Apesar de apoiarem a abertura de CPI e se prepararem para o embate, governo
e oposição temem revelações de bicheiro
Fábio Schaffner
Brasília vive dias tensos. O motivo da apreensão tem nome, sobrenome e
apelido: Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Poucas vezes os segredos guardados por uma única pessoa causaram tanta
preocupação ao governo e à oposição. Não é para menos. Apontado pela Polícia
Federal como o líder de uma organização criminosa composta por mais de cem
pessoas, entre contraventores, políticos, servidores públicos, arapongas e
policiais, Cachoeira está na gênese dos dois maiores escândalos de corrupção da
história recente.
Mentor da gravação do vídeo que deu origem ao primeiro escândalo do governo
Lula (envolvendo Waldomiro Diniz), o bicheiro agora é a peça-chave da CPI que
irá investigar as ramificações de seus negócios com políticos e com a Delta
Construções, a empresa que mais recebe verbas do governo.
– Essa será a CPI mais sangrenta da história do Congresso – sentencia o
presidente do PMDB, senador Waldir Raupp (RO).
O primeiro abatido foi o senador goiano Demóstenes Torres, cujo mandato está
sob ameaça. As imprevisíveis consequências da CPI, contudo, assustam
congressistas de todas as matizes partidárias. Em Anápolis, terra do bicheiro, comenta-se
que ele guardava uma tabela de valores que pretendia pagar a parlamentares em
troca da legalização do jogo no país.
Planalto teme instabilidade
Dinheiro não faltaria. Embora tenha declarado à Receita rendimentos de R$ 60
mil em 2010, as investigações mostram que o grupo de Cachoeira movimentou R$
400 milhões nos últimos seis anos. Para não passar recibo do temor que permeia
o Congresso, mais de 450 parlamentares assinaram a CPI. Agindo à revelia da
presidente Dilma Rousseff, Lula insuflou o PT, partido que mais contribuiu com
assinaturas para a comissão.
– A CPI é muito ruim para o governo. Traz um clima de instabilidade no
Congresso, pode nos atrapalhar – diz um assessor de Dilma.
Lula, contudo, acredita que a iniciativa pode enfraquecer a oposição e, de
quebra, desviar o foco do mensalão, cujo julgamento deve ocorrer ainda no
primeiro semestre. Embora o governo tenha contratos de R$ 3,6 bilhões com a
Delta, Lula confia que a ampla maioria aliada na CPI (80% dos assentos),
garanta uma blindagem ao Planalto. Em outro flanco, o ex-presidente espera
atingir a candidatura do tucano José Serra à prefeitura de São Paulo. De 2005
(quando Serra era prefeito) até agora, a construtora já recebeu R$ 329 milhões
dos cofres paulistanos.
– Temos de usar a maioria para evitar o que for inconveniente. Unir os aliados,
colocar gente de confiança nos postos-chave e não deixar que a CPI contamine o
governo – orientou Lula.
Na oposição, o apetite é semelhante. Parlamentares se preparam para
esquadrinhar cada um dos contratos da Delta no PAC. O objetivo é chegar em
Dilma, que, como ministra da Casa Civil e gerente do programa, monitorava os
empreendimentos.
A dúvida que atormenta Brasília é o que pensa e como pretende agir, o homem
que, de acordo com a PF, subornava autoridades, municiava a imprensa com
denúncias contra desafetos e se valia de uma rede de aliados infiltrados no
poder. Não por acaso, o Senado enviou um ofício ao Ministério da Justiça,
manifestando preocupação pela vida do contraventor.
FONTE: ZERO HORA (RS)
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