Confirma-se uma tendência que já havia dominado o primeiro turno das
eleições: o número recorde de votos brancos e nulos registrado pela pesquisa
Datafolha, juntamente com o grande índice de indecisos às vésperas do segundo
turno, mostra o eleitor em busca do novo, insatisfeito com as opções que os
partidos políticos estabelecidos lhe oferecem. E não apenas de nomes novos, mas
de atitudes novas.
O fenômeno foi exacerbado em São Paulo, onde 30% dos eleitores se abstiveram
ou votaram branco ou nulo, atitude que as pesquisas indicam se repetirá no
segundo turno da escolha do prefeito paulistano. Mas essa tendência foi
registrada em todo o país, com uma média de 25% de não voto, índice muito fora
do padrão histórico das últimas eleições.
Em várias capitais, mesmo naquelas em que o resultado foi definido no 1º
turno, o não voto foi o segundo colocado, isto é, o candidato que chegou em
segundo lugar, muitas vezes indo para o 2º turno, teve menos votos do que a
soma dos eleitores que optaram por não votar.
Tudo indica que estamos entrando em uma fase de nossa vida partidária em que
vai se revelando o desgaste de material do sistema que está montado em torno de
partidos políticos esterilizados por uma mecânica de coalizão autofágica. O
país põe em marcha sistemas que tentam organizar minimamente essa orgia de
siglas que nada significam, como a Lei da Ficha Limpa, que começou a vigorar
aos trancos e barrancos nestas eleições.
Mas ainda temos muito a caminhar para chegarmos a um sistema
político-partidário que reflita uma sociedade madura. Em uma votação
obrigatória, haver 30% de não votantes é sem dúvida uma marca que merece
registro dos que se preocupam com o rumo de nossa sociedade, uma clara reação
negativa do eleitor médio.
Se o Parlamento representa com justeza a média da sociedade que o elege, há
um registro de parte ponderável dela se recusando a continuar participando do
jogo nos termos em que ele está colocado. E por outra parte a busca do novo
reflete essa espécie de angústia existencial do eleitor, mesmo que se revista
de equívocos, como seria o caso de uma vitória de Celso Russomano em São Paulo,
ou a de Ratinho Jr., em Curitiba.
Ambos casos emblemáticos, o curso da história está sendo transformado pelos
próprios eleitores. Em Curitiba, a busca do novo vai se encaminhando para o
leito certo, o ex-deputado Gustavo Fruet, uma das lideranças jovens mais
promissoras do PSDB que, por questões de política regional, foi buscar votos em
outras paragens.
Em São Paulo, o que parecia novidade acabou desconstruído a tempo de não
chegar ao 2º turno, prevalecendo nesse caso as máquinas partidárias mais
fortes. Provavelmente qualquer candidato dos dois partidos teria ido para o 2º
turno, mas é preciso ressaltar que o PT levou ao eleitor uma alternativa
diferente do prato feito tradicional, mesmo que tenha realizado esse
aggiornamento de maneira autoritária, com um dedazo de Lula.
Diante do desfecho favorável iminente, fica demonstrado mais uma vez que
Lula tem um faro político que lhe permite compreender com antecedência para que
lado o vento sopra, e a busca do novo foi sua decisão fundamental. O PT
reafirmou ser uma formidável máquina partidária, e não apenas em SP. O que não
impediu que sofresse derrotas memoráveis, como em Recife, Belo Horizonte e
Porto Alegre. E provavelmente sofrerá outras, importantes, no 2º turno, em
Salvador e Manaus.
O mesmo movimento inevitável terá que ser feito necessariamente pelo PSDB,
que passará por uma ampla revisão nacional sob o comando explícito do senador Aécio
Neves, que saiu da eleição municipal fortalecido na imagem de líder nacional e
assumindo o papel de candidato potencial do partido em 2014.
A modernização da direção nacional do partido, em nomes, atitudes e
posicionamento, será o ponto de partida para a união das forças oposicionistas.
Embora esfacelada a nível congressual por essa política de coalizão autofágica
a que já nos referimos, a oposição mostrou-se nas urnas capaz de ação política
importante.
Fora do poder há dez anos, o PSDB continua sendo o segundo maior partido em
número de prefeituras e vereadores, o que sinaliza uma boa votação para o
Congresso em 2014. E a oposição encontrou fôlego para dar sinais vitais
importantes no Norte e Nordeste, regiões onde o governismo lidera.
Outro polo de poder saído das eleições, o PSB marca sua independência,
ensaia movimentos conjuntos com o PSDB, mas tende a permanecer na base aliada
enquanto for possível conviver com a hegemonia petista. Há tempo para
amadurecer o projeto de alternância à sombra do poder atual, até que o quadro
se ilumine.
Fonte: O Globo
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