Falou e Disse
O Brasil continua sendo o nono país mais
desigual do mundo, segundo o Banco Mundial.
O presidente defendeu a apoiadores em
frente ao Palácio da Alvorada, na sexta-feira 27, que todos tenham um fuzil.
“Tem que todo mundo comprar fuzil, pô. Povo armado jamais será escravizado”,
disse… e ainda ironizou quem se opõe à disseminação das armas. “Eu sei
que custa caro. Daí tem um idiota que diz ‘ah, tem que comprar feijão’. Cara,
se não quer comprar fuzil, não enche o saco de quem quer comprar”, declarou,
antes de embarcar para Goiânia”. (Folha de São Paulo, 27-08-20210)
Simples assim, a forma debochada com que se
expressa o dirigente maior da nação num momento de grande crise econômica e
sanitária que assola o país, sobretudo quando a fome se posta à mesa de quase
100 milhões de brasileiros em condições de insegurança alimentar, sendo que,
destes, mais de 13 milhões se encontram em pobreza extrema, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA) revela que entre a população pobre, 101.854 pessoas vivem em
situação de rua, dos quais “40,1% estavam em municípios com mais de 900 mil
habitantes e 77,02% habitavam municípios com mais de 100 mil pessoas. Já nos
municípios menores, com até 10 mil habitantes, a porcentagem era bem menor:
apenas 6,63%”. Os dados da pesquisa foram estimados com base nas indicações coletadas
em 2015.
São pobres as pessoas que não conseguem garantir ao seu organismo, diariamente, os suprimentos alimentares necessários às suas necessidades básicas para manutenção de suas energias vitais, bem como outras necessidades básicas como artigos para higiene, abrigo, vestuário, educação, cuidados de saúde, etc… “têm fome aqueles cuja alimentação diária não aporta a energia requerida para a manutenção do organismo e para o exercício das atividades ordinárias do ser humano. Sofrem de desnutrição os indivíduos cujos organismos manifestam sinais clínicos provenientes da inadequação quantitativa (energia) ou qualitativa (nutrientes) da dieta ou decorrentes de doenças que determinem o mau aproveitamento biológico dos alimentos ingeridos”. (Carlos Monteiro in Segurança Alimentar)
O presidente finge que não sabe disso
porque aconselha a população a comprar fuzil, no lugar de comprar alimentos.
Procura assustar as pessoas e lança aos seus apoiadores avalanches de propostas
desconectadas diante de uma situação de um governo que caminha para sua
finitude sem cumprir as propostas de campanha.
Na verdade, deveríamos fazer um grande
esforço para não tomar conhecimento das mediocridades faladas no cercadinho do
palácio, mas a indignação bate forte.
Ontem fui à feira e no mercado um
quilo de feijão custava R$14; um quilo de pimentão verde, R$ 7; uma cesta
básica com 36 itens ao preço de R$197 com (04 detergentes – feijão
2kg – 01 arroz 5 Kg – 02 pacotes de macarrão parafuso – 02 pacotes
de macarrão espaguete – 02 molho de tomate – 02 óleo de soja – 01 farinha de
trigo 1kg – 02 pacotes de papel toalha – 02 pacotes de papel higiênico com 4
rolos – 03 caixas de creme de leite – 02 caixas de leite condensado – 01 vidro
de leite de coco – 10 pacotes de miojo sabores variados).
Não há carnes no rol de alimentos das
cestas básicas. Algumas, as mais sofisticadas contam com latinhas com sardinha.
A carne de charque, antigamente mais consumida com a macaxeira pelos pobres do
nordeste, custa atualmente entre R$ 38 e R$ 52 o quilo.
As cestas básicas são vendidas no comércio,
a crédito, com juros agora mais altos. Imagine um país em que seu povo tem que
sobreviver comprando cesta básica em 10 vezes.
É uma vergonha absoluta!
É possível que toda essa situação seja
desconhecida do presidente e seu ministro da Economia, que diante da falência
de seus projetos e suas reformas, anda falando seus impropérios nas redes
sociais como “se a energia fica cada vez mais cara não há problema”.
As famílias pobres, as que têm vários
filhos, sobrevivem com os recursos do Bolsa Família e da solidariedade de Ongs,
outros organismos e movimentos sociais que distribuem uma cesta básica por mês
para cada família.
Pode ser que a economia tenha iniciado o
seu processo de recuperação. No entanto, quase da metade da população
brasileira vive atualmente em condições de desigualdade e pobreza aguçadas pela
crise econômica e a pandemia em 24 dentre as 27 unidades da federação, segundo
a Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O Brasil continua sendo o nono país mais
desigual do mundo, segundo o Banco Mundial.
O Movimento Brasil Sem Pobreza nos alerta
através do seu manifesto: “É hora de deixar de lado o que nos separa e de
valorizar o que nos une. Nenhum problema poderá ser bem resolvido enquanto a
pobreza absoluta persistir. Com ela, não há desenvolvimento que se sustente.
Acabar com a pobreza deve ser a prioridade dos orçamentos e das políticas de
educação, saúde, assistência social, segurança alimentar, urbanização; das
empresas; dos movimentos sociais; dos bancos; das universidades; das políticas
tributárias; da política agrícola, da fundiária, da ambiental. Dos poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário. Da democracia como um todo”.
Rumo às eleições de 2022 a sociedade deve
estar atenta a sua realidade e concentrar esforços na construção de uma unidade
das forças progressistas para romper com o ciclo de pobreza, desemprego,
violência e negacionismo.
Não precisamos comprar fuzis.
O Brasil tem uma grande agenda que reflete
as necessidades do nosso povo: revitalização da economia com garantia do poder
de compra sem inflação; recuperação do emprego em todas as regiões do país;
apoio à agricultura familiar com distribuição de terra; cumprimento das metas
do Plano Nacional de Educação; fortalecimento do SUS com garantia ampla de
atendimento às famílias nas unidades municipais de saúde; o ponto de partida e
garantia de saneamento básico; políticas básicas de proteção aos povos
indígenas, ribeirinhos e quilombolas, sobretudo com preservação de seus
territórios.
No momento, precisamos fortalecer a
Democracia, sendo solidários com os que precisam comprar feijão, abominando a
ideia de que é preciso comprar armas e acreditando na força do diálogo.
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
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