- O Globo
A presidente Dilma Rousseff deve aos brasileiros muitas explicações, que vão se acumulando com o passar do tempo, mas a que se dispôs a dar sobre o Orçamento com déficit que enviou ao Congresso não faz nenhum sentido. Se vai mandar uma emenda ao Orçamento para cobrir o rombo de mais de R$ 30 bilhões, por que não o fez antes, enviando um Orçamento equilibrado?
Averdade é que até quando pretende ser transparente este governo está apenas fingindo transparência. O movimento político de chocar o Congresso com um Orçamento nunca visto tinha o objetivo de fazer dos parlamentares cúmplices dos aumentos de impostos que serão necessários acrescentar às nossas contas públicas.
Como não deu certo, o governo vai ter que assumir a culpa sozinho, e não é descartável a chance de recriação da CPMF, ou imposto da mesma natureza com outro nome. Repercutiu muito mal no mercado financeiro a decisão de assumir o déficit primário como número oficial para 2016, como se o governo dissesse ao mundo que não há mais nada a fazer a não ser não pagar as dívidas.
Tudo fica mais difícil quando o governo tem uma oposição vigorosa dentro de seu próprio corpo político, já que o PT decidiu oficialmente combater o ajuste fiscal e pedir a saída do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Isso é de um déjà vu tremendo, pois, quando Antonio Palocci era ministro da Fazenda, seus assessores provenientes do mercado financeiro — a maioria com ligações com o PSDB, mas disposta a ajudar um governo petista a organizar as finanças públicas — eram atacados quase que diariamente por setores do PT.
Como Palocci é um capa preta do petismo, os protestos não tinham nenhuma importância política. Com Levy é diferente. Ele é o ministro da Fazenda e não tem ninguém, a não ser a presidente Dilma, para segurá- lo. Acontece que Dilma também não é petista de alma e não tem a menor influência no esquema partidário.
Corremos o sério risco de ver daqui a pouco o próprio partido pedindo que renuncie, para livrálo das consequências do desastroso segundo mandato de Dilma. E com o apoio de Lula, que assim estaria livre para exercer a oposição a um governo de Michel Temer, do PMDB, que terá que fazer tantas e tamanhas maldades financeiras e fiscais que será alvo fácil do petismo tentando se reinventar na oposição.
Desconfio que essa seja uma das principais razões para o arrefecimento da campanha da oposição pelo impeachment de Dilma. Mesmo um novo governo, no caso de o Tribunal Superior Eleitoral chegar à conclusão de que deve cassar a chapa, teria dificuldades para se sair bem no complemento do mandato de Dilma, por mais ou menos dois anos.
Mesmo com a legitimidade que as urnas lhe dariam, é pouco tempo para consertar o estrago que já foi feito. O pior, porém, é que deixar do jeito que está só fará aumentar o estrago, haja vista o Orçamento deficitário que alguma inteligência palaciana convenceu a presidente a enviar ao Congresso como uma grande chantagem sobre os políticos.
Pior ainda se a ideia foi da própria presidente, pois ficaria patente que não existe a seu redor ninguém capaz de demovê- la de atitudes insensatas. No seu discurso característico, em que o pensamento parece que vai para um lado, e a oratória, para o outro, Dilma garantiu que não quer dividir a responsabilidade com o Congresso, para logo em seguida afirmar que quer construir junto com o Congresso uma proposta orçamentária que seja realista.
Além de serem incoerentes entre si, os termos revelam que os Orçamentos anteriores, que acabaram apresentando um déficit onde se previa superávit, eram maquiados, irrealistas. Estão explicadas as “pedaladas fiscais”, o Tribunal de Contas da União ( TCU) não precisa de mais nada para se pronunciar.
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