A disposição do governo de negociar com o Congresso alterações em sua proposta de reforma da Previdência não pode ser vista, de maneira nenhuma, como recuo. O presidente Michel Temer, como ex-parlamentar experiente que é, deve saber que quase nada do que chega ao Congresso é aprovado tal como foi enviado, especialmente quando o projeto em questão trata de tema tão sensível e com tantas implicações como a Previdência.
É claro que, para o bem do País, Temer deve delimitar claramente os pontos sobre os quais não cabe discussão. Sempre que falam da proposta de reforma, o presidente e seus auxiliares manifestam, por exemplo, que o estabelecimento de idade mínima para a aposentadoria é inegociável. Para o governo e a maioria dos especialistas, uma reforma da Previdência sem esse limite, necessário diante de um cenário de envelhecimento da população e de aumento da expectativa de vida dos brasileiros idosos, terá pouca serventia para reverter o rombo nas contas públicas e tornar sustentável o sistema previdenciário.
Mesmo alguns dos políticos que hoje se opõem ferozmente à reforma da Previdência defenderam no passado, quando estavam no governo, a necessidade de impor essa idade mínima para a aposentadoria. É o caso dos ex-presidentes petistas Lula da Silva e Dilma Rousseff. “Eu acho que tem trabalhador que poderia trabalhar um pouco mais”, disse Lula em 2007. Agora na oposição, Lula disse que Temer quer “enfiar goela abaixo do povo uma reforma que vai impedir a aposentadoria de milhões”.
Com o PT, portanto, não há o que negociar, porque a intenção do partido de Lula nunca foi a de colaborar democraticamente com as demais forças políticas do País, em especial em momentos críticos. Ademais, as propostas do PT para a Previdência são típicas de sua habitual impostura – em um folheto, o partido diz que, para recuperar o sistema previdenciário, basta “criar novos empregos”, “fazer a roda da economia girar” e estabelecer um “salário mínimo maior”. Simples assim.
No mundo real, porém, o ilusionismo petista não funciona. A Previdência representa hoje quase metade dos gastos primários do governo federal, e o cenário futuro é catastrófico para as já depauperadas contas públicas arruinadas pela desastrosa administração do PT. Não se trata, portanto, de um assunto que possa ser tratado com a leviandade típica dos palanqueiros petistas.
Todos aqueles que hoje têm pretensões presidenciais deveriam apoiar uma reforma ampla e profunda da Previdência, ainda que corram o risco de perder votos. Se a reforma não for feita agora, terá de ser realizada assim que o próximo presidente assumir, seja ele quem for. Números do Ministério da Fazenda mostram que, se a proposta do governo não for aprovada, a Previdência consumirá 79% do Orçamento em 2026, deixando quase nada para todas as demais despesas, inclusive na área social. Mesmo que o projeto do governo seja aprovado, as aposentadorias representarão nada menos que 66,7% do Orçamento.
Aparentemente, os deputados ainda não se conscientizaram da gravidade do problema e grande parte deles manifesta oposição à proposta de reforma, conforme atestou o “Placar da Previdência”, elaborado pelo Estado. Ao tomar conhecimento dessa conjuntura, o presidente Temer dispôs-se a “flexibilizar” o projeto, encampando algumas das reivindicações dos parlamentares. Com razão, Temer disse que não se pode ver nisso nenhum recuo, a despeito de eventuais perdas. “Vamos aprender isso. Prestar obediência ao que o Congresso Nacional sugere, o Congresso Nacional que é o centro das aspirações populares, não pode se considerado recuo”, declarou o presidente.
A negociação apenas começou. A disposição de Temer de ouvir o Congresso nada mais é do que respeito ao jogo democrático. Mas é preciso deixar claro para todos os cidadãos e para seus representantes políticos que não é possível mais lidar com a Previdência com a ligeireza demonstrada pelos governos anteriores, que promoveram apenas remendos no sistema. Está na hora de ir além, e os parlamentares precisam ser advertidos de que uma eventual derrota na votação da reforma não será uma derrota do governo, mas sim do País.
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