Interferência de filho do presidente na demissão de ministro coloca sob risco negociações do governo
A demissão do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, sob pressão de Carlos, ou “02”, filho do presidente Jair Bolsonaro, envenena o início do governo do pai com incertezas. E pior, dissemina insegurança nos escalões elevados da administração, colocando sob risco a confiabilidade de entendimentos políticos feitos pelo governo. Por exemplo, em torno da reforma da Previdência.
Criou-se o precedente de que intrigas florentinas semeadas na família presidencial podem traçar o destino de autoridades. É catastrófico para qualquer administração, pública ou privada, quando fatores externos, ainda mais devidos à consanguinidade, interferem no trabalho. Poucos exemplos são tão antirrepublicanos como a atuação de “02” neste caso. Que sequer chegou a surpreender, dadas as demonstrações de agressividade e arroubos, não só dele, exibidas em redes sociais durante a campanha.
Carlos também é chamado pelo pai de o “pit-bull” da família, como se isso fosse um predicado. Não é, pois qualquer presidente da República tem parcela ponderável de seu êxito no Planalto na dependência de sua capacidade, e do seu grupo, de negociar com o Congresso. Espaço em que não há lugar para agressões.
O ensaio que fizeram na campanha indicou que os filhos de Bolsonaro — Flávio, Carlos e Eduardo — poderiam ser um dos maiores problemas para o governo do pai. Respectivamente, senador pelo Rio, vereador carioca e deputado federal por São Paulo, os três têm seu espaço institucional de atuação política. Temia-se, porém, que poderiam atingir o presidente ao serem acusados de algo. Ou usarem os laços familiares para interferir no Planalto.
Flávio carrega a história de Fabrício Queiroz, seu braço direito na Alerj, que recolheria parte dos salários de outros assessores do ainda deputado estadual.
A prática é vergonhosamente usual no Legislativo. Há ainda algumas transações imobiliárias de Flávio também sob investigação.
E Carlos deu um passo à frente, para se valer do acesso privilegiado ao presidente da República e divulgar um diálogo telefônico entre Bolsonaro e Bebianno, para provar que os dois não conversaram sobre o destino do ministro no governo. Há até a possibilidade de o pai ter se valido do filho para afastar o ministro como “mentiroso”.
Não há dúvida de que 01, 02 e 03 deveriam cumprir com afinco os mandatos que o povo lhes deu. Não só para honrar os votos recebidos, mas também por ser a melhor maneira de ajudarem o pai.
A expectativa é que Jair Bolsonaro, a partir da experiência desastrosa de permitir a invasão de seu espaço de poder por filhos, aprenda, também com a ajuda do núcleo militar do governo, a assumir e gerenciar sua condição de presidente da República.
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