sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Bernardo Mello Franco - O bolsonarismo e as cobaias humanas

O Globo

O governo Bolsonaro já produziu um imitador de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda do nazismo. Agora faz lembrar Josef Mengele, o médico que fazia experimentos macabros em Auschwitz.

O doutor ficou conhecido por usar prisioneiros como cobaias. Tratava seres humanos como ratos de laboratório, sob inspiração de uma ideologia que pregava a “higiene racial”.

Associada à barbárie nazista, a expressão “cobaias humanas” é citada no relatório da comissão de juristas que aconselha a CPI da Covid. O documento defende que o presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro Eduardo Pazuello sejam denunciados ao Tribunal Penal Internacional pela prática de crimes contra a humanidade.

Os juristas classificam a gestão da pandemia como um ataque à população civil. O governo sabotou medidas sanitárias, negou assistência a indígenas, retardou a compra de vacinas e apostou na tese da imunidade de rebanho, que acelerou a circulação do vírus.

O relatório descreve a crise de Manaus como um “caso exemplar de desprezo à vida”. Afirma que a cidade virou palco de um “experimento pseudocientífico” com a distribuição de remédios ineficazes. Em janeiro, os hospitais entraram em colapso e dezenas de pacientes morreram asfixiados.

As investigações da CPI indicam que o governo não foi o único a tratar doentes como cobaias. Um dossiê enviado aos senadores afirma que a seguradora Prevent Senior ocultou mortes de pacientes que participaram, sem saber, de um estudo com as mesmas drogas.

A pesquisa foi repassada a Bolsonaro, que a usou para fazer propaganda do “tratamento precoce”. A empresa negou as acusações, reveladas ontem pela GloboNews, e disse ser vítima de “denúncias infundadas”.

A professora Deisy Ventura, da Faculdade de Saúde Pública da USP, lembra que o envolvimento do setor privado é uma constante na história dos crimes contra a humanidade. “Empresas que têm afinidade com o governo costumam se prestar a este papel”, afirma.

Depois da rendição dos nazistas, Mengele fugiu para a América do Sul. Terminou seus dias no Brasil, escondido sob identidade falsa. Se voltasse hoje ao país, o doutor teria chance de conseguir um emprego em Brasília.

 

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