Marina Dias, Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Às vésperas do dia em que pela primeira vez a Câmara vai analisar uma denúncia contra um presidente da República, Michel Temer teve raro rompante raivoso.
Diante de poucos aliados –em meio à exaustiva contagem de votos para a sessão marcada para quarta (2)– fez desabafo acalorado ao falar da delação que o alçou à condição de denunciado: "Essa gente é canalhada", disse, segundo pessoas próximas.
Referia-se aos irmãos Joesley e Wesley Batista, cuja colaboração premiada fez com que o procurador-geral, Rodrigo Janot, apresentasse contra ele a inédita denúncia por corrupção passiva.
Amigos garantem que é somente quando trata dos empresários ou de Janot que o presidente perde a calma que lhe é habitual.
De resto, afirmam, tem trabalhado para garantir pelo menos 250 dos 513 votos em plenário para impedir que a denúncia contra ele chegue ao Supremo.
O discurso de Temer, considerado otimista demais até por assessores próximos, é de que, se alcançar esse número, seu governo ganha força para votar a reforma da Previdência até o fim de agosto.
O presidente não quer prolongar a votação. Disse a aliados acreditar que Janot já tem pronta a segunda denúncia contra ele –desta vez, por obstrução de Justiça–, o que geraria ainda mais desgaste à sua imagem.
Além disso, sabe que as delações do ex-deputado Eduardo Cunha e de seu operador, Lúcio Funaro, prestes a serem fechadas pelos procuradores, têm potencial explosivo no Planalto.
A vitória de Temer na votação da primeira denúncia é dada como certa pelo governo –e pela oposição–, mas o desdobramento da conta em relação à reforma leva em consideração outros fatores.
Virada essa página, o presidente vai mirar os deputados que se posicionarem contra ele na denúncia, mas possivelmente apoiariam a reforma. É o caso de metade do PSDB (46 deputados) e de deputados considerados "avulsos" em partidos da base.
A conta é apertada porque Temer precisa de pelo menos 308 votos para aprovar a reforma da Previdência e sabe que esse é um fator determinante para que o mercado continue apoiando seu governo.
CORPO A CORPO
Esse discurso é combinado com o apelo ao espírito de corpo da Câmara. Desde que foi denunciado, o presidente tem dito reservadamente que a ação da PGR é direcionada a acabar com a classe política.
Nos três dias que antecedem a votação da denúncia, Temer vai manter as conversas com deputados.
Uma reunião com ministros e líderes da base deve ocorrer neste domingo (30) com o objetivo de dar ao presidente um mapa de votos, mas auxiliares admitem que só na quarta será possível ter o número mais realista.
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