Mais um fiasco foi adicionado à coleção de tropeços políticos e econômicos da presidente Dilma Rousseff, com a recusa dos presidentes da Câmara e do Senado de consertar a pífia proposta de lei orçamentária apresentada pelo Executivo. “Não é papel do Congresso zerar déficit nem resolver questão de custos”, disse o senador Renan Calheiros.
“Sou favorável a que se aprove o Orçamento como o governo mandou”, manifestou-se o deputado Eduardo Cunha. Ao recusar o auxílio pedido pelos ministros do Planejamento e da Fazenda e pela presidente, os dois parlamentares evidenciaram, mais uma vez, o principal fator de risco para um país já afundado em recessão. Muito piores que o buraco de R$ 30,5 bilhões previsto no projeto orçamentário são os déficits de competência, de seriedade e de liderança de um governo sem rumo, sem credibilidade e sem apoio até do próprio partido. Como se fosse preciso deixar esse fato ainda mais claro, no mesmo dia o plenário da Câmara aprovou o texto-base do projeto de ampliação do programa Super Simples, contra a opinião da Receita Federal.
O governo só conseguiu, nesse caso, uma alteração do texto original para transferir de 2016 para 2017 a vigência dos novos benefícios, com custo de R$ 11,43 bilhões pela estimativa da Receita. Mas a votação realçou de novo a fraqueza do Executivo. A aprovação foi garantida por 417 votos contra apenas 2. Foi uma vitória do ministro da Micro e da Pequena Empresa, Guilherme Afif Domingos, e mais uma derrota do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O projeto poderá cair no Senado, mas essa aposta é arriscada.
O governo poderá mandar um adendo e será possível mexer nos números da proposta de lei orçamentária, mas será preciso mais que isso para resolver o problema. A presidente Dilma Rousseff já assinou decretos e medidas provisórias para elevar alguns tributos. A taxação adicional de bebidas e de bens de informática poderá proporcionar R$ 11,3 bilhões, segundo se estima em Brasília, mas nem assim o buraco previsto para o próximo ano será fechado. Além do mais, já há quem considere subestimado o déficit de R$ 30,5 bilhões. Se a aritmética do projeto estiver correta, ainda sobrará a incerteza quanto ao dinheiro a ser obtido com a venda de terrenos e as concessões de infraestrutura.
Mas a proposta orçamentária, mesmo com os defeitos já apontados, é muito mais articulada e funcional que o próprio governo. A vitória do ministro Guilherme Afif Domingos sobre a Receita Federal e, portanto, sobre o Ministério da Fazenda é só uma ilustração um tanto cômica da baderna administrativa e da qualidade da liderança no interior do Executivo. O ministro Joaquim Levy, ainda apresentado ao mundo como o fiador da política de ajuste, continua acumulando derrotas e humilhações e é difícil de dizer com alguma segurança, nesta altura, por que ele permanece no posto e a quem ele insiste em demonstrar lealdade.
Embora sua fraqueza seja evidente, de alguma forma sua permanência parece ainda ser considerada um sinal positivo pelo pessoal do mercado. Sua substituição – este é o risco – poderá consagrar oficialmente o abandono de qualquer compromisso, mesmo fingido, com a seriedade na condução da política econômica.
Mesmo com a permanência de Levy, tudo aponta, no entanto, para um agravamento dos problemas no próximo ano. Inseguro, o setor privado continua e continuará sem investir. Se as contas públicas continuarem esburacadas, ou se o buraco aumentar, o Banco Central dificilmente poderá cortar os juros no próximo ano, e isso retardará o início da reativação econômica.
O ajuste das contas públicas está longe de ser apenas uma questão fiscal. Ele faz enorme diferença para o combate à inflação, para a política de juros e, portanto, para a expansão do crédito, e é um passaporte para a retomada do crescimento. Para os financiadores e investidores, é um selo de qualidade da política brasileira. Seria ingenuidade tentar enganá-los com um selo falso.
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