sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Um duelo de Pindamonhangaba? - César Felício

- Valor Econômico

• Alckmin e Ciro podem polarizar a eleição de 2018

De uma maneira tímida, sujeita a uma série de variáveis, começa a se desenhar um quadro da sucessão em 2018. Os observadores da cena política já se sentem minimamente à vontade para abrir apostas. Nada é certo, mas é provável que Michel Temer termine o mandato, frustrando expectativas reformistas e sem forças para tentar a reeleição. A presidente do STF, Cármen Lúcia, desperta curiosidade, mas permanece fora do tabuleiro. Lula está no tabuleiro, mas com xeque-mate em três lances.

À direita e à esquerda, acredita-se que as torres vão caindo, mas o palpite de que haverá um cenário multipolar, no estilo das eleições presidenciais de 1989, já foi mais forte. Volta-se a trabalhar com um quadro de polarização, de vermelhos contra azuis.

Mantidas as condições atuais de temperatura e pressão, em que se supõe que Temer sobreviva enfraquecido para 2018 e que Lula pereça na lei da ficha limpa, a sucessão hoje parece passar por Pindamonhangaba, terra natal do tucano Geraldo Alckmin e do neopedetista Ciro Gomes.

Alckmin e Ciro somam pontos não exatamente por suas virtudes, mas porque o oxigênio de seus rivais em um e outro campo vai se tornando rarefeito. Paradoxalmente, é o relativo isolamento de ambos, o hábito de correr em faixa própria, conjugado ao fato de que nunca abriram mão de pertencerem a estruturas partidárias estabelecidas, que os preserva até certo ponto.

O governador paulista é o único presidenciável tucano que tem uma máquina administrativa nas mãos e que pode se dar ao luxo de demarcar distância de Temer, quando lhe convém. Ciro consegue se assemelhar a um "outsider" mesmo tendo 200 anos de política nas veias e estar no mercado eleitoral desde 1982. Concorre pela esquerda, mas sua biografia o permitiria da mesma forma concorrer pela direita. Esteve em todas as partes, está em nenhuma.

Tanto em um como em outro caso, quem se arrisca a prever essa possível polarização parte também do pressuposto que ambos serão pouco atingidos pelo noticiário jurídico-policial. Até março esta hipótese também poderá ser testada. Alckmin conta com este trunfo para resolver um problema: o governador cresce no imaginário de partidos aliados do PSDB como presidenciável, mas está em minoria dentro do próprio partido. A sigla deve discutir a renovação de sua direção em abril. É provável uma negociação entre Aécio e Alckmin, em que se comece a desenhar o quadro da disputa interna de 2018. Alckmin tem a opção de trocar de partido, Aécio não. Tudo deve ficar mais nítido de março em diante.

Para antigos aliados seus tanto no meio político quanto no econômico, Marina Silva, dona de 20% do eleitorado de 2010 e 2014, está em declínio. Duvida-se até mesmo de uma terceira candidatura. A ex-senadora estabeleceu poucas pontes na esquerda, que forneceu os quadros que compõem o diminuto Rede, e se afastou dos segmentos empresariais que a sustentaram nas duas últimas eleições. Marina preserva seu "recall", como mostram as pesquisas, mas diminuiu a sua capacidade de estabelecer alianças.

Há um enorme ceticismo também sobre a possibilidade do bom momento da extrema-direita nas redes sociais reverter no fortalecimento de uma candidatura presidencial de Jair Bolsonaro. O deputado fluminense caminha para perder o apoio do PSC para sua pretensão, sem que tenha assentado bases em outra sigla. O precedente histórico, contudo, favorece o parlamentar. Candidato por uma sigla inexpressiva, sem alianças e tendo como capital apenas sua imagem folclórica, Enéas chegou a 7% dos votos válidos.

Março decisivo
Mais uma vez, pelo quarto ano consecutivo, o Brasil deverá ter um março decisivo. Foi nos idos de março de 2014 que teve início a Operação Lava-Jato, no ano seguinte Teori Zavascki e Rodrigo Janot colocaram o presidente da Câmara e do Senado na linha de tiro. Este ano o terceiro mês do calendário começou com a condução coercitiva de Lula e terminou com os caciques do PMDB preparando o impeachment para "estancar a sangria", objetivo parcialmente alcançado, como mostrou o desenrolar dos acontecimentos.

Para 2017, devem convergir para o mês fatídico as principais consequências das revelações da Operação Lava-Jato, posto que a homologação da megadelação da Odebrecht no Supremo deve demorar. Também devem ficar claras as chances de aprovação de uma reforma previdenciária consistente. As expectativas em relação a uma reforma profunda diminuem tanto no mercado quanto no meio político.

Lava-Jato e o destino da Previdência são itens fundamentais para saber se a melhora dos indicadores econômicos, que deve se desenhar no fim do primeiro trimestre do próximo ano, será consistente.

Outros focos de crise podem se catalisar no começo do ano, como o processo de cassação da chapa presidencial de 2014 no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O rio de incertezas, em suma, ainda é caudaloso.

Em resumo, somente dentro de quatro meses será possível medir a extensão do dano sobre o governo Temer, quando começar a ser feita a colheita da semeadura desta terrível primavera. O refresco na economia, se existir, não parece ser capaz de dirigir a crise política, como foi possível em 2005 por ocasião do mensalão.

Março também será o mês em que Renan Calheiros estará na planície e que a Câmara será comandada pelo centrão, PSDB ou Rodrigo Maia. Nenhuma combinação de resultados empodera a oposição, mas caso a balança penda para Jovair Arantes ou Rogério Rosso a casa legislativa estará sujeita a um comando de baixa densidade partidária, com grande peso do que outrora se chamava "baixo clero". A experiência com Waldir Maranhão e a discreta, mas efetiva, articulação do Planalto para eleger o parlamentar do DEM mostram que no Planalto se avalia que deixar a Câmara sob comando do centrão é encarada como um mau negócio.

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