Condições de negociação são árduas e explicam por que em seis semanas países não chegaram a um acordo
Já estão em pleno curso as negociações que definirão o resultado da Rio+20. E os negociadores já sabem: os 3 dias de agenda oficial destinados à preparação do documento de resoluções, na reunião do comitê preparatório, não serão suficientes.
As conversas devem atravessar o próximo fim de semana e os dias destinados aos "Diálogos Sustentáveis", imaginados para recolher demandas a serem apresentadas aos chefes de governo na cúpula que terá início no dia 20.
As condições de negociação são muito difíceis e explicam por que em seis semanas de conversas "informais", em Nova York, os países não conseguiram fechar acordo sobre as medidas a serem anunciadas pelos chefes de estado ao final da cúpula. O primeiro fator a dificultar as conversas é a crise da Eurozona que ameaça desestabilizar as fundações da união monetária e fraturar a própria União Europeia. Ela é desdobramento do colapso financeiro de 2008 nos Estados Unidos, cuja economia continua a patinar, colocando em risco a reeleição do presidente Barack Obama. Afeta também as economias emergentes. Os governantes chineses foram surpreendidos pela velocidade e alcance da desaceleração de sua economia, principalmente por causa da interrupção das importações europeias. Qualquer conversa sobre recursos termina em impasse.
O segundo fator limitador é político. Os dirigentes europeus estão imersos em seus problemas e ausentes da Rio+20. Angela Merkel e David Cameron enfrentam crescente oposição em casa. A chanceler alemã perdeu seu principal aliado, Nicolas Sarkozy, na defesa da política exclusivamente de austeridade para enfrentar as crises fiscais na Grécia, Espanha, Portugal, Itália e Irlanda. Isolada, tem sido criticada em casa por não vir à Rio+20 e fora de casa por sua inflexibilidade diante de níveis espantosos de desemprego. Seus críticos pedem medidas anticíclicas, combinadas ao saneamento fiscal, para reativar o emprego. Obama busca uma reeleição que parecia garantida e se complicou com oscilações da economia. Hu Jintao e Wen Jiabao estão envolvidos em uma disputa sucessória na China que pode abalar o diretório central do partido Comunista, o núcleo do poder chinês. Assumir compromissos novos faz qualquer um deles arrepiar.
A terceira dificuldade está na própria busca de um acordo global sobre objetivos de desenvolvimento sustentável com metas quantificadas, mecanismos de implementação e verificação, para suceder os Objetivos do Milênio a partir de 2015. É uma inversão delicada de jogo. Os Objetivos do Milênio eram compromissos dos países em desenvolvimento. Os desenvolvidos entravam com ajuda financeira e apoio tecnológico. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável valem para todos os países. As obrigações dos países desenvolvidos seriam proporcionalmente maiores que a dos outros. Abre-se forte conflito entre eles e as potências emergentes que querem introduzir nos objetivos de desenvolvimento sustentável o princípio das "obrigações comuns, porém diferenciadas", adotado na Convenção do Clima. Os desenvolvidos vêem nele uma forma dos emergentes escaparem de suas obrigações. Os emergentes interpretam o veto dos desenvolvidos como tentativa de transferir para eles o ônus da sustentabilidade, depois que se desenvolveram com enorme pegada ecológica. Nesse duelo, as negociações empacam.
Os negociadores têm sete dias corridos para resolver o impasse e chegar a uma visão comum sobre suas respectivas obrigações. Como farão isso?
Transferindo a definição das obrigações para o futuro. Tentarão concordar, pelo menos, em anunciar que o mundo terá objetivos de desenvolvimento sustentável. Eles seriam definidos, com metas e cronogramas, nos próximos anos para entrar em vigor em 2015.
Sérgio Abranches é sociólogo e cientista político
FONTE: O GLOBO
Nenhum comentário:
Postar um comentário