Há
quase seis anos os juros básicos (Selic) não
subiam. Pois desta vez, a mordida foi valente, de 0,75 ponto porcentual ao ano, de 2% para 2,75%,
porque a inflação foi longe demais. O recado foi o de que alguém assumiu o
comando de uma economia sem rumo. Com seu único instrumento, a política
monetária, o Banco Central teve
de lidar com forças que trabalham em direções opostas.
A
mais importante dessas forças é o estouro confuso e inesperado da inflação em tempos de retração da
economia. Depois de cinco anos de baixo avanço e em queda, em fevereiro a
inflação medida em 12 meses (evolução do Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA)) saltou para 5,2%, fortemente acima da
meta do ano, que é de 3,75%. A expectativa dos agentes econômicos, medida pela
Pesquisa Focus, é de uma inflação anual em dezembro de 4,6%,
número que tende a se encorpar. O próprio Copom projeta para alguma coisa
em torno dos 5,0%.
O Banco Central vinha perdendo as condições de ancoragem, que é a capacidade de levar os fazedores de preços a acreditar que a inflação vai para onde o Banco Central quer que vá.
Em boa medida, a estocada descontrolada da inflação é consequência da alta do dólar que, apenas em 2021, já está perto dos 8%, a despeito das intervenções agressivas do Banco Central para contê-la. O encarecimento da moeda estrangeira também puxa para cima os preços dos importados e dos produtos amarrados ao dólar, como os combustíveis e rações animais.
A
disparada da cotação do dólar, por sua vez, é o resultado de enormes lambanças
do governo que produziram insegurança: é a política sanitária desastrada de
controle da covid-19; a intervenção atabalhoada
na Petrobrás; e a maneira flácida
como administra as contas públicas. Não menos importante, o dólar também
decolou com a volta de Lula ao cenário
político-eleitoral.
Não
falta quem atribua o avanço da inflação também ao rali das commodities, que aumentou os
preços da carne, das rações animais e de grande número de alimentos. No
entanto, a escalada dos preços do feijão preto e do arroz, de 51,6% e 69,8%,
respectivamente, em 12 meses, não tem relação com o dólar. São produtos
apenas marginalmente exportados. Tem a ver com o aumento do consumo interno
que, por sua vez, é consequência da distribuição do necessário e
inevitável auxílio emergencial durante
a pandemia, de R$ 294 bilhões para 68,2 milhões de pessoas.
Nos
relatórios das reuniões anteriores do Comitê de Política Monetária (Copom), o
Banco Central vinha afirmando que a maior parte da inflação tinha origem no
aumento de custos da economia. Nessa categoria poderiam entrar a desorganização
dos estoques, a alta do petróleo e demais commodities no mercado internacional.
Em
princípio, uma inflação de custos não se combate com alta dos juros, porque
alta de juros é produzida com redução do volume de moeda na economia, recurso
que não ajuda a aumentar a oferta de mercadorias e serviços. Alta dos juros
funciona quando o avanço da inflação é produzido por aumento da demanda que,
por sua vez, reflete mais dinheiro circulando na economia. Funciona, porque,
com menos moeda em circulação, também se reduz a demanda por coisas e
serviços.
Por
isso, também, o Copom preferiu apostar em que a inflação seria temporária –
enquanto durasse esse aumento de custos. Por isso, não mexeu nos juros. Mas as
coisas desandaram e continuar sem fazer nada poderia ser pior.
Se
fosse para evitar novas altas da moeda estrangeira, talvez o Banco Central
tivesse de puxar os juros para 3,0% ao ano. A intervenção a que se viu obrigado
nas últimas semanas talvez tenha tido o objetivo de limitar a alta dos juros a
esse 0,75 ponto porcentual.
Juros
subindo assim produzem efeito colateral perverso: tendem a frear a economia num
momento em que o desemprego é alto e em que a produção perde fôlego. Já havia o
efeito pandemia que vai parando tudo e, agora, tem essa mordida dos juros. Por
isso, comerciantes, empresários e pessoas que dependem de crédito vão
multiplicar protestos e queixas contra a decisão.
O Banco Central avisou que pretende chegar a uma Selic de 4,5% neste ano e de 5,5% em 2022. Mas não tem clareza sobre a dosagem correta.
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