O Estado de S. Paulo
Enquanto em Brasília se discute crise entre
os poderes, no Nordeste o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem fechado
acordos para sua candidatura ao Palácio do Planalto com aliados do governo
federal. Em sua primeira caravana pela região desde que voltou à cena política,
Lula costura arranjos regionais com partidos que subiram ao altar com o
presidente Jair Bolsonaro. Na prática, o Centrão está com Bolsonaro nas “quatro
linhas” da Câmara, mas não tem fidelidade a ele fora do quadradinho, como a
capital do País é conhecida.
As traições começam a se revelar justamente
no Nordeste. Principal partido do Centrão, o Progressistas (PP) do presidente
da Câmara, Arthur Lira (AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, já
rachou.
Hoje no núcleo duro do Planalto, Nogueira sempre foi considerado um hábil articulador político. Esteve com o PT num passado não muito distante, apoiou a candidatura de Fernando Haddad à Presidência em 2018 – embora o PP tivesse lançado a senadora Ana Amélia como vice na chapa de Geraldo Alckmin (PSDB) – e agora é definido por Bolsonaro como “a alma do governo”.
Poucos observaram, no entanto, que, em seu
discurso de posse, Nogueira mesclou o slogan de Bolsonaro – Brasil acima de
tudo, Deus acima de todos – com Viva o povo brasileiro!, romance de João Ubaldo
Ribeiro conhecido por explorar o “embaralhamento” de posições em uma sociedade
como a nossa.
Líder nas pesquisas de intenção de voto,
Lula diz agora achar difícil que Nogueira tolere esse casamento de papel
passado com Bolsonaro por muito tempo. Pré-candidato ao governo do Piauí, o
ministro da Casa Civil tem bons motivos para deixar o Planalto, mas o fato é
que, além dele, outros expoentes do PP e do Centrão, como os deputados Dudu da
Fonte (PE) e André Fufuca (MA), hoje presidente do partido, apoiam Lula. Dudu é
ligado a Nogueira, assim como Fufuca. Interlocutor assíduo do ex-presidente,
Dudu esteve com ele em Brasília e agora no Recife. Quer concorrer ao Senado,
assim como os deputados Silvio Costa Filho (PE), do Republicanos – legenda do
Centrão associada à Igreja Universal – e André de Paula (PSD). Todos esses
partidos são aliados do governador de Pernambuco, Paulo Câmara, que é do PSB e
está com Lula.
“O Centrão não é um partido. Quando chegar
a campanha de 2022, cada partido (do bloco) irá pensar como é que está sua
tribo no seu Estado. Estou cansado de ver candidatos a presidente serem
rifados”, afirmou Lula, em Teresina. Além de Pernambuco e Piauí, essa caravana
pelo Nordeste inclui Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte e vai terminar na
Bahia, onde o vice-governador João Leão é do PP.
Atento às movimentações de seu principal
adversário, Bolsonaro intensificou as viagens pelo Nordeste. Nos bastidores, o
marqueteiro João Santana, hoje com Ciro Gomes (PDT), tem dito ser quase
impossível que um candidato em primeiro lugar nas pesquisas a mais de um ano
das eleições, como Lula, mantenha essa posição até outubro de 2022, pois ainda
levará muita sapatada.
O Nordeste onde os dois Ciros – o Gomes e o Nogueira – construíram suas trajetórias políticas é cada vez mais disputado por ser um poderoso celeiro de votos, capaz de definir uma eleição. Nesse jogo, até o governador de São Paulo, João Doria, que vai concorrer a prévia para escolha do candidato do PSDB ao Planalto, tem lembrado que seu pai era baiano. Até agora, porém, a terceira via não conseguiu furar a polarização entre Lula e Bolsonaro. Mas, como diz Fufuca, “muita água vai rolar debaixo da ponte até 2022”. Principalmente no mar do Nordeste.
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