segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Compra feita por órgão do Meio Ambiente sob suspeita

Licitação milionária para serviços gráficos feita pelo Instituto Chico Mendes é investigada pelo Ministério Público que alerta para fraudes em modelo de pregão

Regina Alvarez

BRASÍLIA. Braço do Ministério do Meio Ambiente responsável pela gestão de parques e reservas nacionais, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) é considerado um órgão pequeno na estrutura da administração federal, com orçamento anual de R$558 milhões. Por isso, a licitação milionária realizada este ano para a contratação de serviços gráficos chamou a atenção do Ministério Público Federal.

O órgão fez um pregão de R$20,3 milhões, embora, no ano anterior, gastos com a mesma rubrica tenham sido de R$775 mil. A manobra esconde uma prática que se alastra na Esplanada dos Ministérios, com risco crescente de fraudes com recurso público: compras governamentais feitas por meio de adesão a atas de registro de preços.

O esquema funciona assim: um órgão do governo realiza uma licitação na modalidade de pregão eletrônico usando como instrumento a chamada ata de registro de preços - ou seja, lista um conjunto de itens que pretende comprar e realiza o pregão, vencido pela empresa que oferecer o menor preço médio. Só que a soma desses itens é sempre muito maior do que as necessidades daquele órgão, porque o objetivo é que esse pregão sirva de guarda-chuva para compras de outros órgãos federais, sem licitação.

- Em tese, um órgão minúsculo como o Instituto Chico Mendes, que tem necessidades específicas de serviços gráficos, pode servir de guarda-chuva para fornecer esses serviços para toda a administração - explica o procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Marinus Marsico.

Na semana passada, Marsico recebeu um dossiê com denúncias de fraudes e suspeitas de direcionamento nas licitações de dois órgãos do governo: o Instituto Chico Mendes e a Valec, estatal de ferrovias ligada ao Ministério dos Transportes.

- Essa prática se alastra. Está disseminada e tem que ser coibida imediatamente. Na área de eventos, já identificamos superfaturamento de mais de 500%. Vamos atuar junto ao TCU e requisitar investigação nesses casos (das novas denúncias) - afirma o procurador.

A Valec, que gastou R$4,8 mil em 2008 com a contratação de serviços gráficos, fez um pregão em 2009 no valor de R$23,3 milhões, que resultou na contratação da Gráfica Brasil. Segundo a denúncia encaminhada ao procurador, o edital foi feito sob medida para beneficiar a Gráfica Brasil, do empresário Benedito de Oliveira, o Bené, que é ligado ao PT e ficou conhecido nacionalmente na campanha eleitoral de 2010 pelo envolvimento em mais um escândalo de dossiê.

Contrato da Valec serviu para quatro ministérios

O contrato da Valec serviu de guarda-chuva para outros cinco órgãos: os ministérios da Saúde, das Cidades, da Agricultura e da Cultura e a Universidade de Brasília. Juntos, contrataram serviços no valor de R$21, 8 milhões da Gráfica Brasil, entre 2009 e 2011, sem necessidade de novas licitações. Simplesmente aderiram à ata da Valec.

Depois que o pregão é homologado, essas atas valem por um ano, mas os órgãos, muitas vezes, aproveitam uma ata que está vencendo e fazem um contrato milionário com validade por mais um ano, prorrogando o período dos serviços.

- É um absurdo não ter limite. Essa prática precisa ser imediatamente regulamentada pela administração. Estamos deixando escapar milhares, em alguns casos, dezenas de milhões, usando o artifício da ata de registro de preços - alerta.

A brecha para o superfaturamento está na montagem das atas. Os itens pouco procurados pelos órgãos são cotados por preços irrisórios para puxar a média para baixo na disputa do pregão. Já os itens mais utilizados são cotados a preços acima do mercado, o que garante os ganhos dos fornecedores.

- Esse tipo de modalidade não é adequada para serviços não padronizados, como serviços gráficos. Neles, cotam-se centenas de itens em conjunto, e isso escancara a porta para fraudes - adverte Marsico, observando que a ata de registro de preços, em si, não é problema, mas é adequada para compra de itens padronizados.

No caso do pregão realizado pelo Instituto Chico Mendes, a Gráfica Esdeva, de Juiz de Fora, foi a vencedora. A denúncia que aponta indícios de direcionamento no pregão também foi encaminhada ao TCU, que deve se manifestar nos próximos dias sobre um pedido de cautelar suspendendo a licitação.

Segundo a denúncia, o edital inclui exigências que impediram uma concorrência plena, como prazo de duas horas para o vencedor encaminhar 168 planilhas preenchidas de forma a se adequarem ao preço final do pregão, e uma máquina que imprime folhas inteiras, que só existe em 5% das gráficas do país.

FONTE: O GLOBO

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