lado uma predisposição algo obsessiva ao otimismo para
discordar. Ou melhor, ponderar que há precipitação e mais desejo do que senso de
realidade nessa suposição sobre a adesão da maioria à sensatez.
Basta
ver o que faz sucesso hoje em dia: são justamente os comportamentos mais
exacerbados. Conquista fama e destaque aquele, ou aquela, que se expressa em
termos exorbitantes na defesa de suas posições. Seja na defesa ou no ataque ao
governo.
Ambos
os lados se acusam de alimentar ódio e seguem atuando em igual dinâmica odienta
permeada por vulgaridades e palavrões que passaram a ser perfeitamente aceitos
na imprensa em textos de opinião e até mesmo em relatos de informação. Em nome
da liberdade de expressão imprime-se a liberalidade no exercício da falta de
educação.
Ora,
se é socialmente aceito que não se fale nem se escreva de modo civilizado, não
é de esperar que haja uma mudança no modelo de comportamento na política, pois
os que buscam obter êxito nessa seara não atuarão em desacordo com o padrão de
sucesso calcado em insultos e maus modos. Sob pena de não fazerem nem para o
cafezinho na urna. A aludida moderação é muito malvista e seus adeptos são
chamados pejorativamente de “isentões”.
Muito
provavelmente é o carimbo que receberá quem se apresentar à disputa
presidencial fora do esquadro da radicalização. A Bolsonaro a sensatez não
interessa, o que faz seus adversários reagir no mesmo diapasão. Mas, ainda que
haja oponentes civilizados, isso não significa que o eleitorado se sentirá
atraído por eles, preferindo alguém capaz de fazer frente a ele na base do
conflito.
Adoraria
ver, mas tenho dúvida sobre se será possível em breve tempo assistir ao
brasileiro escolher para governar o país uma pessoa reconhecida não pelo poder
de provocar emoções, mas por qualidades consistentes como, por exemplo, notório
saber governamental.
Publicado em VEJA de 11 de novembro de 2020, edição nº 2712
Nenhum comentário:
Postar um comentário