- Globo
As assinaturas do acordo de delação premiada e do acordo de leniência da Odebrecht acabaram acontecendo quando está em curso a mais forte reação dos políticos aos processos de investigação da corrupção no país.
Não é mera coincidência. Vários deles estão se sentindo ameaçados exatamente pelas revelações que os 77 executivos poderão fazer sobre os financiamentos eleitorais.
Quem tem alguma dúvida sobre a importância da Lava-Jato para o país deve conversar com diretores da Petrobras. Foi o que fiz ontem, em programa na Globonews. O diretor financeiro, Ivan Monteiro, disse que a Lava-Jato foi fundamental para a companhia porque ela tem instrumentos que a empresa não dispõe.
— A Petrobras não tem os instrumentos de investigação que a Justiça e o Ministério Público possuem, por isso jamais chegaria aonde a operação chegou. É importante que todos os valores subtraídos sejam devolvidos à companhia — diz Monteiro.
A Petrobras é assistente de acusação, e por isso está ao lado do Ministério Público interrogando os investigados e réus. Essa decisão tomada no ano passado foi fundamental, segundo o diretor financeiro, para a reputação da Petrobras junto aos órgãos de controle, o mercado, a própria Lava-Jato.
— Isso demonstra a nossa atitude. A Petrobras é vítima de um caso absurdo em que foram subtraídos valores indevidamente da companhia. É difícil saber quanto foi subtraído. Com esses instrumentos que a Lava-Jato possui, a gente identifica e pode, junto com os procuradores, cobrar dessas pessoas a devolução do que foi desviado. Até agora, recebemos R$ 660 milhões. Estar lá, ao lado do MP, demonstra a atitude da Petrobras de colaborar com as autoridades. E mesmo se todos os valores em dinheiro voltarem, há ainda o prejuízo de imagem que a companhia teve — disse o diretor financeiro.
O diretor de estratégia, Nelson Silva, acha que a Lava-Jato ajudou a Petrobras também em mudanças internas de gestão.
— Houve, a partir da Lava-Jato, o fortalecimento dos sistemas de controle. Aconteceu uma melhora bastante significativa na governança. Criamos um canal independente de denúncia. Foi estabelecido um sistema de decisões compartilhadas de investimento em que cada etapa do processo passa por um comitê e nenhum investimento depende de uma pessoa só. As grandes decisões vão aos conselhos.
A Lava-Jato está ajudando a recuperar valores para a maior empresa do país, propiciou modernização de gestão, uso de novos métodos de controle, e está permitindo a recuperação da reputação da companhia. Se fizesse só isso, já teria feito muito pelo país.
A Odebrecht vai pagar a maior indenização já paga por uma empresa, e começa, a partir de agora, a viver um outro momento, o pós-Lava-Jato. “É uma página virada”, disse um integrante da empresa. As vantagens para o país dessas mudanças estruturais na Odebrecht, e dos novos compromissos que a construtora assume a partir de hoje, são imensas.
Mesmo com todos esses benefícios, a Lava-Jato enfrenta o mais duro ataque dos políticos. Ninguém admite estar atacando a operação, mas é ela que está sob risco quando se ameaça procuradores.
Não era de se esperar que o pacote das dez medidas anticorrupção fosse aprovado na íntegra. Evidentemente, haveria mudanças, supressões e inclusões. O Congresso foi eleito com esse poder. O problema é que, das dez, oito foram rejeitadas, e o que foi incluído é exatamente o oposto da intenção do projeto.
O ministro Gilmar Mendes disse que a “Câmara mandou bem”. Infelizmente, a Câmara mandou às favas os escrúpulos ao votar medidas tão claramente opostas ao que se queria quando o projeto foi enviado. Entre o que foi derrubado, está, por exemplo, a medida que torna crime o enriquecimento ilícito de agente público.
Então o que querem os deputados? Que não seja crime? Os deputados aprovaram no projeto medidas que intimidam juízes e procuradores. Claramente. Em um dos absurdos está o de punir com prisão juiz ou procurador que “expressar por qualquer meio de comunicação juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças judiciais”.
O país terá que escolher entre as conquistas do combate à corrupção ou esta lei com que deputados tentam intimidar seus investigadores e julgadores.
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