Alteração
no FGTS e na casa própria
Projeto do governo que muda o ganho da poupança atingirá o crédito
imobiliário e os depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, com o fim
da TR
Vicente Nunes
A determinação da presidente Dilma Rousseff de mexer nos rendimentos da
caderneta de poupança para facilitar a queda da taxa básica de juros (Selic)
dos atuais 9% para até 8% nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária
(Copom) implicará mudanças em outros pontos sensíveis: o financiamento da casa
própria e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
As razões são claras. O crédito imobiliário para a classe média é bancado
exclusivamente pelos depósitos na caderneta. De cada R$ 100 aplicados na mais
tradicional modalidade de investimentos do país, no mínimo, R$ 65 devem ser
obrigatoriamente destinados à casa própria. Além disso, as prestações são
atualizadas pela Taxa Referencial (TR), que também corrige os recursos da
poupança. Pelos dois projetos preparados pelo Ministério da Fazenda, para
alterar o ganho da caderneta, a TR será extinta. É aí que entra o FGTS. Por
lei, o dinheiro dos trabalhadores é remunerado em 3% ao ano mais a TR. A
tendência é de que os depósitos feitos pelas empresas passem a ter somente a
taxa fixa, compatível, no entender de técnicos da equipe econômica, com a nova
realidade de juros no país.
"Todos terão de dar a sua cota de sacrifício, pois se ganhará de outro
lado, com a diminuição dos juros dos empréstimos e financiamentos", diz um
assessor do Palácio do Planalto. "Não se pode esquecer que a possível
diminuição do rendimento da caderneta e do FGTS será depois da vírgula. Já nos
juros do crédito, o impacto é bem maior. Assim, a economia com as prestações cobrirá
qualquer perda de rentabilidade", acrescenta. Ele lembra que será esse o
discurso difundido pelo governo para convencer a população de que está
"fazendo o melhor para o país" e não um confisco da poupança, como
houve em 1990, no governo Collor.
O Palácio do Planalto acredita que terá boas notícias a dar à classe média,
que tanto preserva o patrimônio na poupança e recorre aos financiamentos
habitacionais. Se a remuneração da caderneta diminuir um pouco e a TR for
extinta, os juros cobrados no crédito imobiliário também poderão cair. "É
com essa realidade que estamos trabalhando", afirma um técnico do
Ministério da Fazenda. A seu ver, tudo está apontando para o governo pôr fim ao
entulho que ainda resta no mercado financeiro, ou seja, a indexação decorrente
dos tempos de hiperinflação. "A TR é um deles", acrescenta.
Distorção
Para o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do Banco Central,
as mudanças propostas pelo governo são bem-vindas. Mas para que realmente a
população tire proveito delas é preciso que, efetivamente, a taxa básica caia e
permaneça em um patamar baixo por um longo período. E isso exige um controle
efetivo da inflação. "Se os ganhos da caderneta forem realmente atrelados
à Selic, como estão dizendo, em um momento de elevação dessa taxa os ganhos da
poupança vão aumentar assim como as prestações da casa própria", ressalta.
Na sua avaliação, o debate sobre mudanças na estrutura de um sistema
financeiro criado para conviver com uma inflação alta é importantíssimo. Mas, a
seu ver, o governo deveria propor as alterações somente a partir do segundo
semestre, quando, efetivamente, os consumidores terão a exata noção se o
prometido corte de juros pelos bancos públicos e privados é para valer.
"Com a fraqueza atual da economia, a procura por crédito está contida. À
medida que a atividade for ganhando força, a demanda por empréstimos e
financiamentos se fortalecerá. É aí que poderemos ver se o anunciado
barateamento do crédito foi real ou se não passou de uma campanha de marketing",
destaca.
O economista vai além. "Ainda há um longo caminho para que os juros do
crédito no Brasil sejam comparados aos de países civilizados. Os bancos
precisam reduzir muito o spread (diferença entre o que pagam aos investidores e
o que cobram dos devedores", diz. No Brasil, o spread médio é de 30 pontos
percentuais contra cinco pontos nas nações que integram a Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne as nações mais
desenvolvidas do planeta.
Minutas prontas
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, preparou duas minutas de medidas
provisórias para apresentar à presidente Dilma Rousseff, propondo mudanças na
remuneração da caderneta da poupança. No primeiro, os investidores terão
remuneração equivalente a 80% da taxa básica de juros (Selic), que está em 9%
ao ano. No segundo, serão criadas de seis a nove faixas de rentabilidade para
os depósitos. Ainda nesta semana, Mantega se encontrará com Dilma para discutir
o assunto.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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