domingo, 22 de abril de 2012

Delta obteve aumento de preço em 60% dos contratos


Um dos alvos da CPI do Cachoeira, construtora teve aditivos em l54 das 265 obras com Dnit

Um dos alvos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) do Cachoeira, a Delta Construções obteve aditivos que alteraram o valor de quase 60% dos contratos com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), um dos responsáveis pelas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). De um total de 265 empreendimentos, 154 sofreram mudanças no valor original, aumentando o custo das obras em cerca de R$ 400 milhões, informa o repórter Fábio Fabrini. Compilados pelo Estado, os dados se referem a manutenção, adequação, duplicação e implantação de estradas, concluídas ou ainda em andamento. Desde 2004, a Delta obteve 52 contratos sem licitação, cujos valores alcançam cerca de R$ 328 milhões.

Delta obteve aumento de preço em 60% dos contratos firmados com Dnit

Alvo de CPI, construtora conseguiu aditivos que elevaram custo original de obras em R$ 400 milhões; TCU já avaliou que mais de 40% de acréscimos é exagero

Fábio Fabrini

BRASÍLIA - Suspeita de montar uma rede de influência tanto em governos estaduais como na União, a Delta Construções obteve aditivos que alteraram o valor de suas obras em quase 60% dos contratos firmados com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), um dos órgãos que concentram os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

De um total de 265 empreendimentos tocados pela empreiteira a serviço da autarquia responsável pelas rodovias federais, 154 sofreram mudanças no valor originalmente previsto, custando mais caro na maioria dos casos e aumentando o valor das obras em cerca de R$ 400 milhões.

Compilados pelo Estado com base em balanço do Dnit sobre os contratos com a Delta, os dados se referem às obras de manutenção, adequação, duplicação e implantação de estradas, concluídas ou ainda em andamento. Da relação, constam intervenções iniciadas de 1996 a 2012. Maior construtora do PAC, com suas atividades concentradas principalmente no setor rodoviário, a empresa conseguiu contratos de R$ 4,3 bilhões de lá para cá, dos quais R$ 3 bilhões já foram pagos pela União.

O protagonismo da Delta no carro-chefe do programa de infraestrutura da presidente Dilma Rousseff e a existência, segundo a Polícia Federal, de um "deltaduto" que se aproveitou do circuito financeiro de empresas de fachada do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, preso na Operação Monte Carlo, colocaram a empresa como alvo da CPI a ser instalada na quarta-feira.

Instrumentos previstos para ajustar o preço dos serviços à realidade encontrada em campo, os aditivos contratuais acrescentaram R$ 395,5 milhões aos valores originais – aumento de 9,1%. A Lei de Licitações determina limite de 25%, exceto nos casos de conservação ou prestação contínua, cujos acréscimos podem ser maiores. Técnicos do Dnit sustentam que o porcentual referente à Delta está dentro do padrão de obras rodoviárias citado na literatura técnica, que prevê margem de erro de até 15% no preço de intervenções iniciadas a partir de projetos básicos.

A autarquia também não considera alto o porcentual de obras da Delta com acréscimos (60%), argumentando que imprecisões de projeto são do dia a dia da engenharia e impactam os preços. Ao analisar a questão, no entanto, o Tribunal de Contas da União (TCU) considerou excessiva fatia menor (40%) e concluiu que os aditivos viraram uma figura "institucionalizada" na autarquia.

Vacina. Os acréscimos contratuais foram uma das fontes da crise que, no ano passado, derrubou a cúpula do Ministério dos Transportes. Dirigentes do Dnit foram acusados de cobrar propina para permitir os aditivos, favorecendo empreiteiras. A proliferação de contratos suspeitos e de grampos da PF mostrando que agentes a serviço da Delta, como o próprio Cachoeira, operaram para obter negócios públicos no governo federal e nos Estados levou a Controladoria-Geral da União (CGU) a começar um processo para transformar a empresa em inidônea, como revelou ontem o Estado. O movimento reativo da CGU busca vacinar o governo federal do desgaste da CPI, afastando a Delta dos contratos federais.

Segundo auditoria aprovada em 2010, de 926 contratos do Dnit vigentes em 2009, 43% sofreram aditivos de valor e 39% tiveram alterações para aumentar o prazo de entrega das obras – o que também impacta o preço, por causa da necessidade de correção periódica para atualizar o custo de materiais e serviços empregados na obra.

Uma das razões, aponta o tribunal, é o tempo excessivo transcorrido entre o momento em que a obra é projetada e quando, finalmente, sai do papel. Na hora em que os tratores entram em ação, o esboço feito para o empreendimento já está obsoleto. Somam-se a isso os estudos mal feitos, que acabam impactando o valor no momento da execução. "Da amostra analisada, 100% dos contratos foram aditivados por falhas ou desatualização do projeto", diz o relatório do TCU.

"Mergulhos". No caso da Delta, um dos motivos para a quantidade de aditivos, citado por fontes da autarquia, é a estratégia de atuação em licitações. A empresa é conhecida por "mergulhar" preços para vencer as concorrências – isto é, oferecer valores abaixo do que se considera viável –, cobrando acréscimos depois para reequilibrar o contrato.

Um estudo realizado pelo Dnit em 2010 – sob a gestão do ex-diretor-geral Luiz Antônio Pagot – mostrou que a empreiteira, em média, oferecia desconto de 16% sobre o valor apresentado pelo órgão federal nas disputas, o que correspondia ao dobro das concorrentes.

A Delta domina principalmente a manutenção rodoviária no Dnit, tendo obtido, segundo o balanço da autarquia, R$ 3,4 bilhões em contratos nessa área, ou 80% do total que pactuou. Os pagamentos alcançaram R$ 2,6 bilhões – 85% do total.

A nova cúpula do Dnit, que assumiu após a "faxina" promovida pela presidente Dilma Rousseff em 2011, diz que mudanças na estrutura vão melhorar a precisão das obras e reduzir a necessidade de acréscimos contratuais. Uma das medidas é a obrigação de se licitar obras apenas a partir de projetos executivos, considerados mais exatos que os básicos, usados como referência anteriormente. Além disso, a autarquia informa que a compra de softwares para a elaboração de projetos e a capacitação de pessoal, já em curso, vai melhorar a performance e evitar distorções de preço.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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