Privatização
sempre foi tema carregado de polêmica no Brasil e há pelo menos três grupos que
se manifestam contra qualquer processo nessa linha
O
presidente Jair Bolsonaro recorreu a um efeito especial para
encaminhar o projeto de privatização dos Correios .
De braço dado com o ministro das Comunicações, Fábio Faria, encabeçou
na noite de quarta-feira um cortejo pela Praça dos Três Poderes até o
Congresso, onde
apresentou pessoalmente à Câmara dos Deputados seu projeto de lei.
Não
que o projeto de privatização dos Correios não merecesse especial atenção. É
que outros anteprojetos, de muito maior importância política e macroeconômica,
como os da reforma da Previdência e
o da reforma
tributária, não tiveram o mesmo aparato. Bolsonaro recorreu a essa
circunstância para tentar compensar a lambança que fez na última sexta-feira
por conta do anúncio tumultuado da troca do presidente da Petrobrás.
Privatização sempre foi tema carregado de polêmica no Brasil. Há pelo menos três grupos que se manifestam contra qualquer processo nessa linha. O grupo ideológico, por exemplo, entende que, nos casos de produtos ou serviços estratégicos, é melhor confiá-los a empresas estatais para que não sejam contaminados por capitais privados que, em matérias essenciais, podem trabalhar contra o interesse público.
Outro
grupo quase sempre contrário à privatização de empresas estatais é o das corporações.
Em geral são sindicatos ou associações de funcionários de
empresas públicas que não querem correr o risco de perder privilégios a
partir do momento em que a empresa passasse a ser dirigida majoritariamente por
capitais privados.
E
há os políticos fisiológicos que sempre tiveram nas estatais um campo
enorme para garantir cargos e boa remuneração ou para si próprios ou para seus
protegidos e cabos eleitorais.
A
favor da privatização não estão apenas os liberais para quem a
administração privada é sempre mais eficiente do que a administração pública,
especialmente quando, livre dos monopólios, é submetida à concorrência de
mercado. Estão também os pragmáticos – aqueles que optam pela
privatização porque não há outra saída.
Um
dos argumentos recorrentes da vertente contrária à privatização é a de que o
governo está vendendo as joias da família, adquiridas com tanto esforço e tanta
história, para torrar em despesas correntes. É verdade que dos R$ 50 bilhões
que o governo espera movimentar com a privatização da Eletrobrás, R$ 25 bilhões
irão para o Tesouro, que pode usar os recursos tanto para redução da
dívida pública quanto para a cobertura das despesas fiscais. Mas as reais
necessidades do interesse público são outras.
No
caso do Brasil, o fator escasso não é competência gerencial, mas capital
propriamente dito. Quase todas as estatais do Brasil necessitam
urgentemente de injeção de recursos, não só para manutenção da máquina, que
muitas vezes se encontra sucateada, mas para expansão da empresa. E, no
entanto, na condição de laranja espremida, o Tesouro, o acionista majoritário,
não está em condições de subscrever sua parte no aumento de capital.
Os
Correios, por exemplo, estão há anos na pindaíba. A grande expansão dos
serviços de delivery, num momento em que, por conta da pandemia, tantas
empresas tiveram de operar em regime de home office, seria excelente
oportunidade para ampliação do mercado de entregas de correspondência e de
volumes. No entanto, inchados e atrofiados, os Correios não conseguem nem
sequer cumprir prazos de entrega nos serviços de Sedex.
As necessidades
de capital para investimentos inadiáveis da Eletrobrás, maior empresa de
energia da América Latina, são de R$ 17 bilhões. No entanto, ela não consegue
mais do que R$ 3,7 bilhões. Uma vez privatizada, os acionistas que assumirem
seu controle já sabem que terão de fazer robustas transfusões de recursos para
que ela possa se desenvolver e tocar os projetos de geração, transmissão e
distribuição de energia elétrica.
Num
mercado que se caracteriza pela forte mortalidade de empresas produtoras de
aeronaves, se não tivesse sido privatizada, em 1994, a Embraer provavelmente
teria tido o mesmo destino da Engesa, que já foi o orgulho da engenharia
nacional na fabricação de blindados, mas morreu de colapso de capital na década
de 1980. E, no entanto, a Embraer hoje é empresa líder em seu nicho de mercado.
Enfim, a privatização hoje não é uma opção ideológica, mas de sobrevivência de grande número de estatais.
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