- Valor Econômico
• Meirelles não é Joaquim Levy e Temer não é Dilma
Há uma pergunta crucial, ainda sem resposta, sobre se a recuperação da economia não virá ou foi apenas adiada. Essa é uma questão que aflige o governo de Michel Temer e sua base aliada. Mais do que isso, a decepção com o prolongamento da recessão fermenta um discurso político cujo risco é o de desencadear um processo de "fritura" do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
Está fresco na memória de todos o que ocorreu no ano passado com o então ministro Joaquim Levy, que no meio do ano se viu sem apoio no governo Dilma Rousseff, no Congresso e falando sozinho. Os argumentos começam a surgir.
Tal como Levy, Meirelles já está sob a crítica de só falar em ajuste, ajuste e ajuste, e de não tratar do crescimento de uma economia que definha. E que hoje está pior do que estava no ano passado, até porque a crise que começou em 2014, quando surgiram os primeiros sinais da recessão, ainda não bateu no fundo do poço.
Meirelles não é Levy e nem Temer é Dilma. Há diferenças colossais na comparação, mas o risco é semelhante. Levy entrou no governo celebrado pelos mercados, mas, sem o apoio do PT e mesmo de Dilma, foi temporariamente adotado pelo PMDB e por alguns do PSDB até ficar só em um ambiente totalmente hostil a ele e ao governo.
Meirelles montou uma equipe de competentes economistas, aplaudida pelo setor privado, e está avançando na estratégia de reforma fiscal concebida. Mas não trouxe o fim da recessão, mesmo porque a crise deixada pelo governo anterior era pior do que se supunha.
Até o momento, contudo, apesar de resmungos daqui e dali de aliados, Meirelles tem sido vitorioso no Congresso. A PEC do teto do gasto foi aprovada duas vezes na Câmara e uma no Senado com maioria expressiva de votos, confirmando a ampla base de apoio do governo Temer. Na próxima semana o presidente deverá enviar a reforma da Previdência para o Congresso.
Passados seis meses da troca de governo, no entanto, a atividade econômica continua em queda, a receita tributária encolhe e o desemprego cresce. Houve melhora da confiança, que não se traduziu em recuperação do crescimento. Ao contrário, a recessão seguirá no quarto trimestre e a taxa de investimento despenca.
Os prognósticos para o PIB em 2017 caem e já não há uma certeza inequívoca de que haverá uma reação da atividade. Sem expectativa de crescimento econômico, o conserto das finanças públicas vira miragem.
Os aliados do governo no PSDB, PPS e DEM não escondem a frustração e buscam culpados pela escassez de resultados. Responsabiliza-se o Banco Central por estar atrasando o corte da taxa de juros, cujo patamar está na raiz da recessão.
Em entrevista domingo, às vésperas da reunião do Copom que reduziu a Selic em 25 pontos-base, para 13,75%, o presidente Temer falou sobre o tema: "Tenho tido conversas em busca de eventual redução dos juros no país". Após um jantar na segunda feira com Temer e Aécio Neves (PSDB-MG), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) também declarou: "O empresariado está desesperado. Temos que ter uma política que baixe os juros".
Defende-se que o governo retome o gasto público - como se houvesse dinheiro para isso que não seja o aumento do endividamento, já elevado. "O ajuste fiscal é um dever, não há dúvida. Mas é preciso adotar medidas que ajudem a tirar o país da atual crise", completou Renan, defendendo também maior presença do PSDB no governo.
Do PSDB vêm propostas variadas, como criar um fundo que forneça garantias para que as incorporadoras possam investir pesado na construção de habitações para a baixa renda e gerar empregos.
Velhas ideias ressurgem, como a liberação de compulsórios dos bancos no Banco Central, para estimular a expansão do crédito. Medida descartada pelo BC pois os bancos têm dinheiro de sobra para emprestar. A contração do crédito não decorre da escassez de recursos, mas da aversão a riscos.
Há uma alternativa em questão, feita por Arminio Fraga, que se refere à mudança do "mix" da política econômica, com um esforço fiscal de curto prazo (a PEC do gasto promete o ajuste para 2019 em diante) centrado no corte de despesas e, se for preciso, algum aumento de impostos, para que o BC possa acelerar a redução dos juros. A política fiscal continua expansionista, deixando nas mãos da política monetária o controle da inflação. A redução mais rápida da taxa Selic faria toda a diferença no nivel de atividade, principalmente agora, quando empresas e consumidores estão atolados em dívidas.
No centro de toda a discussão, e dominando a cena, está uma gigantesca crise política e o Congresso, no desespero para salvar suas principais lideranças envolvidas nas investigações da Lava-Jato, mete os pés pelas mãos.
A mais recente trombada foi a confrontação com o Judiciário e com o Ministério Público, na votação das medidas anticorrupção que varou a madrugada de terça para quarta-feira e desfigurou a proposta. O que não significa que não seja necessário algum limite para ação do Ministério Público, mas o momento e a forma foram totalmente inadequados.
As ruas mostram que não aceitam contemporização com a corrupção. Temer teve que se posicionar no domingo contra a anistia à prática do caixa 2, engendrada pelo Congresso, para não perder a tênue ponte que tem com a opinião pública.
A base aliada de Temer se divide em duas pontas, uma que quer que o governo gaste mais para animar a economia; e outra que advoga o aprofundamento do ajuste fiscal para que a redução dos juros pelo Banco Central possa estimular a atividade econômica.
Temer está disposto a perseverar no ajuste, até porque sabe que aumentar o gasto público via endividamento será o caminho mais rápido para escangalhar de vez o que já está ruim. O que não está claro é se o presidente está disposto a dobrar a aposta no ajuste, reforçando medidas de curto prazo pelo lado do gasto.
Ao contrário de Levy, que não tinha o apoio de Dilma e do PT e viu subtraído o pouco que tinha do PMDB, Meirelles tem o suporte de Temer. Resta saber se o presidente continuará tendo apoio da base aliada para perseverar, se os resultados não aparecerem logo.
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