O Estado de S. Paulo
As projeções do mercado ainda apontam inflação longe da meta no próximo ano e em parte de 2027
Desemprego baixo e comida na mesa têm garantido pontos para o governo, mas a economia perde impulso e nada prenuncia algum dinamismo nos próximos anos. A atividade tem sido puxada pelos serviços e pela agropecuária, enquanto o desempenho da indústria continua medíocre. O investimento produtivo – em máquinas, equipamentos, construções e tecnologia – oscila segundo os padrões do último quarto de século. O valor investido tem superado muito raramente os 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e com frequência tem ficado abaixo de 18%.
A formação de pessoal de nível médio, um
ponto forte de outras economias emergentes tem sido valorizada pelo governo,
mas a indústria continua a cobrar uma oferta maior dessa mão de obra. Não só a
indústria, no entanto, precisa de trabalhadores mais qualificados para ganhar
produtividade e crescer mais velozmente. O setor mais vigoroso e mais eficiente
da produção brasileira, a agropecuária, tem atraído esses profissionais. Os
serviços ainda oferecem oportunidades a todo tipo de pessoal, mas também aí a
qualificação ganha relevância.
Ao contrário do governo anterior, a atual
administração federal mostra percepção da importância de combinar educação
básica, formação profissional, ciência e tecnologia como essenciais para o
crescimento econômico, a modernização produtiva, a competitividade externa e o
desenvolvimento social. O termo “neoindustrialização” tem sido usado como
qualificação de política no Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio
e Serviços. É cedo para dizer se essa palavra descreve uma novidade efetiva,
mas a mera referência a uma atualização da política industrial é um dado
promissor.
É difícil pensar numa política setorial
bem-sucedida, no entanto, sem levar em conta o conjunto dos objetivos e das
ações governamentais. Ministros e suas equipes podem ter planos e programas
importantes para o País, mas o sucesso de seu trabalho depende, em grande
parte, de condições criadas pela Presidência da República. Em Brasília, essas
condições têm sido pouco propícias a políticas sustentáveis de modernização e
crescimento.
Condição inicial para qualquer planejamento,
público ou privado, é o reconhecimento da limitação de recursos. Reconhecido
esse ponto, selecionam-se os gastos e cortam-se despesas – procedimentos nem
sempre valorizados na cultura petista e nos padrões seguidos pelo presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
Ações presidenciais podem afetar de várias
formas as condições do governo. Exemplo: quando despreza as contas e gasta sem
cuidado, o presidente bagunça a programação orçamentária, ameaça o equilíbrio
fiscal e gera riscos inflacionários. Se estiverem atentos e comprometidos com
seu trabalho, dirigentes do Banco Central (BC) poderão ser levados a apertar a
política monetária, elevando a taxa básica de juros ou talvez decidam
simplesmente adiar seu afrouxamento. Isso ocorreu no Brasil, onde o Comitê de
Política Monetária (Copom) resolveu, em recente reunião, manter por tempo
indeterminado a taxa básica de 15% ao ano. Nos Estados Unidos, dirigentes do
Federal Reserve (Fed), o BC americano, simplesmente tornaram mais lenta do que
se esperava a redução dos juros.
Nos dois casos, houve reclamações de
empresários e de políticos. Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump
ameaçou intervir no Fed e demitir seu presidente, Jerome Powell, mas seria
difícil fazê-lo sem atropelar a lei, houve advertências e ele desistiu da ação
autoritária. Não desistiu, no entanto, de indicar como substituto de Powell,
dentro dos prazos legais, uma figura supostamente fiel a seus padrões. Se
quiser, o atual chefe do BC americano poderá continuar no posto até o fim de
seu mandato, em maio do próximo ano.
No Brasil, o presidente da República
desistiu, aparentemente, de dar palpite na política monetária e de reclamar do
presidente do BC, Gabriel Galípolo. Quem ainda reclamou, recentemente, foi o
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apesar de sua velha ligação com Galípolo.
Mas também Haddad acabou cuidando de outros assuntos e deixando de lado a
divergência sobre a política monetária.
Juros altos podem estar atrapalhando a
economia, mas a taxa básica, segundo as projeções dominantes, deve ser mantida
até o fim do ano e, talvez, durante o primeiro trimestre de 2026. Mas a
economia tem fraquejado e, se houver claros sinais de recuo da inflação, talvez
o Copom se disponha a atenuar sua política.
As projeções do mercado, no entanto, ainda
apontam inflação longe da meta no próximo ano e em parte de 2027. Pela
estimativa registrada no boletim Focus de segunda-feira passada, os preços ao
consumidor devem fechar o ano com alta de 4,46% e subir 4,20% em 2026. Para o
ano seguinte a estimativa é de 3,80%, ainda razoavelmente distante do centro do
alvo, 3%. Mas o teto da meta, 4,50%, talvez seja alcançado já no final deste
ano. Se isso ocorrer, o governo poderá moldar a política econômica a seus
objetivos eleitorais com menor risco de uma recaída inflacionária. Por
enquanto, isso é apenas uma expectativa quase otimista.

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