- O Globo
Está claro que o sistema de poder, e todas as instituições dessa República, estão nus
‘A resposta é a infelicidade da pergunta” ( André Green ), não custa repetir. Comecemos, então, deixando bem claro de que pergunta, de que nó, estamos falando.
Em 2013, ainda antes da crise econômica manifestar seus efeitos, o povo nas ruas entoava uma miríade incongruente de reivindicações. Mas havia algo em comum no coração de todos, coxinhas ou black blocs: o berro de que “O rei está nu”.
O papo furado de que seriamos uma nação desenvolvida em 20 anos ( lembram ? ), a presidente da República dando aula de economia para os lideres dos maiores países do mundo, o lero lero de que estava tudo ótimo ruiu com estrondo.
Eleições de 2014 realizadas como foram e estelionato eleitoral evidenciado imediatamente após os resultados, pela inevitável reversão completa da política econômica ( infelizmente, apenas no discurso do governo anterior ), significaram para a população “ruptura de contrato”, ou , em linguagem popular, trairagem. A popularidade do governo foi para debaixo do pré-sal.
2015 e 2016 derrubaram os muros que restavam. De um lado a maior crise econômica da história, de outro, uma divida pública com trajetória insolvente (portanto, calote ou inflação no futuro relativamente próximo) e, finalmente, a LavaJato expondo as vísceras do nosso sistema de poder e do capitalismo de estado estilo brasileiro.
Impeachment e “Fora Temer” dividiram o Brasil. Uma pena. Em nome de interesses partidários, corporativos, ou pessoais, a polarização ocorre em torno de bandeiras anacrônicas, às vezes espantosamente irracionais, falsas perguntas que não levam a lugar algum.
Pôr a casa em ordem, estabilização da trajetória da dívida, realidade orçamentária, reforma da Previdência são apenas o óbvio aritmético ( e não garantem crescimento algum no futuro, apenas evitam o desastre ). Para deleite dos historiadores do futuro, no Brasil, nos anos de vacas gordas, a fábula de La Fontaine adquiriu macunaímica mudança : não apenas a cigarra cantou o verão inteiro como convenceu as formigas a caírem na festa.
O que está claro agora para todos, não apenas para os analistas e leitores intelectualizados, é que o sistema de poder, e com ele todas as instituições dessa República, estão nus. O barão, o marquês, o conde e o visconde estão nus.
A legitimidade do sistema acabou, a República de 1988 morreu. Não tem ressurreição. Quanto mais os donos do poder tentam preservar o que for possível de suas peles, mais contundente esse grito ecoa no coração do povo, não de uma forma politizada, mas, e essa é a questão, de uma forma incontornável e irrecuperável.
Estamos em uma encruzilhada civilizatória porque, meus poucos e queridos leitores, se os de cima “podem” e isso não é mais segredo, então todos “podem”, cada um do jeito que der. E o povo, cada um com seu pensamento, sabe disso muito bem.
O que fazer ? Acabou o espaço. Mês que vem a conversa continua...
*Sérgio Besserman Vianna é presidente do Instituto Jardim Botânico do Rio
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