Valor Econômico
PSL e DEM estudam fusão para poderem
sobreviver
O PSL e o DEM caminham para a fusão entre
as duas siglas. Não as unirá o amor, mas sim o espanto, como no verso de Jorge
Luis Borges Trata-se da primeira consequência de grande porte da reforma
política de 2017, ora sob ameaça no Senado.
A reforma de 2017 acabou com a coligação
proporcional e reforçou a cláusula de barreira. Isso perturba a vida de vários
partidos que viviam no ecossistema das grandes frentes. Os mais ameaçados são
os que têm existência sobretudo parlamentar. Aqueles que só percebemos que
existem acompanhando o noticiário da Câmara e do Senado.
Cada um apostou em uma estratégia para
contornar o problema. Diversas siglas patrocinaram uma emenda constitucional,
aprovada na Câmara, que restaura a coligação proporcional. Todos os sinais são
de que o Senado irá vetar o retrocesso. A saída do PSL e do DEM é a fusão.
“A regra é indutora das fusões. Este é um
caminho natural com o fim das coligações proporcionais, porque a construção das
chapas para deputados ficou muito complexa”, reconhece o ex-ministro da Saúde Luiz
Henrique Mandetta (DEM), o presidenciável mais empenhado no projeto de unir os
pretendentes a serem terceira via na eleição presidencial. Segundo ele, a fusão
tende a tornar mais fácil a construção de um projeto presidencial. Pela
depuração que a fusão pode proporcionar nos quadros de ambas as siglas e pelo
fundo partidário na casa da centena dos milhões que o PSL dispõe.
Um cálculo feito em 2020 pelo ex-deputado
Saulo Queiroz dá a dimensão do problema. Sem coligações, o DEM em 2018 teria
eleito apenas 16 deputados, e não 29, como obteve com suas alianças.
Para o PSL o panorama também é preocupante. Ele inflou com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, que se retirou da sigla. Na sua ausência, o PSL virou um absurdo em forma de partido: um nanico gigante.
Em 2018, a sigla teve 11,6 milhões de votos
para a Câmara dos Deputados, uma enormidade. Mas o deputado Eduardo Bolsonaro
(SP), que não vai ficar na legenda, representou 15,8% deste total. É razoável
supor que só pela associação com Bolsonaro foi possível ao PSL obter 1 milhão
de votos de legenda na eleição passada. Sem o bolsonarismo o PSL corre o risco
de se tornar um balão furado.
Com a fusão, os integrantes do DEM e do PSL
não precisarão mais se preocupar com a sobrevivência da sigla a que pertencem em
2023. E a nova cúpula terá mais controle da futura bancada.
O PSL hoje é dividido em duas metades na
Câmara. Em uma estão políticos que se elegeram na carona de Bolsonaro, mas que
pertencem à política tradicional. Na outra estão os bolsonaristas de chapa e
cruz, os da gema, os pelos-duros. Estes estão de saída da sigla para se juntar
ao destino que o presidente escolher.
O DEM vive um caos ainda maior. O processo
de escolha das mesa diretora da Câmara e do Senado foi devastador para a
unidade da sigla. Uma ala minoritária embarcou em um projeto aliancista contra
Bolsonaro, derrotado pelo deputado Arthur Lira (PP-AL). Lira conseguiu cooptar
deputados de todos os partidos, o que inclui os do DEM, graças a influência que
adquiriu na execução do Orçamento. Outra ala do DEM é bolsonarista de primeira
hora.
A fusão permite aos incomodados se
retirarem. Os que se alinharem às ideias das cúpulas do partido, que querem
Bolsonaro a distância segura, vão ficar. Os que irão viver e morrer com o
capitão, sairão. Haverá mais unidade de propósitos. Resta saber se os caciques
vão se entender.
Mas o problema não é só esse. É também a
assimetria. O DEM tem muito mais a perder se a fusão não sair do que o PSL. A
eleição de 2018 deu ao partido algumas ferramentas que o DEM dispõe em
proporção muito menor.
“Com o fundo partidário e o tempo de TV que
temos, é possível pensar em fazermos pelo menos 40 deputados na eleição de
2022”, aposta Júnior Bozzella (SP). A votação em 2018 garantiu à legenda o
maior fundo partidário do Brasil. A proibição do financiamento privado das
campanhas tornou esse fator um trunfo irresistível. Unindo-se ao PSL, o DEM não
precisa juntar o seu destino ao de Bolsonaro para continuar desfrutando das
prebendas do Orçamento administrado por Lira.
Bozzella calcula que, com a fusão, é
possível chegar a 70 deputados. Avança-se um pouco onde o governador é do DEM,
como é o caso de Goiás, com Ronaldo Caiado, ou onde o DEM tem candidato forte,
como na Bahia com ACM Neto. Em São Paulo vai entrar a turma do MBL. “Claro que
não faremos mais dez deputados, mas conseguiremos pelo menos cinco ou seis”,
acredita Bozzella.
O PSL tem o apresentador José Luiz Datena
para se sentar à mesa dos negociadores da terceira via, mas Bozzella diz que o
partido estará preparado para o cenário de ficar sem candidato a presidente. O
DEM tem garantido, por ora, só o nome de Mandetta. Ele diz que novidades podem
surgir.
“Com o 7 de setembro Bolsonaro caiu de
cabeça no chão”, avalia o ex-ministro, que é ortopedista e sabe da gravidade da
metáfora. “Ele atiçou a base, envolveu muita gente em uma mobilização que
terminou em uma acomodação que gerou frustração entre os radicais. Para ele
repetir isso mais adiante, estará mais fraco. Para construir a reeleição, ficou
preso ao personagem que criou.”
No fim do mês haverá outra data
interessante para o calendário eleitoral, para o qual colabora o desgaste do
presidente Jair Bolsonaro nas pesquisas de opinião e a ambição do presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco, aliás um integrante do DEM. Foi convocada uma sessão
do Congresso Nacional para examinar vetos presidenciais. E um dos pontos a ser
examinado é a possibilidade de derrubar o veto de Bolsonaro à federação de
partidos.
A federação permite a coligação, desde que
ela se reproduza da mesma forma em todo o país. É uma articulação com origem no
PCdoB e de interesse de outras siglas de centro-esquerda, mas pode ser vista
como atraente pelos envolvidos na terceira via.
Há partidos que podem se compor com o futuro DEM/PSL, mas que de forma alguma estariam dispostos a se dissolverem em uma fusão, como o PSD de Gilberto Kassab e o MDB de Michel Temer. Uma estrutura partidária maior, com alianças estaduais estáveis, poderia ser um diferencial importante para um projeto presidencial de Pacheco, dentro ou fora do partido que PSL e DEM pretendem construir.
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