Aprovação de projeto no Senado que torna compulsória internação de dependentes esquenta debate
A eleição de Jair Bolsonaro, conduzida por uma onda conservadora, mas também por forte sentimento antipetista, leva para a agenda do país temas no mínimo polêmicos, em torno dos quais pesquisas não detectam consenso. A recente decretação da liberalização da posse e do porte de armas é forte exemplo, rejeitada por ampla maioria da população, segundo sondagens de opinião pública.
Em nada reduz a legitimidade concedida pelas urnas ao presidente para tentar executar sua pauta. Mas cabe às instituições da República examinarem propostas e medidas com base na Constituição. O caso das armas recebeu pareceres jurídicos do Congresso contrários ao uso do instrumento do decreto presidencial para alterar lei aprovada pelo Legislativo, o Estatuto do Desarmamento. É assim que funciona o sistema de freios e contrapesos.
Outro tema, também da pauta conservadora, reacende debates, e com um envolvimento direto do Judiciário, havendo risco de choque entre Supremo e Congresso. É a questão do problema das drogas vista da perspectiva do usuário. Na quarta, foi dado um passo para este possível choque, com a aprovação pelo Senado de projeto do ex-deputado Osmar Terra, para instituir a internação compulsória de dependentes químicos, método rejeitado por especialistas.
A terapia da abstinência forçada tem pareceres contrários, de defensores do método de redução de danos, que busca apoiar o dependente químico no abandono paulatino do uso da droga — até mesmo com o fornecimento dela para ser usada em local seguro e com atendimento profissional. Por óbvio, há casos que requerem abordagem mais forte, porém transformar a internação compulsória em política pública não parece aconselhável.
Conhecido defensor de ações duras contra tráfico e consumo, Osmar Terra, hoje ministro da Cidadania, conseguiu com seu projeto também elevar de cinco para oito anos de reclusão a pena mínima de chefes do tráfico. O problema é que se volta a deixar em aberto, a depender da decisão do juiz, o enquadramento do preso como usuário ou traficante.
Este ponto é central em um julgamento suspenso no Supremo, a ser retomado em 5 de junho, sobre a descriminalização do porte de drogas.
Trata-se de um processo que era relatado pelo ministro Teori Zavascki, morto em acidente aéreo e substituído por Alexandre de Moraes. Este pediu vista do caso, que volta agora à pauta. Dos 11 ministros da Corte, três — Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso — já votaram pela descriminalização. Há nuances nos votos. Gilmar Mendes, por exemplo, considera inconstitucional criminalizar o próprio porte de drogas.
A Corte discute a definição de quantidades que caracterizem consumidor e traficante, como fazem outros países. Este parâmetro é fundamental para impedir que policial e juiz decidam sobre a prisão de pessoas sem qualquer base concreta formal. A retomada do julgamento no STF é oportuna.
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