O Globo
Está em discussão no Congresso uma reforma
das regras eleitorais brasileiras — levada a toque de caixa para poder valer já
em 2022. Noutra oportunidade, falei sobre a falta de representatividade; hoje,
gostaria de falar sob o ponto de vista de combate à corrupção.
Como premissa, devemos lembrar que não
adianta achar que fazer uma nova lei resolverá o problema enquanto sua
aplicação não for aprimorada. Isso passa pela PEC do fim do foro privilegiado e
da prisão após a segunda instância.
No caso específico da reforma eleitoral,
até as poucas melhorias legislativas que estão presentes nas PECs e no projeto
de lei são enfraquecidas pelos próprios mecanismos criados, fazendo com que o
sistema permaneça bom para a impunidade dos maus políticos.
Como exemplo, temos o crime de caixa dois. Há muito tempo sabemos da necessidade de tipificá-lo, tendo em vista que atualmente é usado o artigo 350 do Código Eleitoral para enquadrá-lo como falsidade ideológica. É importante atentar que o caixa dois para financiamento eleitoral não declarado segue como uma das maiores fontes de corrupção do Brasil, visto que os desvios são feitos para financiar campanhas milionárias, o que deve ser rechaçado de maneira contundente.
Se, por um lado, é digna de aplausos a
previsão inserida na reforma, por outro há a criação de novos dispositivos que
trazem redução da transparência na prestação de contas, a possibilidade de
acordo para o réu confesso e, a pior de todas, subjetividade em relação a
valores de punição aplicados para os casos de violação à legislação eleitoral.
Mônica Rosenberg, advogada e cofundadora do
Instituto Não Aceito Corrupção, ressalta que outro ponto crítico é a redução da
transparência e a dificuldade de fiscalização no que toca ao Sistema de
Prestação de Contas Anual, criado pela Justiça Eleitoral em 2018. Com a nova
legislação, cria-se um novo sistema, chamado Sistema Público de Escrituração
Digital, da Receita Federal, cujos dados são de acesso restrito e não
publicados em qualquer plataforma. Além disso, não é possível classificá-los,
inviabilizando o controle social dos gastos de campanha.
Há uma questão interessante quanto à
alteração sugerida em relação ao crime de compra de voto. Na regra atual, as
pessoas envolvidas na compra e venda de voto são punidas com o mesmo rigor.
Isso dificulta a apuração desse crime, porque nenhum eleitor que vendeu seu
voto faz a delação sob pena de punição. Com a alteração proposta, a punição mais
severa é para o candidato que compra o voto, gerando a possibilidade de haver
delação por quem vendeu seu voto, facilitando o combate à impunidade.
Assim, temos que a reforma proposta no
Congresso Nacional não vem sendo realizada para aprimorar o sistema eleitoral,
mas sim para aparelhá-lo, caracterizando-se pela ausência de enfrentamento à
corrupção e fortalecendo o statu quo. Por esse motivo, devemos fazer uma
pressão pública para frear essa antirreforma.
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