sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

FHC diz ter se desapontado 'pessoalmente' com Lula

Raymundo Costa

Nem José Serra nem Aécio Neves. A principal estrela do programa partidário do PSDB, levado ao ar ontem à noite no rádio e na televisão, foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Escondido pelo PSDB nas três últimas eleições presidenciais, FHC foi escolhido pelos tucanos para ocupar o vazio causado pela disputa interna no partido.

FHC disse que Luiz Inácio Lula da Silva o decepcionou mais "pessoalmente" que como sociólogo, fez críticas indiretas à visão da presidente Dilma Rousseff sobre o contraditório desenvolvimento versus meio ambiente, defendeu a liberdade de expressão e disse que é possível "resgatar a credibilidade dos políticos, se eles ousarem, se eles não ficarem o tempo todo só cuidando de si".

O ataque frontal ao governo ficou por conta do presidente do PSDB, o deputado Sérgio Guerra (PE), segundo o qual, na eleição, os tucanos lutaram "contra um adversário que abusou do poder econômico, zombou da Justiça Eleitoral". Serra e Aécio aparecem na parte que menciona os governos do partido.

FHC ocupou a metade dos 10min11s de duração do programa. Ele é filmado no centro de uma arena dominada por jovens, que lhe dirigem perguntas. A primeira delas foi sobre as mulheres.

O ex-presidente, depois de tecer considerações sobre o papel das mulheres numa sociedade que teve duas candidatas na eleição presidencial, ressaltou que elas precisam ser "mais ativas" e lhes pediu que ajudem o PSDB a não ser um partido só de homens, "mas um partido onde as mulheres tenham um papel relevante também".

O programa esquenta quando outro jovem lhe pergunta se o ex-presidente Lula o havia decepcionado mais ao político ou ao sociólogo. "Até certo ponto, os dois", respondeu FHC. "Eu diria que mais o político, porque do ângulo da sociologia, o Brasil mudou. Houve avanços na sociedade, novas camadas estão participando das política, e isso não começou no governo Lula, mas ele acentuou", explicou o ex-presidente.

"Isso é bom", reconheceu FHC, para em seguida destacar: "Agora, eu conheci o Lula no ABC, em São Bernardo, o Lula inovador, que dizia o que era preciso, que a CLT precisava ser liberada, que os trabalhadores tinham que ter uma nova forma de relação, um sindicato mais independente, um plano de reformas. Ele não foi isso, eu acho que foi conservador", disse o ex-presidente.

O tucano se estendeu um pouco na explicação: "Lula aceitou muita coisa que não era boa de aceitar. Alianças, todo mundo faz, eu também fiz. Mas ele ficou até o fim, até promoveu mais alianças com setores muito atrasados do Brasil e permitiu que houvesse uma certa complacência com a corrupção. Esse lado me decepcionou talvez mais com a pessoa do que com o presidente". FHC referia-se ao fato de, nos anos finais de seu governo, ter se afastado de oligarcas como José Sarney (PMDB-AP) e Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), morto em 2007.

FHC aproveitou uma pergunta sobre a compatibilidade entre o desenvolvimento e a proteção do meio ambiente, para fazer uma crítica indireta à presidente Dilma, que no governo de Lula era acusada de pressionar os órgãos ambientais para apressar o licenciamento de obras governamentais. "É possível fazer as duas coisas", disse FHC, citando a experiência do etanol, uma fonte limpa de energia que ao mesmo tempo gera a criação de muitos empregos.

"Dá para compatibilizar", afirmou. "Agora, é preciso juízo, bom senso. Não dá para crescer a qualquer custo, a qualquer preço", disse. "Isso é coisa do passado. No período dos militares era assim: cresce, cresce, destrói, não se preocupa com nada, meio ambiente. Isso não é mais saudável. O mundo hoje é crescimento com respeito ao verde, e nós precisamos e podemos fazer isso."

Outro assunto escolhido a dedo para FHC responder foi a liberdade de expressão. Tem que haver liberdade total de opinião. Segundo FHC não há mais como limitar a liberdade de expressão na era da internet e do Facebook. "É impossível, a vida vai ser realmente cada vez mais devassada, cada vez mais clara. Terá seus inconvenientes, mas tem uma vantagem imensa, fica mais preto no branco. Não fica um escondido do outro, não tem mais como. Quanto mais transparente, melhor."

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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