Há controvérsias entre o benefício automático aos réus ou o voto de minerva
Miguel Caballero
Assim que terminar o julgamento da última fatia do processo do mensalão,
sobre formação de quadrilha, nesta semana, os ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) entrarão num debate que deve gerar novas divergências entre
ministros, justamente sobre os casos em que o tribunal não conseguiu concluir
sobre a responsabilidade dos acusados. Até aqui, há seis casos de empate entre
votos por condenação e absolvição. Este também pode ser o destino das acusações
contra José Dirceu e José Genoino na acusação de formação de quadrilha. Para os
dois petistas, o placar até o momento está em 1 a 1.
Há três possibilidades para resolver os empates: a obediência ao regimento
interno do STF, que determina o voto de minerva do presidente da corte; a
prevalência do princípio jurídico "in dubio pro reo" (na dúvida, a
favor do réu), que garantiria a absolvição dos acusados; ou aguardar que o
futuro ministro Teori Zavascki assuma sua cadeira e vote, esta a hipótese menos
provável pela falta de tempo, já que sua indicação ainda precisa ser aprovada
no plenário do Senado.
A discussão sobre os empates acontecerá provavelmente antes de os ministros
se debruçarem sobre a dosimetria das penas nos casos em que houve maioria pela
condenação. Uma coisa é certa: por seu perfil de buscar decisões consensuais no
condução da corte, o presidente Ayres Britto levará a questão para ser decidida
em plenário, por debate e votação entre todos os ministros.
É aí que podem surgir as próximas grandes controvérsias do julgamento, num
embate jurídico entre os ministros que defendem a adoção do "in dubio pro
reo" e os que preferirão que os casos sejam desempatados pelo voto de
minerva do presidente. Entre especialistas em direito, o tema gera
divergências.
- O "in dubio pro reo" se aplica. É um princípio jurídico, deve
prevalecer sobre o regimento interno do STF, que é uma resolução, um ato
administrativo. O mensalão é uma ação penal, cujas penas afetam o bem sagrado da
liberdade. Nestes casos, quando empata, o normal é o benefício automático ao
réu - diz o professor de Direito da UnB Mamede Said.
Para a professora da FGV/Direito Rio Tânia Rangel, o correto seria que o
presidente do STF desse o voto de minerva.
- No Direito Penal, mais importante que o "in dubio pro reo" é o
princípio da legalidade. Na lei de ação penal, não há previsão sobre como
decidir empates. Então, passa-se ao regimento do Supremo, que determina que os
empates sejam decididos pelo voto do presidente, com única exceção para os
casos de habeas corpus, onde o empate beneficia o réu - defende Rangel,
lembrando que os ministros já devem estar formando convicção sobre como o
tribunal deve proceder. - O primeiro caso de empate, do José Borba, foi já há
várias semanas. Acredito que o presidente Ayres Britto costure um acordo antes
da discussão no plenário, pois é um tema que pode gerar muitas divergências e
discussões.
Um detalhe importante é que o voto de minerva do presidente não
necessariamente será o mesmo que ele deu anteriormente, o que soaria como
aparente contradição. Nos seis casos de empate até aqui, o presidente Ayres
Britto foi um dos que votaram pela condenação. Mas não será surpreendente, nem
mesmo contraditório, se ele der o voto de minerva pela absolvição.
- O presidente pode entender que o caso teve muita controvérsia, houve
empate, e, valendo-se por exemplo do princípio "in dubio pro reo",
absolver o acusado - lembra Tânia Rangel.
A professora da FGV/Direito diz que são raros os casos, na história do
tribunal, em que o presidente do Supremo teve de dar o voto de minerva.
- Desde a Constituição de 1988, aconteceu só uma vez, ano passado, quando o
então presidente Cezar Peluso deu o voto de minerva a favor do senador Jáder
Barbalho (PMDB-PA), que estava impedido de assumir o mandato pela Lei da Ficha
Limpa - recorda.
Fonte: o Globo
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