Dissonâncias no partido permitem que se veja melhor quais são os planos e as ambições das distintas correntes
Embora
algum estrago tenha provocado de imediato, não é propriamente ruim, para a
democracia e a dinâmica política que nos levará a 2022, que tenha havido uma
“implosão” no DEM e muito barulho no PSDB em função das dissonâncias e
deslealdades ocorridas na eleição dos presidentes do Congresso Nacional.
Seria
possível incluir o MDB nesse grupo, especialmente porque suas bancadas traíram
Baleia Rossi na Câmara e Simone Tebet no Senado. Mas o MDB foi o que tem sido
desde que cedeu ao fisiologismo e perdeu densidade programática, entregando-se
às flutuações do jogo político miúdo. O MDB tornou-se um partido de alta
elasticidade, que vai para o lado que oferece mais vantagens.
O DEM e o PSDB, porém, não queriam ser assim. Insistiam em afirmar um perfil de centro-direita com leves inflexões à esquerda. E se vangloriavam de ser o esteio de uma articulação liberal-democrática ampla o suficiente para derrotar o petismo e o bolsonarismo em 2022. Tiveram bom desempenho nas eleições municipais do ano passado, mas não conseguiram imprimir velocidade ao jogo, nem manter unidas suas tropas. Ao contrário, vieram à tona todos os personalismos e os mais variados interesses que se abrigavam nas duas legendas. A dispersão foi aguda.
A
implosão do DEM, agora, com as rusgas públicas entre Rodrigo Maia e ACM Neto,
paralisa operações que estavam em curso, mas, ao mesmo tempo, põe as cartas na
mesa e aumenta a transparência: permite que se veja melhor quais são os planos
e as ambições de cada corrente.
Parte
dos demistas está no terreno de um fisiologismo dissimulado, encapuçado, o que
não é propriamente uma novidade ou uma mudança de posição. O presidente
nacional da legenda, ACM Neto, é um defensor destemido da “independência” do
partido, que não deveria se conduzir pelo posicionamento oposição ou governo.
Depois das eleições no Congresso, bateu bastante em Rodrigo Maia (um
“passional” que se “apegou ao poder”) e esclareceu que “jamais estaria com o
governo Bolsonaro”, cujo foco é mais eleitoral que de governo.
Outros,
como Rodrigo Maia, partiram para proclamar sua oposição ao governo atual e para
defender a formação de uma ampla frente oposicionista. Estão sendo abraçados
por João Dória, o que complica um pouco o discurso, dados o caráter camaleônico
e a falta de imagem do governador paulista. Para piorar, Dória resolveu usar o
convite a Maia como recurso para travar a luta interna no partido, propondo o
afastamento do deputado Aécio Neves, o que gerou pronta resposta do parlamentar
mineiro: o “destempero do governador paulista” nada mais seria do que uma
“fracassada tentativa de se apropriar do partido”, uma legenda que não tem
dono.
Se
Maia e seu grupo se soltarem de fato do DEM, poderão ajudar não só a fortalecer
o partido de destino como contribuir para que se saia do discurso genérico da
frente democrática. Que uma articulação é necessária o sabem todos os pássaros
brasileiros. O problema é que não se sabe como alcançá-la com inteligência,
senso de oportunidade e respeito às circunstâncias. Faltam ideias, iniciativas,
lideranças públicas reconhecidas, disposição de luta. Sobram interesses,
cálculos, justificativas e temores. Há ressentimentos e desejos de vingança,
espalhados entre os mais radicais e os mais moderados. As esquerdas, que
poderiam ser um poderoso combustível para a operação, enroscam-se em seus
próprios dilemas.
Uma
boa sacudida na institucionalidade partidária existente poderá ajudar a que se
saia do marasmo. E, mesmo que por vias tortas, contribua para manter em
circulação a ideia de uma articulação democrática que seja competitiva no País,
seja para desenhar um programa de atuação que reverbere efetivamente, seja para
sustentar uma candidatura para 2022.
*Professo
titular de Teoria Política da Unesp
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