Quem
imagina que a pressão internacional pela adoção de políticas mais firmes no
combate ao desmatamento, a demissão do superintendente da Polícia Federal no
Amazonas ou os sucessivos indicadores de aumento dos desmates e das queimadas
colocam em risco imediato a permanência de Ricardo Salles no governo deve
atentar para uma diferença importante: Salles não tem nada a ver com Abraham
Weintraub ou Ernesto Araújo.
A
começar pela origem. Salles não é um fanatizado seguidor de Olavo de Carvalho,
nem mesmo um cultor da imagem de Jair Bolsonaro como um “mito”. A associação
entre ambos é uma conveniência de agenda, pragmática para ambos os lados.
O
ministro não era o preferido do presidente eleito na transição. As primeiras
reuniões entre eles foram cercadas de desconfiança, pelo fato de Salles ter
integrado o governo de Geraldo Alckmin.
O paulista ganhou o posto ao se comprometer a implementar à risca a agenda de Bolsonaro, que logo nas primeiras conversas reclamou do excesso de fiscalização e de multas aplicadas por órgãos como o Ibama a madeireiros e produtores rurais. Disse que seu ministro teria a incumbência de acabar com a “indústria da multa” e enfraquecer o papel das ONGs, inclusive suas conexões no Inpe, no Ibama e no ICMBio.
Este
é um ponto fulcral: diferentemente de Araújo e Weintraub, cujo comportamento
caricato e cuja mente persecutória não permitiam que cumprissem nenhum planejamento
de desmonte de seus órgãos sem que isso naufragasse como um plano infalível do
Cebolinha, Salles sabe planejar e executar a agenda de Bolsonaro. Tem feito
isso com extrema eficácia ao longo de dois anos e três meses.
O
que ele propugnou na famosa reunião ministerial de 22 de abril do ano passado,
aproveitar a pandemia para “passar a boiada” do desmonte da estrutura de
fiscalização e a legislação ambiental, inclusive do arcabouço legal, está sendo
implementado à risca. Basta pegar a lista de normas revogadas nos últimos
meses, inclusive as concernentes à concessão de licença ambiental.
Salles
não se furta a defender a agenda de Bolsonaro em entrevistas, reuniões com
outros países e fóruns internacionais. Faz isso sem alterar a voz ou a
fisionomia, supostamente esgrimindo dados, que distorce sem nem corar. Aperta
os botões certos para demitir ou mandar afastar quem cruza seu caminho, como
acaba de acontecer com o superintendente da Polícia Federal no Amazonas,
Alexandre Saraiva — algo “já planejado”, segundo os envolvidos.
A
queda de Salles dependeria de alguns fatores combinados. Primeiro, uma
evidência que o ligasse à defesa dos interesses de empresas privadas que agem
ilegalmente nos ramos de madeira, extração mineral ou agropecuária, como acusou
Alexandre Saraiva na notícia-crime que enviou ao Supremo Tribunal Federal.
Portanto,
se o STF abrir mais um inquérito para investigar um ministro de Bolsonaro, e
exigir, como Alexandre de Moraes garantiu no caso das denúncias de Sergio Moro,
um delegado da PF destacado para isso que não possa ser removido pelo
diretor-geral Paulo Maiurino, a situação do titular do Meio Ambiente poderia se
complicar.
O
segundo fator que pode atrapalhar a permanência do extremamente eficiente (para
Bolsonaro) Ricardo Salles é uma sanção mais concreta da União Europeia, da
China ou dos Estados Unidos às exportações brasileiras pela nossa trágica
gestão ambiental.
Isso
faria com que o prejuízo pela manutenção do ministro se fizesse sentir no bolso
daqueles que apoiam Bolsonaro: o agronegócio, o setor da mineração e os
madeireiros. O presidente já perdeu sustentação em segmentos importantes, como
o mercado financeiro e o empresariado industrial, em razão do desastre na
resposta à pandemia e da economia que não decola. Se sentir que a própria
cabeça estará na guilhotina, não se furtará a colocar a de seu dileto ministro
no lugar.
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