Robson Bonin – Revista Veja
• As investigações da Polícia Federal revelam que Lula e seu instituto receberam uma fortuna de empreiteiras envolvidas no escândalo de corrupção da Petrobras
Quando deixou a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva criou um instituto com o objetivo de divulgar pelo mundo as políticas sociais desenvolvidas durante os seus dois mandatos. Sua prioridade seria tirar da pobreza as populações carentes da África e da América Latina. Valendo-se de seu prestígio internacional e de seu gosto pelo palanque, Lula queria atravessar o Atlântico para dar palestras a chefes de Estado, sobretudo africanos, interessados em seguir a experiência brasileira de combate à fome e à desigualdade social. Sem fins lucrativos, o Instituto Lula seria movido pelo mais nobre dos propósitos. Na semana passada, documentos em poder das autoridades que investigam o petrolão, o maior esquema de corrupção da história do país, revelaram que essa cruzada do ex-presidente já rendeu frutos generosos — para a conta bancária do próprio Lula. Dados extraídos da contabilidade da Camargo Corrêa, uma das construtoras suspeitas de participar do desfalque de 6 bilhões de reais dos cofres da Petrobras, mostraram que o ex-presidente recebeu 4,5 milhões de reais da empreiteira por palestras e a título de doação a seu instituto.
Em setembro de 2011, Lula viajou a Portugal com o objetivo de levar a empresários uma mensagem de otimismo em relação à crise econômica mundial. Autor da tese da "marolinha" econômica, ele embolsou cerca de 340 000 reais da Camargo Corrêa pela palestra. Em novembro de 2012, Lula partiu para a Africa do Sul e Moçambique. Na versão oficial, trabalharia por "cooperação em políticas públicas e ampliação das relações internacionais". A Camargo Corrêa pagou pela missão 815 000 reais. Extraoficialmente, Lula operou para reduzir resistências dos moçambicanos à atuação da empreiteira naquele país. Quem tinha fome, no caso, era a própria construtora. Já em junho de 2013, Lula viajou a Colômbia, Peru e Equador como parte de um esforço pela união dos países andinos na construção de uma "América Latina mais justa e igualitária". Mais uma vez, a Camargo Corrêa patrocinou a viagem, pagando 375 000 reais ao ex-presidente.
Todos os desembolsos foram realizados em nome da empresa LILS Palestras Eventos e Publicidade, que Lula abriu em sociedade com o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, notório pagador das contas pessoais do ex-presidente. Na semana passada, os integrantes da CPI da Petrobras convocaram Okamotto. Já os investigadores da Operação Lava-Jato querem saber se há vínculo entre os pagamentos recebidos pelo Instituto Lula e o dinheiro roubado dos cofres da Petrobras. Em depoimentos formais às autoridades, dois ex-executivos da Camargo Corrêa já admitiram o pagamento de propina em troca de contratos com a estatal. Em entrevista a VEJA, Okamotto, o braço-direito de Lula, rechaçou essa suspeita (veja a entrevista acima). Nascido numa família pobre, retirante e torneiro mecânico, Lula chegou ao poder depois de empunhar a bandeira da redução da pobreza e da desigualdade social.
Até hoje, apresenta-se como a reedição do pai dos pobres, o Messias que acabou com a fome no Brasil.
É inegável que houve melhora significativa em indicadores sociais, muitos dos quais agora retrocedem devido ao descalabro da economia. É inegável também que o padrão de vida de Lula mudou — para melhor, muito melhor. O ex-presidente só viaja em jatos particulares e exige hotel cinco-estrelas em todas as suas estadas. Para cultivar esses e outros hábitos, recorre a uma rede de amigos poderosos cultivada enquanto comandava a República. Outra empreiteira investigada na Operação Lava-Jato, a OAS reformou um sítio usado por Lula em Atibaia, no interior de São Paulo. Cliente das palestras de Lula e comandada por Léo Pinheiro, amigo do ex-presidente, a OAS também construiu o luxuoso tríplex que a família do ex-presidente tem no Guarujá. De quebra, assumiu a obra de alguns apartamentos que deveriam ter sido construídos por uma cooperativa ligada ao PT, a Bancoop, que deu o cano em seus clientes. O ex-presidente dessa cooperativa e patrono do calote é o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto, preso sob a acusação de coletar propina das empreiteiras investigadas no petrolão. A OAS também é uma das clientes da empresa de Lula. E ainda tem a Odebrecht, a maior empreiteira do país. Na semana passada, o jornal O Globo revelou que o Itamaraty pretende manter em segredo documentos oficiais que podem ligar o ex-presidente à empreiteira. Por quê? Há milhões de hipóteses.
Além das palestras que renderam cerca de 1,5 milhão de reais a Lula, a PF descobriu na contabilidade da Camargo Corrêa três repasses de 1 milhão de reais ao Instituto Lula.
O ex-presidente e a empreiteira alegam que esses 3 milhões de reais seriam "ajuda institucional" da empresa para a entidade. Na contabilidade da Camargo Corrêa, no entanto, pelo menos uma parcela é registrada com um nome diferente — e bem mais sugestivo: "bônus eleitoral". É exatamente o significado disso que as autoridades querem desvendar.
Na quinta-feira, na abertura do 5- Congresso do PT, Lula zombou indiretamente das denúncias de corrupção, lembrando à platéia amiga que o partido venceu as quatro últimas disputas presidenciais. Sob o pretexto de ter sido orientado "a não falar com o fígado", ele não mencionou, no entanto, o petrolão, a prisão de companheiros nem os pagamentos recebidos da Camargo Corrêa. De bobo, Lula não tem nada. Ele sabe que não é hora de provocação desnecessária às autoridades que estão em seu encalço.
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