Condução coercitiva de fato dava margem a abusos, mas eliminá-la pode ter efeitos colaterais
O Supremo Tribunal Federal decidiu na quinta (14) que a condução coercitiva para interrogatório de réu ou investigado, prevista no artigo 260 do Código de Processo Penal, não encontra abrigo na Constituição por ferir o direito de a pessoa ficar em silêncio e não produzir provas contra ela mesma.
Em votação apertada, de 6 votos a 5, a corte julgou duas ações, ajuizadas pelo PT e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que viam no instituto um desrespeito a preceitos constitucionais.
A condução coercitiva ganhou mais notoriedade e se tornou alvo de controvérsias em março de 2016, quando o juiz Sergio Moro, da Lava Jato, lançou mão do recurso ao convocar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a depor.
À época, juristas, advogados, constitucionalistas e até mesmo um ministro do Supremo, Marco Aurélio Mello, que deveria evitar pronunciamentos dessa ordem, criticaram a decisão, uma vez que o petista não teria se recusado a prestar esclarecimentos.
“Eu não compreendi. Só se conduz coercitivamente, ou, como se dizia antigamente, debaixo de vara, o cidadão que resiste e não comparece para depor”, disse então Mello, que agora votou pela inconstitucionalidade da medida.
Note-se que a posição assumida pelo STF impede o uso da coerção até mesmo nos casos extremados em que parecia justificável na opinião do ministro —e de respeitáveis estudiosos do direito.
Além do episódio envolvendo Lula, não há dúvida de que houve outros abusos na determinação de medidas do gênero, em meio à espetacularização de ações policiais.
Foi o que ocorreu, por exemplo, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em dezembro de 2017, quando funcionários da instituição, entre os quais o reitor e seu vice, foram levados à força para depor sem que tivessem recebido intimação prévia.
Tais exageros precisariam de fato ser coibidos. Entretanto a abolição das conduções coercitivas em toda e qualquer situação deixa uma lacuna que corre o risco de ser preenchida por outras providências discutíveis.
Um efeito colateral danoso, aventado por agentes da Lava Jato, é o possível aumento das prisões temporárias, recurso que também tem sido objeto de contestações por parecer ser utilizado de forma abusiva em algumas circunstâncias.
Como argumentou o ministro Edson Fachin, do Supremo, a condução coercitiva deveria ser considerada constitucional e legítima sempre que usada em substituição a uma medida cautelar mais dura, como a prisão temporária.
Foi voto vencido, contudo —e a corte, dividida, de novo intervém de forma duvidosa na legislação.
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