– O Estado de S. Paulo
Eleição após eleição, o sistema político brasileiro gasta mais dinheiro arrecadado junto a um grupo menor de empresas para eleger um Congresso cada vez mais disperso e menos funcional. A síntese extraída do resultado das urnas e da prestação de contas dos partidos pelo Estadão Dados é dura só na aparência. O sistema é tão bom que quem é do ramo não quer mudá-lo. Fácil entender por quê: é eficiente, eficaz e lucrativo.
O Congresso a ser empossado em 2015 será o mais caro da história. Somando-se tudo que os 513 deputados e 81 senadores declararam ter arrecadado em suas campanhas, a fatura chega a R$ 1,1 bilhão. É 11% mais, já descontada a inflação, do que o gasto para eleger os membros da legislatura que está chegando ao fim – e que havia sido mais cara do que a anterior, e a anterior etc.
Embora milhares de empresas e pessoas contribuam financeiramente para candidatos, um clube restrito libera a maior parte do dinheiro para os partidos. Metade das doações empresariais para os congressistas eleitos em 2014 veio de só 1,5% dos doadores. O processo de concentração é tão avassalador que poderia virar título de best-seller: “Capital (e política) no século 21”. Porém, não deixa de ser um tipo de eficiência. Mais de menos.
Além de concentradas, essas doações são eficazes. Elegem. Dos 513 novos deputados federais, 360 receberam dinheiro de pelo menos uma – mas, quase sempre, de mais de uma – das 10 maiores empresas doadoras. É 70% da Câmara, um quórum suficiente para aprovar qualquer reforma constitucional que queiram. Ou engavetar as reformas que não queiram, como é mais comum.
O dinheiro para campanha está acima de ideologias, une governistas, oposicionistas e fisiológicos. Como as assessorias dos doadores gostam de dizer, tem para todos os partidos. Embora tentador, seria errado batizar esse processo com alguma palavra terminada em “ão”. Afinal, é quadrienal e está dentro da lei.
Não importa que a lei tenha sido escrita pelos que recebem o dinheiro. Lei é lei. Deve ser cumprida e valer para todos. Tanto é assim que seu cumprimento generalizado criou o fenômeno da multiplicação partidária. Outro recorde que o próximo Congresso bateu é o número de partidos com direito a cadeiras nele: 28. Só a Índia tem um sistema mais prolífico.
Mas dividindo-se pelo número de eleitores, o brasileiro talvez seja o melhor do mundo.
Com tanto dinheiro sobrando nas eleições, quase todo mundo quer um partido para chamar de seu. Basta o dono da sigla eleger um deputado federal para ter uma fatia do Fundo Partidário (jeito de o nosso virar deles), horário garantido na TV para fazer propaganda (ou para alugar) e ainda ser convidado para excretar o que quiser em debates televisivos. Nem maconha irrigada no Colorado (EUA) é mais lucrativa. Ambos são legais.
A perfeição ainda não foi atingida, claro. Com 28 partidos fica ainda mais caro aprovar qualquer coisa importante, e o preço da governabilidade tende a escapar pelo teto da meta. Mas a baixa produtividade não é um problema só de Brasília, certo?
Como o Legislativo não legisla, o Judiciário toma-lhe o lugar. Dá no que deu. Proíbe troca-troca de partido por um deputado só, mas sanciona a orgia partidária. Se for em grupo, podem fundir, fundar, o que for. O Kama Sutra de siglas está liberado.
O eleitor não entende essa liberalidade de costumes. Tanto é que recordes 72% revelaram ao Ibope, pouco antes de votar, que não, eles não têm preferência por nenhum partido político.
Faltou o instituto perguntar se têm raiva de quem tem. É a mais alta taxa de apartidários desde o fim da ditadura. (Por falar em eleição, protesto e ditadura… Não, melhor esquecer.)
O sistema político brasileiro é o mais eficaz, eficiente e lucrativo do mundo. Só quer reformá-lo quem não faz parte dele. Funde o seu partido e aproveite a festa.
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