sexta-feira, 26 de março de 2021

Vinicius Torres Freire – Como evitar ainda mais horror nas UTis

- Folha de S. Paulo

Cidade de SP arrumou mais 292 leitos em março, mas número de internados aumento 483

Desde 1º de março, a prefeitura de São Paulo abriu mais 292 leitos de UTI para Covid-19. Aumento em 483 o número de doentes internados sob terapia intensiva. A ocupação das UTIs passou de 70% para 90%. No ritmo atual de internações extras na terapia intensiva (na média móvel de 7 dias), as UTIs lotam de fato em oito dias, caso não se arrumem mais leitos.

Antes disso, como já se antevê, começaria o caos terminal, pacientes sendo levados dali para lá, no desespero e risco ainda maior de morte.

A prefeitura diz que tem como arrumar mais alguns leitos. Espera que, com as medidas de distanciamento social, o número total de internados cresça até entre os dias 10 e 15 de abril. Mesmo nessa perspectiva otimista, trata-se de uma situação gravíssima. Se houver relaxamento, é bom nem pensar. É fácil perceber que as medidas restritivas vão durar ou deveriam durar por mais tempo.

A velocidade do número de novas internações diárias em UTI diminuiu em São Paulo e mesmo na média do estado de São Paulo. Além de ser mudança recentíssima (desde o dia 21 de março) e talvez mera variação por acaso, não é um alívio, mas uma desaceleração do desastre ainda sem controle.

Para que se entenda essa desaceleração, segue um exemplo, com números exagerados, para a clareza do entendimento.

Considere-se que, num dia qualquer em alguma cidade, existam 100 internados em UTI e que o número de novos internados cresça 10%. São mais 10 doentes em terapia intensiva, portanto. Imagine-se que, um tempo depois, o ritmo de novas internações tenha caído de modo relevante, para 5%, mas existam então 200 internados. Serão necessários ainda 10 novos leitos de UTI. O ritmo das internações diminuiu, mas não a quantidade de novos doentes graves que precisam de terapia intensiva.

Para que exista algum alívio, o ritmo de novas internações precisa cair muito, o que depende, tudo mais constante, de menos infecções, de menos contato social, de uso rigoroso de máscara etc.

Se até antes de meados de abril houver algum controle da doença, os hospitais da prefeitura de São Paulo precisarão arrumar pelo menos uns 120 novos leitos de UTI. A cidade brasileira com mais recursos está nessa situação e precisa de ajuda do governo estadual, diz o governo paulistano. Se por mais não fosse, pelo menos 20% dos internados é de fora do município.

Colocar um doente na UTI não é liga-lo a uma máquina de tratamento, ou não apenas. É preciso arrumar mais médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, pessoal de apoio em geral. É um trabalho que demanda tempo e esforço intelectual, físico e emocional. Há limite para arrumar tanta gente para cuidar de tantos doentes.

Dependemos de nós mesmos e da competência, maior ou menor, de prefeitos e governadores. Quanto ao governo federal, o país ainda estará largado à própria sorte por algum tempo, na melhor das hipóteses, caso tenhamos de fato um ministério da Saúde. Semanas?

Na melhor das hipóteses. Mesmo depois da criação desse “comitê” nacional para combater a epidemia, Jair Bolsonaro ainda faz campanha e mente sobre medidas de distanciamento social, por exemplo. Cada pessoa convencida a não ligar para medidas de distanciamento é um candidato a ficar doente e passar a doença para mais de uma pessoa.

O aumento do ritmo de vacinação deve dar alguma ajuda em meados de abril, mas auxílio ainda marginal. Se tudo der menos errado na vacina, os efeitos maiores apareceriam lá por fins de maio.

Temos de fazer nossa parte e não ouvir o pregador da morte. ​

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