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A erupção dos instintos mais primitivos
Se não for pedir demais, roga-se a algum membro sensato do governo, dotado de razoável inteligência e com acesso ao capitão Bolsonaro que explique a ele o risco que corre o Brasil com suas intempestivas declarações a respeito de tudo e de qualquer coisa.
Que o faça, é claro, com cuidado, bons modos e didatismo. Se for o caso, em ambiente no qual ele se sinta seguro e acolhido – de preferência na presença da mulher ou de algum dos filhos. E sem medo de alguma explosão de cólera que venha a provocar.
Pois é admissível que o modo de ser do capitão funcione aqui dentro a seu favor, haja vista que se elegeu com folga e governa apesar da quantidade de absurdos já ditos ou justamente por dizê-los. Mas, lá fora, o estrago tem sido grande e poderá piorar.
Está bem que por ignorância e falta de assessoria à época ele tenha imaginado que ajudaria Maurício Macri a se reeleger indo à Argentina recomendar o voto nele. Lula e Dilma não se meteram em tantas eleições alheias? Por que ele não poderia copiá-los?
Mas uma vez que os argentinos votaram em eleições primárias e disseram um rotundo “não” a Macri, Bolsonaro reagir, como o fez, com a ameaça de rever o acordo do Mercosul, soará no país amigo como mais uma intromissão em assunto que não lhe compete.
E o que dizer da afirmação de Bolsonaro de que a provável eleição do candidato apoiado pela ex-presidente Cristina Kirchner resultará numa fuga em massa de argentinos para o interior do Rio Grande do Sul como aconteceu com venezuelanos em Roraima?
O capitão foi deselegante com o presidente francês e a primeira-ministra alemã Ângela Merkel ao sugerir que não tivera o menor prazer em encontrá-los no Japão durante a reunião dos chefes de Estado das 20 maiores economias do mundo, em janeiro.
O francês e a alemã são figuras chaves para que a comunidade dos países europeus firme um acordo econômico com o Mercosul que se arrasta há 20 anos. O capitão parece pouco ligar para a preocupação deles com a preservação do meio ambiente.
Colheu o que plantou: a Alemanha congelou parte do dinheiro que manda para projetos de defesa da Amazônia. A Noruega, outra doadora de dinheiro com igual finalidade, deverá proceder em breve da mesma maneira. E quem perderá com isso?
Bolsonaro reagiu ao estilo bronco de um capitão, atento acima de tudo aos humores dos seus devotos broncos: querem comprar a Amazônia a prestações, mas ela é nossa. E não precisamos de dinheiro dos outros. (Alô, alô! Como não precisamos cara pálida?)
O mais grave é que como o capitão pensam os generais de pijama que o cercam, batem continência e se contentam em garantir seus empregos, além de generais fardados. O capitão melhor do que ninguém desperta os instintos mais rudes e primitivos da tropa.
Explique-se, Moro!
Questão em aberto
Em telefonema a um juiz do Superior Tribunal de Justiça, logo depois da prisão dos hackers de Araraquara, o ministro Sérgio Moro avisou que o celular dele havia sido invadido, mas que não se preocupasse. Os conteúdos hackeados seriam destruídos.
Quando perguntaram a Moro se ele tivera acesso à lista de nomes das vítimas de tão sórdida invasão de privacidade, ele respondeu que não, mas admitiu que sabia o de alguns. De fato, se não soubesse, não poderia ter avisado a pelo menos um deles.
Aqui reside um fato grave que Moro não foi pressionado a explicar: nem como parte interessada, nem como ministro da Justiça, ele tinha o direito de compartilhar com a Polícia Federal o que só seria permitido ao juiz responsável pelo inquérito, e a mais ninguém.
Não importa que a Polícia Federal seja subordinada ao Ministério da Justiça. Ela é órgão de Estado, não de governo. Administrativamente, depende do ministro, mas responde à Justiça e somente a ela obedece e deve satisfações.
Moro desrespeitou uma cláusula pétrea, digamos assim, do funcionamento da Polícia Federal. E não foi a primeira vez. Bolsonaro já admitiu ter recebido dele circunstanciado relatório sobre o laranjal do PSL investigado em sigilo pela Polícia Federal.
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