quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Dilma deve entregar juros maiores do que recebeu

Disparada do custo de vida faz o Banco Central elevar a Selic para 10,5% ao ano. Analistas esperam pelo menos mais uma alta, em fevereiro, mesmo que em proporção menor. Com isso, a taxa deverá voltar ao nível do início do governo

Deco Bancillon

As previsões mais pessimistas do mercado financeiro se concretizaram: em decisão unânime, o Banco Central (BC) optou, ontem, por elevar o juro básico da economia em 0,5 ponto percentual, para 10,5% ao ano. Foi a sétima alta consecutiva em menos de um ano. E, a julgar pelo comunicado divulgado instantes após o término da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC deixou a porta aberta para, pelo menos, mais uma alta da Selic em 2014, ao usar a expressão “neste momento” para explicar a decisão. “A leitura que fizemos foi a de que aumentou a probabilidade de mais uma elevação, mas talvez num ritmo menor do que foi feito até agora”, disse a economista Tatiana Pinheiro, do Santander.

Mesmo que o ajuste na taxa seja de 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Copom, marcada para fevereiro, os juros já terão retornado para o patamar em que a presidente Dilma Rousseff os encontrou. No fim da gestão Lula, em dezembro de 2010, a Selic estava em 10,75% ao ano. Terá sido enterrada de vez, então, a bandeira política que a presidente fez tantas vezes questão de empunhar: a de ter levado a taxa básica para menor patamar da história. Além disso, dada a virulência da inflação, os analistas não descartam a possibilidade de novas altas mais à frente, o que colocaria a presidente na posição incômoda de entregar juros mais altos do que aqueles que encontrou no início do mandato.

Susto
Em junho de 2011, sob orientação do Palácio do Planalto, o BC deu início à derrubada da Selic, mesmo com a inflação mostrando força. Naquele ano, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou no limite de tolerância estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional, de 6,5%. Mesmo assim, a autoridade monetária deu sequência ao plano de voo. Em outubro de 2012, o objetivo foi atingido. Pela primeira vez na história, a Selic havia chegado a 7,25% ao ano — patamar, entretanto, no qual ficou por apenas seis meses. Em abril de 2013, com a persistência da inflação muito acima da meta de 4,5%, o BC voltou atrás e deu início ao processo de elevação da taxa.

No meio do caminho, um susto. Em julho de 2013, o IPCA ultrapassou 6,7%. Foi o alerta que faltava para que o Palácio do Planalto avalizasse uma postura mais agressiva do BC. Ao todo, em 2013, foram sete altas na Selic, seis delas de 0,5 ponto percentual. Parte do mercado financeiro esperava que o BC, por entender que o ajuste feito em 2013 já teria sido suficiente, reduzisse o ritmo, ontem, para 0,25 ponto. “Tudo levava a crer que era esse o plano do BC”, disse o economista-chefe do BES Investimento, Jankiel Santos.

Em dezembro passado, porém, o IPCA disparou 0,92% — a maior variação mensal dos últimos 10 anos. “Mais importante do que o número em si é o fato de que estamos há quatro anos com uma inflação sistematicamente perto de 6%, quando a meta que deveria ser perseguida pelo BC é 4,5%”, disse a economista Mônica Baumgarten de Bolle, sócia da Galanto Consultoria. “Mesmo assim, não parece haver, da parte do governo, nenhuma intenção de frear esse processo”, concluiu.

Pressões
Um dos fatores que joga contra a inflação é a alta do dólar, que pode tornar os produtos importados ainda mais caros para o consumidor. “O câmbio tem tudo para subir”, afirmou o economista Sidnei Nehme, da NGO Corretora, um dos maiores especialistas do país nessa área. “Existem diversos elementos sugerindo uma saída de recursos do país ainda mais forte do que a verificada no ano passado”, disse.

Em 2013, o fluxo cambial, que mede as saídas e entradas de dólares no país, atingiu o pior resultado em 11 anos. A conta ficou negativa em US$ 12,261 bilhões, resultado de maciças remessas de recursos de empresas estrangeiras e da piora na confiança do mercado financeiro nas ações do governo Dilma.

O que reforçou o pessimismo, diz Nehme, foi a piora na situação fiscal do país, que levou duas das três maiores agências de classificação de risco do mundo a ameaçar reduzir a nota de crédito do Brasil. Para tentar recuperar a confiança, o governo anunciou neste mês que o superavit nas contas públicas foi de R$ 75 bilhões em 2013. Como só foi conseguido com base em receitas extraordinárias, o número não convenceu. “A alta dos juros tenta recobrar a credibilidade perdida pelo governo. Mas de nada adianta fazer política monetária de um lado e não fazer política fiscal de outro. Assim, todo o esforço de trazer a inflação para baixo está recaindo totalmente sobre o BC”, disse Mônica Baumgarten.

Fonte: Correio Braziliense

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